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Vila Euclides é morada de comunidade muçulmana

Bairro de São Bernardo abriga um terço dos 600 islâmicos residentes no município

Por Vanessa de Oliveira
Do Diário do Grande ABC
09/09/2014 | 07:00
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Orlando Filho/DGABC


Um bairro na região central de São Bernardo, mas marcado pela presença de pessoas vindas de países como Arábia Saudita, Síria, Líbano, e que têm como religião o islamismo. Essa é a Vila Euclides, onde estima-se que, das cerca de 600 famílias muçulmanas que vivem no município, um terço reside na área.

O sheik Jihad Hammadeh, 49 anos, de origem síria, é líder muçulmano não apenas local, mas porta-voz da comunidade islâmica no Brasil. Ele conta que a imigração árabe em solo brasileiro vem de longos tempos. “Vieram para cá buscando uma qualidade de vida melhor e, muitas vezes, fugidos de guerras. Muitos escolheram o Brasil por conta da visita do imperador Dom Pedro II aos países árabes, que abriu as portas do País para os imigrantes. A maior parte se estabeleceu primeiro em São Paulo. Trabalhavam como mascates, iam até as fazendas para vender seus produtos, e o Grande ABC tinha muitas dessas propriedades. Assim começaram a se estabelecer e foram crescendo junto com a população”, explica Hammadeh.

A religião islâmica é constituída por seis pilares, entre os quais a crença em um deus único. “Acreditamos que Deus não gerou nem foi gerado, Ele é único, é o criador”, destaca o sheik. Outro ponto são os livros sagrados, um deles o Alcorão, revelado ao profeta Muhammad (nascido após a morte de Jesus). “O Alcorão é o código de vida do muçulmano, serve como uma Constituição. Acreditamos que são as normas que Deus estabeleceu para que o ser humano pudesse encontrar a felicidade.”

Dos pilares da religião estão ainda a crença nos anjos, nos profetas (mensageiros enviados por Deus, entre os quais Jesus e Muhammad), no destino (aquele que Deus escolheu e o escolhido por nós) e no juízo final.

O islamismo ganhou destaque no Brasil em 2001, com a exibição da novela O Clone, da qual Hammadeh participou como consultor da autora Glória Perez.

GUERRA

Quem vive na Vila Euclides deixou para trás cenário desolador provocado por conflitos religiosos, parte deles por pessoas que se dizem adeptas ao Islã. A situação gera preconceito. “Por conta da pouca literatura e parte da mídia internacional fazendo a divulgação negativa, associando o terrorismo ao islamismo, há uma ideia negativa da religião. Por outro lado, quando se fala que os muçulmanos são terroristas, cria dentro do imaginário das pessoas uma curiosidade, elas querem saber quem é esse bicho-papão e buscam informações. Assim se dão conta de que a religião islâmica é de Deus e Deus é paz. Os erros de alguns adeptos são problemas de caráter do ser humano”, garante o sheik.

Colégio islâmico ensina Árabe e princípios a alunos

Os princípios do islamismo também estão presentes na Educação oferecida pelo Colégio Medina, na Rua Ruy Barbosa. A escola particular tem 164 alunos com idades entre 2 e 14 anos, e trabalha os conceitos não apenas para os que são muçulmanos, como também para os 22 estudantes não adeptos da religião.

Além das tradicionais matérias lecionadas por qualquer instituição de ensino, as crianças e adolescentes têm aula diária de Árabe, com duração de 50 minutos. Hanan Najib Mourad, nascida no Líbano, é um dos quatro docentes do idioma. “Para os alunos que não conhecem a língua, é bom ensiná-los até os 7 anos, pois nessa idade eles captam mais fácil”, explica.

Outra disciplina que integra a grade escolar, do 1º ao 5º ano, é denominada Valores, passada duas vezes por semana. “Por bimestre, dividimos os valores (cooperação, fé, felicidade, simplicidade, respeito, honestidade, amor) e a professora tenta enfatizá-los fazendo atividades com jogos cooperativos, brincadeiras, contando histórias que os levem à reflexão. Hoje o mundo mostra que felicidade é ter, consumir, e a nossa proposta é mostrar que estar feliz é estar junto às pessoas que amamos, não importa onde”, fala a coordenadora pedagógica Rosa Aparecida de Faria, 48 anos.

Os profissionais da escola não só ensinam como conhecem um pouco mais da realidade vivida por muitos estudantes antes de chegarem ao Brasil. “Quanto dá algum trovão, por exemplo, vemos o desespero de alguns pensando que é uma bomba”, relata.

Os funcionários aprendem costumes do povo muçulmano e os levam como lição de vida. “No Ramadã (mês no qual as pessoas se abstêm, desde o raiar da aurora até o pôr do sol, da ingestão de qualquer alimento e bebida) eles têm essa atitude porque precisam sentir o que sentem os que não têm água e comida, para valorizar e agradecer a Deus por aquilo que possuem. Isso é lindo”, afirma Rosa.

Mesquita construída em 1989 é atrativo histórico

Inaugurada em 1989, a mesquita Abu Bakr Assidik, localizada na Rua Henrique Alves dos Santos, é o principal ponto de encontro dos muçulmanos residentes em São Bernardo e na região do Grande ABC, além de atrativo histórico municipal. A exuberância da construção se destaca por duas torres com 27 metros de altura cada.

Às sextas-feiras é realizada reunião semanal obrigatória para os homens, às 13h. Inicialmente, há um sermão de aproximadamente 20 minutos, seguido de oração e confraternização.

Por dia, cinco orações devem ser feitas, nos seguintes horários: 5h30, 12h30, 16h, 18h10 e 20h. No caso do homem estar distante da mesquita em um desses momentos, deve rezar onde quer que esteja.

As mulheres não se juntam aos homens no momento das orações, para evitar distração de ambos. Elas podem rezar em qualquer lugar, não sendo obrigadas a frequentar o local, mas possuem um espaço exclusivo, espécie de mezanino instalado acima do salão dos homens.

Com capacidade para 1.000 pessoas, projeto prevê a ampliação da área devido ao crescimento de muçulmanos que procuram a mesquita.

O templo é mantido pela Sociedade Islâmica de Beneficência Abu Bakr Assidik, nome do primeiro califa do Islã, companheiro do profeta Muhammad e professa o lema Em nome de Deus clemente e misericordioso. Lá, por meio da Sociedade Islâmica, também são oferecidos ensino da religião e diversas atividades culturais.

Estádio foi palco de atos políticos e lutas sindicais durante a ditadura

Embora seja um bairro com forte presença muçulmana, a Vila Euclides foi cenário de um dos momentos mais marcantes da história brasileira. O Estádio 1º de Maio, localizado na Rua Olavo Bilac, sediou não apenas jogos de futebol, mas também inúmeros atos políticos e protestos de trabalhadores.

Inaugurado em 20 de agosto de 1968, o espaço ganhou notoriedade 11 anos depois, com a maior greve do País, que atraiu ao local mais de 70 mil metalúrgicos do Grande ABC.

A área foi tomada pela polícia, que reprimiu os grevistas, liderados pelo então metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva.

No dia 30 de janeiro de 2011, na condição de ex-presidente do Brasil, após oito anos de governo, Lula voltou ao 1º de Maio, em duelo entre São Bernardo e Corinthians, pela quinta rodada do Campeonato Paulista. Na ocasião, a convite da Prefeitura, ele reinaugurou o estádio, que tem capacidade para 17 mil pessoas. 




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