Cotidiano Titulo Coluna
A normalidade das coisas
Por Rodolfo de Souza
31/10/2021 | 00:01
Compartilhar notícia


Normal é uma palavra que serve para designar algo costumeiro, que já se tornou comum na vida das pessoas. Seja ele bom ou ruim. Trocando em miúdos, o corriqueiro dia a dia está inserido numa normalidade preguiçosa que se contrapõe a qualquer gesto ou intenção de alterá-la.

Infelizmente, claro, o termo está relacionado, sobretudo aqui, à bandidagem, às mortes pela peste, ao desrespeito, à violência, à miséria e a um sem fim de situações, as mais torpes, que encheriam páginas e páginas como esta, caso eu quisesse aborrecer o leitor, lembrando-o de coisas que ele talvez queira esquecer. Mas estamos todos imbuídos de um desejo mútuo de mudança, posso sentir. É possível mudar tudo isso, afinal, deitando fora de seu leito aquilo que hoje repousa tranquilo numa realidade desconcertante. Aviltante, por assim dizer.

Em dias atuais muito se fala no novo normal. Expressão que ganhou a mídia e se impôs como quem vem para ficar. Possivelmente tenha alguma relação com a tendência ao surgimento de novas pandemias, como declararam recentemente alguns cientistas. Cabe, então, a pergunta: a peste entrou para o seleto grupo da normalidade, assim como a política do atraso, a corrupção a céu aberto, a destruição do meio ambiente, da cultura, a compra do osso e a catança de restos no caminhão de lixo? Que diabo de novo normal é esse que despreza a vida, que caminha na contramão do bom senso? Será preciso nos habituarmos à patifaria autorizada? Pelo que tudo indica sim, tendo em vista o que reza a cartilha que determina o fim da chuva, das árvores, dos rios, dos bichos e da saúde física e mental. Mas, novo normal, dirá o leitor atento, é expressão criada para designar o tempo pós-pandemia, a despeito de viver-se hoje um momento de tensão que extrapola a peste e não está necessariamente relacionado a ela. Até porque, a era de turbulência que se vive, independente de qualquer doença, também pode ser considerada um novíssimo normal. Era do olhar de soslaio, da respiração presa, do pé atrás. Era da incerteza e do medo, portanto.

Mas o pensamento refinado, sempre propenso ao inconformismo, já se manifesta em prol de um movimento que não se curve ao normal que elege a barbárie como liderança hegemônica no mundo, principalmente cá neste valoroso circo, em cujo picadeiro quem fala mais alto é a ignorância crônica. 

Nos últimos tempos, por exemplo, as palavras enaltecedoras da pobreza mental ganharam voz, uma vez proferidas pela liderança máxima deste aborrecido rincão. Asneiras jogadas ao vento com o propósito de confundir e desinformar; de promover a discórdia e dar poder à besta-fera que teria deixado o armário e ganhado as ruas para esnobar seu perfil autoritário e abjeto. Isso também caiu numa normalidade que se engrandece diante da cabeça baixa da gente que se revolta a cada dia, mas que ainda se cala. Porém, a esperança manda que sossegue a alma essa gente que a carrega no peito, mesmo que continue a assistir, dia a dia, aos desmandos que têm por objetivo destruir toda uma nação.

Rodolfo de Souza nasceu e mora em Santo André. É professor e autor do blog cafeecronicas.com.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;