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‘Não quero misericórdia, quero justiça’, diz Dirceu
Roney Domingos
Enviado a Brasília
01/12/2005 | 08:24
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"Não quero misericórdia, quero justiça", disse o deputado José Dirceu em um dos momentos mais contundentes do último discurso que fez antes da votação do processo de sua cassação no plenário da Câmara. Dirceu pediu para falar durante o tempo reservado a seu advogado. Ficou com 50 minutos, mas utilizou apenas 45. Foi aplaudido três vezes, no início, no meio e no final da exposição, durante a qual a Câmara viveu um dos raros momentos de silêncio no dia de ontem.

Dirceu fez um discurso emocionado, incisivo. Não chorou, mas lembrou que a perda de mandato fará com que só volte à vida pública em 2016, quando já tiver 70 anos. Nesse ponto, ironizou, ao afirmar que confia no avanço da medicina para conservar-se com boa saúde. Lembrou que não há provas e que é vítima de uma "degola política", que não deveria ser admitida na Câmara. Atacou a imprensa e defendeu que os veículos de comunicação esclareçam seu posicionamento político-partidário. Exigiu que os deputados sigam a consciência, arrancando aplausos, após declarar que não pretende misericórdia, mas justiça. "Quero amanhecer amanhã como um cidadão que prestou contas."

O ex-ministro dividiu o seu discurso, que não foi lido, mas dito de improviso, em três partes básicas. Na primeira, falou do direito que tem como cidadão de se defender. "Tenho direito à presunção da inocência e não da culpa. Não é verdade que fui ao Supremo para ganhar tempo." Disse que espera ser investigado e que a Polícia Federal e as CPIs apresentem ainda neste ano os resultados desses trabalhos.

Erros políticos – Na segunda parte, Dirceu reconheceu erros políticos, lamentou ter saído do governo Lula e não ter trabalhado pela reforma política. Anunciou que estava por vir uma "degola" e alertou os deputados para o fato de que a Câmara, mesmo pressionada pela "opinião publicada", não deve transformar-se em tribunal de exceção. No fim, defendeu o governo Lula, disse que nunca fez críticas ao STF (Supremo Tribunal Federal) e ao Congresso, mesmo quando derrotado.

Recusou o rótulo de stalinista e disse que todas as eleições que disputou na vida foram diretas. "Não aplaudi quando ganhei e não critiquei quando perdi, o que seria uma atitude antidemocrática." Garantiu que não sairá da cena pública. "Não vão me dobrar. Não vou cair. Vou ter de refazer a minha vida nos próximos cinco ou seis anos".

O presidente da Comissão de Ética da Câmara, Ricardo Izar (PTB-SP), foi o primeiro a falar após o discurso de Dirceu. "Demos amplo direito de defesa a Dirceu e a seu advogado", disse. "Trabalhamos com o nosso regimento na mão. O Conselho de Ética não é tribunal de justiça. O julgamento no conselho é completamente diferente do julgamento na Justiça. Alguns ministros do STF não sabem até hoje como funciona o Conselho de Ética", completou.

Trapalhada – Na seqüência de discursos, alguns deputados que tentaram ajudar Dirceu acabaram atrapalhando. Vicente Cascione (PTB-SP) lembrou que defendeu o coronel Ubiratan Guimarães – que comandou a invasão ao presídio do Carandiru, em 1992, provocando 111 mortes – e que não tem medo de votar contra o sentimento popular. Acabou dando munição para o deputado Babá (P-SOL-PA) acrescentar que defender Dirceu e o coronel Ubiratan é mais ou menos a mesma coisa.

Já o deputado João Fontes (PDT-SE) levantou uma ameaça. "Não votar a cassação de Dirceu é preparar a testa para aquelas bengaladas", disse, lembrando o episódio do escritor Yves Hublet, que na terça-feira desferiu duas bengaladas em Dirceu. Durante a votação, Dirceu permaneceu bem-disposto e descontraído. Sorridente, circulou pelo plenário e cumprimentou colegas.

Luizinho – O deputado federal Professor Luizinho, de Santo André, que também sofre processo no Conselho de Ética, disse ontem, antes da cassação, que nenhuma decisão do Supremo Tribunal Federal sobre os trabalhos do Conselho de Ética poderá interferir no processo que pesa contra ele.




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