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Decisão leva Supremo a discutir seus ‘limites’
Roney Domingos
Enviado a Brasília
01/12/2005 | 08:25
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Após recolocar a decisão do futuro político do ex-ministro José Dirceu nas mãos da Câmara dos Deputados, os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) tiveram nesta quarta-feira uma grave discussão sobre o papel que o Judiciário deve exercer em casos como o do petista. O presidente do STF, Nelson Jobim, atacou "juristas de ocasião" e jornalistas de boa fé, mas mal informados por esses juristas, que criticaram o direito de o presidente votar em certos tipos de processo.

Dirceu recorreu ao Supremo (guardião da Constituição) alegando, entre outras razões, que não teve amplo direito de defesa, como a Constituição determina. Argumentou que não pôde apresentar contraprovas ou novos argumentos para responder ao testemunho da presidente do Banco Rural, Kátia Rebelo, definitivo e contundente para a tese da acusação – ela disse, por exemplo, que Dirceu usou o cargo de ministro em defesa de interesses pessoais.

O Supremo decidiu nesta quarta-feira, por 6 votos a 5, que fosse retirado do relatório do Conselho de Ética o depoimento de Kátia. Testemunha de acusação, ela prestou depoimento depois das testemunhas de defesa, o que foi considerado irregular pelo Supremo, que não viu, porém, necessidade de ser produzido outro relatório.

Sepúlveda – Os ministros mostraram-se impressionados quando o ministro Sepúlveda Pertence, que pedira vistas do relatório, afirmou que as testemunhas de acusação foram deliberadamente convocadas para depor antes das testemunhas de defesa. Ele votou favoravelmente a Dirceu, nesta quarta.

O Supremo decidiu após a longa discussão que o processo contra Dirceu poderia continuar, desde que suprimido do relatório final o testemunho de Katia Rebelo, conforme o voto do ministro César Peluso. Outra opção, derrotada, foi o voto do ministro Marco Aurélio, que também mandava seguir o processo, mas daria chance para a defesa de responder ao testemunho de Kátia.

O tempo para definir o tema específico foi praticamente igual ou menor do que o tempo que os ministros gastaram na discussão sobre os limites de atuação do Supremo. Para parte deles – a maioria –, o Supremo tem o dever de resguardar a Constituição e nesse sentido precisa estender sua atuação até mesmo quando o cidadão atingido é um deputado federal (Dirceu) processado por um órgão interno da Câmara dos Deputados (Conselho de Ética), sem que isso invada a autonomia do Legislativo. Para outros, como Joaquim Barbosa, relator do processo contra Dirceu, o Supremo não pode invadir questões relativas a outro poder.

Bizantinices – Barbosa, que no primeiro julgamento negou a liminar a Dirceu, deixou clara sua insatisfação em ter de votar a respeito de um assunto interno da Câmara. Escolher entre as duas propostas significou para ele voltar atrás na determinação de não se envolver, ainda por cima, favorecendo Dirceu. No ápice da irritação, usou termos como "bizantinices" para referir-se a detalhes da tramitação do processo e defendeu a tese de que na maioria das democracias o Poder Judiciário não se intromete em questões do Legislativo. Mas foi forçado a recuar quando levantou o exemplo dos Estados Unidos, onde a Suprema Corte, segundo ele, jamais de intromete nos assuntos do Congresso. Celso Mello e outros colegas lembraram pelo menos dois episódios em que esse tipo de relação ocorreu. Barbosa perdeu de novo a discussão quando afirmou que Direito brasileiro imita o norte-americano. Nesse ponto foi rebatido por Jobim, que ironizou a informação.

Barbosa foi duramente contestado nesses momentos pelo presidente do STF, Nelson Jobim, e pelos ministros Sepúlveda Pertence e Celso de Mello. Este último foi enfático ao afirmar que o Supremo não pode deixar que a Câmara desrespeite a Constituição. "Não estamos discutindo meras firulas jurídicas", afirmou, exaltado. E depois citou uma frase conhecida no meio jurídico, segundo a qual, "onde houver lesão ao direito, lá estará um juiz".

Os ministros tiveram dificuldade para chegar a um consenso sobre o caso Dirceu. Jobim chegou a propor um critério matemático para poder as posições de cada um dos ministros, porque há divergências primeiro sobre a concessão da liminar e depois sobre a extensão dela.




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