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Mao versus Harry Potter
Alessandro Soares
Do Diário do Grande ABC
08/09/2006 | 18:37
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Mao Tse-tung (1893-1976), líder da Revolução Cultural da China, perdeu para Harry Potter. O grande timoneiro da nova China, morto há exatos 30 anos, é cada vez menos um ícone que estampa retratos, bonés, camisetas e pins. Personagens ocidentais como o bruxinho inglês já superam a imagem do líder comunista na China, com uma sociedade menos ligada às citações de Mao no pequeno, e não mais obrigatório, livro vermelho.

Segundo a agência de notícias France Press, o empresário Chen Jiashu, 50 anos, fez um verdadeiro negócio da China ao substituir Mao por Harry Potter porque é isso que as pessoas desejam ter. Proprietário de uma pequena fábrica que produz pins – milhões deles – Chen ganha mais na medida em que a China abandona aos poucos seus heróis do comunismo por ícones ocidentais do comercialismo. A fábrica fica em Wenzhou, cidade no leste do país onde não faltam empreendedores desde 1980, quando o dirigente Deng Xiaoping (1976-1997) iniciou a longa marcha do país para se tornar um gigante global.

Os pedidos de produtos com a efígie de Mao já foram de 200 milhões anuais, e este ano quase chegaram a 10 mil unidades. A produção de Chen se concentra hoje em material promocional de personagens, filmes e produtos ocidentais, como Harry Potter, Star Wars ou Coca-Cola. Impensável há 30 anos, quando chinês leal era o chinês que usava alguma coisa com referência a Mao. “Ninguém compraria pins de Mao para usar na roupa hoje em dia”, diz Chen, que foi soldado do exército nos anos 1970.

A figura de Mao ainda tem ressonância em muitos lares na China, com direito a retrato na parede e em edifícios oficiais. Sua mão-de-ferro sobre a sociedade chinesa, contudo, diminui na razão inversa do crescimento de sua imagem utilizada em bugigangas para turistas colecionarem ou para chineses supersticiosos terem como amuleto. Há uma crença no país de que a figura de Mao traria sorte e paz. “Eu acredito nisso também”, diz Chen, que, por via das dúvidas, não vai parar de produzir para ficar contando com a sorte.

Enquanto a ficção ocidental garante trabalho para a mão-de-obra barata da China, outro ícone da esquerda responde por boas vendas na maior nação capitalista. O rosto de Ernesto Che Guevara (1928-1967) rodou o mundo em pôsteres nos quartos de estudantes a partir da foto clicada em 1960 por Alberto Korda (1928-2002). Virou painel nas mãos de Andy Warhol e foi parar nas lojas de moda e suvenires dos Estados Unidos.

Em 2002, o rosto de Che cobriu as curvas de Gisele Bündchen e Adriana Lima em desfile de biquíni na Argentina, terra natal do guerrilheiro. Madonna usou num show em 2003 uma camiseta do revolucionário que ajudou Fidel Castro a fazer a revolução em Cuba em 1959. Desde então, houve um incremento de vendas de produtos com a estampa da foto famosa, vista inclusive numa bolsa Louis Vuitton usada pela atriz Elizabeth Hurley. Bonés, chaveiros e camisetas do guerrilheiro são vendidos até para quem nunca ouviu falar em Che e conhece melhor o personagem de desenho animado Bob Esponja, outro campeão de bugigangas.

Por outro lado, o último ícone da esquerda, Fidel Castro, ainda em recuperação de saúde em Cuba, teve de ver a revista Forbes publicar que é um dos homens mais ricos do mundo, com US$ 900 milhões, valores que poderiam ser o PIB cubano.

Se a revista exagerou na dose, ou se usou critérios pouco confiáveis para chegar a esses números, não vem ao caso. O fato é que Fidel, vivo ou morto, deve render grandes somas para apostadores de sites na internet. Segundo o jornal italiano Corriere della Sera, as apostas dos mais “cínicos” sinalizam este mês ou no máximo outubro para o derradeiro discurso de Fidel. O jornal menciona também que este tipo de aposta vem de Miami. Ícones da esquerda, melhor uni-vos.



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