Internacional Titulo
Igreja foi a primeira a desafiar Pinochet
Por Da AFP
10/12/2006 | 19:36
Compartilhar notícia


A Igreja católica foi a primeira voz que se levantou no Chile para denunciar as violações dos direitos humanos depois do golpe de Estado que, em 1973, instalou a ditadura do general Augusto Pinochet, cuja repressão incluiu o assassinato de cinco padres.

O bispo emérito Jorge Hourton evocou a mescla de dor e satisfação pelo papel da Igreja nos 17 anos de ditadura. "Foram anos dourados, foi maravilhoso", comentou, ao recordar suas funções como bispo auxiliar de Santiago, junto ao cardeal Raúl Silva Henríquez e outros padre que decidiram se transformar na "voz dos que não têm voz" quando o regime militar fechou o parlamento, proscreveu os partidos e sindicatos e iniciou a perseguição de quem apoiava o governo do presidente Salvador Allende.

Depois do suicídio de Allende em La Moneda e dos primeiros fuzilamentos de seus partidários, a Igreja emitiu uma primeira declaração pedindo "respeito pelos vencidos". As novas autoridades quiseram impedir a publicação da nota no jornal El Mercurio, conforme relata o livro "A História Oculta do Regime Militar", de Ascanio Cavallo, Manuel Salazar e Oscar Sepúlveda. "A união nos tornou forte e fomos bastante intransigentes", recordou monsenhor Hourton.

O regime militar e seus assessores, vinculados à direita e ao empresariado, tinham razões para olhar com desconfiança a Igreja, que manteve boas relações com o governo socialista de Allende e teve alguns sacerdotes abertamente partidários do socialismo.

"No socialismo há mais valores evangélicos do que no capitalismo. De fato, o socialismo abre uma esperança para que o homem possa ser mais pleno e, por isso mesmo, mais evangélico", proclamou um documento assinado por 80 sacerdotes em maio de 1971, seis meses depois do início da administração Allende.

Os atritos entre a ditadura de Pinochet e o clero se acentuaram dia após dia e, em abril de 1974, o cardeal Silva Henríquez recebeu as primeiras ameaças de morte, segundo revelou na Catedral Metropolitana de Santiago durante a homilia pela Páscoa.

Entre as primeiras vítimas da repressão, em setembro de 1973, uma patrulha militar prendeu e fuzilou o padre catalão Juan Alsina Bustos, cujo corpo apareceu numa das margens do rio Mapocho, que cruza Santiago.

Seguiram-se o padre britânico Michel Woodword, o chileno Gerardo Poblete e o espanhol Antonio Llidó, que desapareceu em outubro de 1974 depois de ser detido por agentes da Dina (Direção de Inteligência Nacional, a polícia política de Pinochet). Além disso, em 1984, o padre francês André Jarlan foi morto por policiais que reprimiam um protesto da oposição.

Pinochet exigiu a dissolução do Comitê de Cooperação para a Paz, que as igrejas cristãs haviam criado para ajudar os perseguidos. Em seu lugar, em 1975, nasceu o Vicariato da Solidariedade, a cargo do vigário Cristián Precht, que, ao longo da ditadura, entregou ajuda judicial, material e espiritual aos familiares de milhares de vítimas da repressão. "A Igreja salvou muitas vidas, de forma muito clara e com coragem extraordinária", afirmou o último responsável por essa instituição, bispo Sergio Valech.

O caminho que seguiram os bispos chilenos ganhou maior legitimidade quando o papa João Paulo II visitou o Chile em abril de 1987 para apoiar seus esforços em favor da "reconciliação nacional". O papa, no entanto, desatou uma polêmica quando apareceu junto a Pinochet, que se proclamava católico, apostólico e romano, saudando um grupo de partidários do regime dos balcões de La Moneda, onde ainda havia marcas das balas disparadas pelos militares durante o golpe.



Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;