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CD mostra Beatles chorões
Dojival Filho
Do Diário do Grande ABC
01/09/2005 | 08:36
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A formação do quarteto mais famoso da história do pop, caso seus músicos tivessem nascido em terras brasileiras, certamente teria sido outra. Por exemplo: John no cavaquinho, Paul no violão, George no bandolim e Ringo no pandeiro. Exagero? Alguns podem até encarar dessa forma, mas a audição de Beatles ‘n’ Choro 4 (Deckdisc, R$ 24,90 em média) comprova que há muito mais coisas entre guitarras e tamborins do que supõem ouvidos desatentos.

A começar pelo idealizador da série, o cantor Renato Russo (1960-1996), da Legião Urbana. Pouco antes de morrer, Renato, um beatlemaníaco de primeira hora, sugeriu ao então diretor artístico da EMI, João Augusto, que fizesse um projeto em que o repertório dos cabeludos de Liverpool fosse adaptado para o ritmo brasileiro. A proposta só ganhou forma em 2002, quando Augusto, já no comando da gravadora Deckdisc, lançou o primeiro volume.

Fases variadas – Produzido pelo cavaquinista e arranjador Henrique Cazes, que também toca em algumas faixas, o quarto disco da série apresenta canções de diversas fases do grupo britânico. Há desde She Loves You – dos primeiros tempos de beatlemania – até a intrincada suíte You Never Give Me Your Money, do último álbum da banda, Abbey Road.

Essa última merece destaque pelo trabalho de adaptação feito pelo bandolinista Hamilton de Miranda. Composta por um tema melódico principal seguido por melodias que se completam, a canção é um dos pontos de convergência do disco. Fonte de inspiração do choro, a música erudita passou a dialogar cada vez mais com o rock, a partir da segunda metade da década de 60.

Ainda no campo das conexões interessantes, destaque para The Inner Light, composição da fase em que o místico George Harrison (1943-2001) encantou-se com a filosofia e o exotismo das sonoridades indianas. Arranjada em ritmo de xote – uma das manifestações musicais nordestinas – pelo maestro Carlos Malta, esta faixa mostra o quanto é estreita a relação entre as escalas usadas na música nordestina e na oriental. Ticket to Ride e The Night Before, ambas gravadas no disco Help, de 1965, ganham uma roupagem bem dançante, que faria a alegria de qualquer roda de bambas.

Bandolim elétrico – Em se tratando de fusões entre o rock e o choro, não há como esquecer duas bem-sucedidas misturas produzidas no Brasil na década de 70: os grupos Novos Baianos e A Cor do Som. O primeiro, empunhou a bandeira roqueira nos primeiros discos, até se render aos encantos da cadência bonita do choro e produzir o clássico Acabou Chorare (1972), em que também estão presentes o samba e o baião.

Liderado pelo virtuoso guitarrista Armandinho (filho de Osmar, da dupla de criadores do lendário trio elétrico baiano Dodô & Osmar), a banda A Cor do Som literalmente bagunçou o coreto dos chorões. Por exemplo, eletrificou o estilo e brindou o público com interpretações inspiradas de músicas como Assanhado, de Jacob do Bandolim.

Outros lançamentos

Magic Numbers
Uma versão alternativa do Mamas & The Papas. É desta maneira que parte da crítica especializada tem se referido ao grupo norte-americano Magic Numbers, que tem apenas um ano de formação e está lançando seu disco de estréia homônimo (EMI, R$27,50). Formado pelos irmãos Romeo e Michelle Stodart e Angela e Sean Gannon (bateria), o grupo tem um jeitão hippie que se revela em harmonias alegres e de fácil assimilação. As composições têm forte apelo pop, com leves pitadas de distorção.

Os bons momentos ficam por conta de Mornings Eleven, do hit Don’t Give Up The Fight e This Love. Mas, nada pode ser considerado brilhante e o grupo ainda precisa encontrar o próprio caminho. Levando em consideração a estréia, vai demorar pelos menos uns três verões para que o Magic Numbers se iguale à banda matriz.

Nenhum de Nós
O grupo gaúcho liderado pelo vocalista Thedy Corrêa voltou ao estúdio para produzir um disco com canções inéditas, Pequeno Universo (Orbeat Music, R$ 23,50), quatro anos após o lançamento de Histórias Reais, Seres Imaginários. No repertório, sobram influências de pop rock (Cada Lugar) psicodelismo sessentista (Dança do Tempo) e folk (Divididos), temperados com regionalismo.

Há ainda Raquel, canção de autoria do emergente compositor uruguaio Jorge Drexler, e a bizarra releitura de Eu e Você Sempre, do sambista Jorge Aragão (sim, é aquela mesma música do barraco que desabou e do barco que se perdeu). Uma apelação desnecessária, para dizer o mínimo. De um modo geral, o disco passeia entre clichês harmônicos e poéticos que nada acrescentam à discografia da banda. Bola fora! H

Bojo
Em seu quinto trabalho, Procedimento (Tratore, R$ 21,50), o grupo paulistano Bojo, que já se acostumou ao rótulo de jazz eletrônico, preserva o gosto pelo experimentalismo. Gravado em apenas três dias, o álbum foi produzido totalmente na base do improviso e está repleto de letras sem nexo e harmonias dissonantes, como em Procedimento 2 ("No seu ó, da caixa/ Conserva, conserva").

Procedimento 3 é uma deturpação do hino nacional ("Minguante pelas sobras da dureza/chinelo esporte, inválido teu osso"). Em Cicatriz 4H59M, o baticum eletrônico é precedido por sinais de emissoras de rádio que se alternam. Quem gostou da parceria do grupo com a cantora Maria Alcina poderá torcer o nariz, já que Procedimento é um trabalho que deve se restringir aos fãs mais radicais.

Emílio Santiago
O cantor Emílio Santiago registra mais clássicos da música popular no CD ao vivo O Melhor das Aquarelas (Indie Records, R$24,90). O show que resultou no disco foi realizado em março passado, na casa de shows Canecão, no Rio, e ganhou

versão também em DVD.

Entre as 15 faixas do álbum, não falta espaço para a suavidade bossa-novista (Coisas da Paixão e Reciclar), boleros derramados (no medley com Desenho de Giz e Papel Machê), a imortal Eu Sei que Vou te Amar e, como não poderia deixar de ser, Aquarela do Brasil, de Ary Barroso. Com a experiência adquirida em longos anos de estrada, Emílio presenteia o ouvinte com a suavidade de suas interpretações e prova que afinação combina com popularidade.




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