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Morte de Tortorello vira drama pessoal para São Caetano
Por Gabriel Batista,
Nelson Cilo e
Roney Domingos
Do Diário do Grande ABC
19/12/2004 | 13:16
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São Caetano encarou a morte de Luiz Olinto Tortorello (PTB) como drama pessoal. Moradores e funcionários da Prefeitura fizeram fila no Parque Chico Mendes para homenagear o prefeito, vítima de câncer. Não pareciam movidos pela curiosidade ou pelo dever tribal de homenagear um líder. Muitos tinham os olhos vermelhos de chorar. Visitantes aguardavam uma hora antes de passar pelo portão central – sempre em grupos de 50 pessoas – para chegar ao saguão. Dois guardas municipais guardavam o corpo na sala ampla onde estavam expostos os quadros com todos os ex-prefeitos da cidade. Depois de ver o corpo, alguns saíam atordoados pelo caminho errado e tinham de ser contidos pela guarda. Alguns tentavam furar o cordão de isolamento para tocar no caixão. Apesar do clima quente e do excesso de gente, não havia barulho. Cada visitante levava consigo uma história de encontro com Tortorello e comentários de admiração e respeito. Alguns entravam duas ou três vezes na fila, na tentativa de estender o adeus.

Foi o caso da professora de modelagem industrial Aparecida Vitali, 78 anos, que parecia não acreditar na morte de Tortorello. "Esta é segunda vez que passo ao lado do corpo. Na primeira não tive coragem de olhar", disse Aparecida, com olhos cheios de lágrimas e voz trêmula. Ela contou que sonhava com o dia em que veria Tortorello no cargo de governador do Estado. "Ele fez tão bem para a cidade, eu o amava como se fosse um parente."

A comerciante Carmela Bastos, 71 anos, exibia duas fotos em que aparecia na companhia do prefeito. Ela afirmou que conhecia Tortorello havia cerca de 30 anos. "Tomávamos café numa padaria da rua Visconde de Inhaúma (Vila Gerty), do lado da minha loja." Carmela mostrou uma das fotos, que segurava com delicadeza, e contou: "Esta foi a última vez que o vi, já na campanha eleitoral deste ano."

Para ir ao velório, a comerciante acordou cedo e tomou um táxi até o parque Chico Mendes, onde fica o Paço. "Jamais deixaria de vir", comentou. Mais de 200 coroas de flores foram enviadas ao velório em homenagem ao prefeito morto. Entre elas, havia uma que representava a Presidência da República. Nem uma chuva fina desanimou os visitantes. Eles voltaram a aumentar a fila no parque por volta das 8h30, após uma madrugada mais tranqüila.

Bombeiro – "Não tem como fazer de conta que é um dia como qualquer outro. Ele foi um bom prefeito, principalmente na área da educação", disse a digitadora Claudete Zippo, 49 anos. Para o major da reserva José Carlos Sena, 56 anos, o prefeito marcou sua vida profissional. Em 1991, Sena comandou o Corpo de Bombeiros de São Caetano. Foi quando Tortorello construiu o quartel da corporação na avenida Goiás. "Ele realmente punha em prática as idéias que comprava. Estivesse onde eu estivesse no mundo, não deixaria de vir."

Tortorello conseguiu estabelecer canais de comunicação com figuras importantes do mundo político e dos negócios. Mas paralelamente manteve sintonia com pessoas simples do povo. O homem encarregado de preparar a sepultura do prefeito pintava neste sábado de branco as paredes laterais do jazigo. Morador no Jardim Zaíra, em Mauá, ele contou que tem muitas lembranças do prefeito, das vezes em que Tortorello acompanhava famílias desoladas durante o enterro de parentes no Cemitério das Lágrimas. "Ele conversava bastante com a gente. Estava sempre aqui."

Calçado com sandálias e vestido de forma simples, um outro visitante que fez questão de permanecer incógnito acompanhava com interesse os reparos no jazigo. Morador em São Mateus, bairro pobre da periferia de São Paulo, o catador de papelão não esquece que o prefeito interferiu para que continuasse a realizar seu trabalho no bairro Fundação. "Trabalhei na parte da manhã, mas não poderia deixar de visitar o prefeito. Ele era um bom sujeito", afirmou.

Logo que sete soldados do Corpo de Bombeiros entraram na alameda que leva à sepultura, um dos populares saudou a memória do prefeito com um "Viva Tortorello!" imediatamente acompanhado pela multidão, que rendeu aplausos em homenagem.

Madrugada – O velório juntou diferentes personagens que lá compareceram para uma última homenagem a Luís Tortorello. Ou para, silenciosamente, se despedir daquele que reuniu, pelo menos da 1h até a manhãzinha deste sábado, poucas pessoas no Paço Municipal. Ao contrário da noite de sexta-feira, já não havia enormes filas. O prefeito eleito, José Auricchio Júnior (PTB), recepcionava os visitantes. Recebia abraços de solidariedade. O ex-presidente da Câmara, Luiz Emiliani, chegou às 4h. "É uma perda irreparável. Perdemos um grande líder de nossa política", disse.

A pintora Albina Maria João, 55 anos, que trabalha e expõe na Praça da República, em São Paulo, mora pertinho da Prefeitura de São Caetano. Sexta, ela deitou mais cedo, mas não conseguia dormir. De repente, pulou da cama e resolveu ir ao velório. "Eu guardava mágoas do Tortorello, mas vim aqui para me reconciliar. É que perseguiam a minha cunhada no funcionalismo. Só que ele, coitado, não tinha nenhuma culpa. Raiva de quê? Você não leva nada. Agora, estou bem mais aliviada", desabafou na saída.




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