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Poeta Fabiano Calixto lança terceira obra
Melina Dias
Do Diário do Grande ABC
11/08/2006 | 08:15
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Ele nasceu em Garanhuns (PE), cresceu no Grande ABC e preferiu ser poeta a presidente. Morador de Santo André, Fabiano Calixto, 33 anos, lança hoje seu terceiro livro de poemas, Música Possível (CosacNaify/7 Letras, 96 págs., R$ 25). Será às 19h na Alpharrabio (r. Eduardo Monteiro, 151, Santo André), lugar importante para sua trajetória típica e singular.

Típica, pois Calixto foi adolescente no Grande ABC dos anos 80. Ouvia rock, era fissurado em HQs e se permitia o ócio. Singular, pois no meio de seu caminho a pedra foi Chico Buarque. Da topada, o despertar para a leitura e o mergulho no universo do “quarteto fantástico” da poesia nacional: Bandeira, Drummond, Murilo Mendes e João Cabral de Melo Neto.

O resto é suor e apoio dos amigos. Nos 53 poemas de Música Possível é visível o aprimoramento estilístico do poeta, mas como no anterior Fábrica (2000), a cidade é quase onipresente: plúmbea, violenta, na veia. A seguir, os principais trechos da entrevista:

DIÁRIO – Com que idade chegou ao Grande ABC?
FABIANO CALIXTO – Com menos de 1 ano, bebezinho. Cresci aqui, minha formação é aqui. Estudei aqui, fiz amigos aqui, me sinto em casa aqui. A melhor província do mundo é Santandré!

DIÁRIO – Gostaria de saber sobre sua adolescência, a fase do rock’n’roll, aquele período ‘sabático’ (três anos fora da escola) e se você ainda toca.
CALIXTO – Até os 10 anos, meus interesses eram futebol e HQs – minhas primeiras leituras/literaturas. Lia semanalmente a revista Placar e muitas e muitas revistas da Marvel Comics. Ao chegar aos 10 anos (1983), conheci o rock, através da vinda das primeiras bandas estrangeiras ao país – Van Halen, Kiss, Queen, Rock in Rio etc. Aquilo era para mim uma diversão incrível. Hoje em dia pouca coisa no rock me interessa, mas à época foi muito importante. Sobre o período da escola: bem, foram anos de desencanto total, queria mesmo é tocar e ir para a boemia. Mas isso não foi nada bom. Arrependo-me bastante, pois isso atrasou, e muito, meus estudos. Não toco mais nada, apenas faço letras de música para alguns amigos compositores, como o Zé Terra, o Daniel Cerimarco e o Roberto Barranova.

DIÁRIO – Qual foi sua ligação anterior com Mauá?
CALIXTO – Trabalhei em Mauá por dois anos em bibliotecas públicas. Experiência muito interessante e, ao mesmo tempo, muito frustrante. Interessante pelo que se aprende com o dia-a-dia de uma biblioteca pública e frustrante por conta da péssima administração, isto é, tratava-se a biblioteca como algo que poderia atrair votos, escadaria para a câmara de vereadores, cabide de empregos e coisas afins, uma coisa desprezível. Alguns sujeitos tiraram grande proveito da máquina pública em Mauá, fato que me enojou profundamente.

DIÁRIO – Quando e como ocorreu exatamente aquele impacto causado pela música Geni e O Zepelim, do Chico?
CALIXTO – No colégio, não lembro, sinceramente, o ano, creio que início dos 90. Mas foi impactante ouvir aquela canção muito bem estruturada, humorada, ácida. Pensei: puxa, é isso que quero fazer! Através do Chico eu comecei a refletir, mesmo que ainda ingenuamente, sobre o poder e a beleza da linguagem.

DIÁRIO – A leitura te mostrou um novo caminho, imagino que difícil de ser percorrido. Quando você sentiu que poderia tornar públicos os seus poemas?
CALIXTO – Sim, um novo, prazeroso e instigante caminho. E o caminho é difícil sim, até hoje. Bem, um marco para mim foi quando conheci a livraria Alpharrabio – cuja proprietária, a poeta Dalila Teles Veras, acreditou no meu trabalho e generosamente publicou, em 2000, meu livro Fábrica, o começo de tudo. Iniciei ali uma gigantesca troca de informações, conheci coisas novas, cresci, fiz amigos. Ali comecei a ser crítico com meu trabalho. O processo é sempre doloroso, envolve muita coisa. Publicava textos em muitos zines do Brasil todo. E, em 98, publiquei (fiz, às próprias custas) minha plaquete Algum, que considero o ponto inicial de minha poesia –- a confluência do que eu lia/ouvia muito à época: poesia concreta, tropicália e poesia marginal.

DIÁRIO – Críticos e poetas discutem que a poesia vive um momento de intensa busca por renovação formal? Você concorda?
CALIXTO – Não sei se concordo. Tenho cada vez mais dúvidas sobre poesia – o que acho ótimo. Creio que há na poesia brasileira de hoje uma saudável multiplicidade de caminhos, em se tratando de forma, e uma renovação gigante no que diz respeito a conteúdos. Têm surgido poetas criativos (Angélica Freitas e Marília Garcia, por exemplo), existem algumas revistas de altíssimo nível (Inimigo Rumor e Cacto, por exemplo). Para o bem e para o mal, acho que é hora de pôr tudo isso na mesa, de discutir mais ampla e seriamente, de colocar de lado as vaidades (se é que isso é possível), de extinguir o tão usual “toma-lá-dá-cá”, de frustrar de vez a renascença das estúpidas patrulhas ideológicas. Rever. Urge “desafinar o coro dos contentes”, para lembrar Torquato Neto. Urge, depois da “explosão” dos anos 90, repensar tudo.

DIÁRIO – A cidade sempre está presente em sua obra. Um dia você acha que ela vai te abandonar, ou você vai conseguir abandoná-la?
CALIXTO – Não. Não há como se livrar da cidade. Nem em vida, nem depois de morto. A cidade é nossa corrente sangüínea – aliás, Sangüínea é o título de meu próximo livro de poemas.

DIÁRIO – O poeta é um chato (como diria Quintana) ou um sofredor?
CALIXTO – Na imensa maioria das vezes é um chato.



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