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Saúde de Diadema pede por socorro

Com exoneração de 82 médicos da rede pública,
a população sofre para conseguir o atendimento

Por Cadu Proieti
Do Diário do Grande ABC
16/12/2013 | 07:00
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Nario Barbosa/DGABC


A rede municipal de Saúde de Diadema pede socorro. Com a exoneração de 82 médicos neste ano, faltam profissionais para atender a população da cidade. Nas UBSs (Unidades Básicas de Saúde) do município é difícil agendar consulta por conta do quadro clínico reduzido. Com isso, as alternativas para os munícipes são o Hospital Municipal de Piraporinha e o Quarteirão da Saúde, que estão sobrecarregados e registram longas filas de espera. Problemas estruturais em alguns dos equipamentos e falta de remédio também fazem parte do cotidiano dos diademenses.

“Fiz o exame de eletrocardiograma e me pediram para mostrar ao médico o mais rápido possível. Mas cheguei aqui e não tem nem previsão para marcar consulta. Agora estou desesperada porque não sei se tenho algo grave. Tenho que ficar nessa angústia. Me disseram que só vou conseguir em janeiro. A gente só vê as coisas funcionarem em época de eleição, depois o povo fica abandonado”, reclamou a dona de casa Iraci Ester da Silva, 62 anos, que tentou se consultar com profissional na UBS da Vila Paulina.

A equipe do Diário percorreu 10 das 20 UBSs da cidade (Casa Grande, Jardim Ruyce, Conceição, Eldorado, Vila Paulina, Jardim Inamar, Paineiras, Vila São José, Promissão e Serraria). Nesses equipamentos, só é possível ser atendido com dia e hora marcados. Mesmo assim é difícil conseguir agenda. Somente na unidade do bairro Promissão, que foi recém-reformada, não houve reclamações dos usuários sobre problemas com falta de clínicos.

A unidade de Eldorado é a que apresenta pior situação: estava completamente vazia por não ter médico no momento em que a equipe de reportagem esteve no local. “Meu filho de 2 anos esteve com nariz sangrando várias vezes, trouxe ele aqui na UBS, mas só vai ter pediatra em janeiro. A situação está ridícula. A gente vem na UBS e nos mandam para o Quarteirão da Saúde. Chega lá, nos mandam de volta para a UBS, que nunca tem médico. A Saúde em Diadema está horrível. As vezes, tenho de recorrer às unidades de São Bernardo, que também é perto para mim”, relatou a operadora de caixa Ketina da Mata Santos, 20, que estava na UBS Casa Grande.

Na UPA (Unidade de Pronto Atendimento) Paineiras, que fica aberta 24 horas, os usuários reclamam que só há médico durante o dia. É o único equipamento do tipo na cidade. “A população fica revoltada quando chega aqui de madrugada e não tem ninguém para atender”, disse a líder comunitária do bairro Maria Edna de Jesus, 43.

Também não é nada fácil passar pelo Hospital Municipal de Piraporinha, onde usuários afirmaram esperar até sete horas por consulta. No Quarteirão da Saúde, a fila é de aproximadamente duas horas, mas, segundo os usuários, durante a madrugada é comum faltar médicos.

Êxodo

No início da gestão Lauro Michels (PV), Diadema contava com 570 médicos. Com a saída dos 82 profissionais neste ano, o município passou a ter quadro de 488 clínicos. A cidade registra média de 1,2 médico para cada 1.000 habitantes, abaixo das médias nacional, de 1,95 profissional a cada 1.000 brasileiros, e da Capital, que tem 4,3 médicos por 1.000. Em Cuba, onde a Saúde é considerada referência, o país registra 6,4 médicos por 1.000.

Segundo a Prefeitura, a cidade possui deficit de 100 médicos.

Preciso de médicos dispostos a trabalhar, diz Lauro Michels

O prefeito de Diadema, Lauro Michels (PV), justifica a saída de 82 médicos da rede municipal de Saúde com a explicação de que a atual gestão cobrou mais profissionalismo dos clínicos, que não teriam aceito a cobrança e pediram exoneração.

“Os médicos pediram demissão, não foi a Prefeitura que mandou embora. Se pediram demissão é porque queriam sair. Isso aconteceu porque estamos cobrando horário. Não quero que o médico venha aqui para ganhar por oito horas e trabalhar cinco. Daí fica injusto com a população”, afirmou o chefe do Executivo.

Para suprir a saída dos profissionais, Diadema aguarda ser contemplada pelo programa Mais Médicos, do governo federal. O município solicitou 34 clínicos ao Ministério da Saúde. Até o momento, a cidade recebeu apenas um. Para Lauro, a ação da presidente Dilma Rousseff (PT) mostra que a carência é nacional, principalmente em áreas precárias.

“O governo federal deu recado para o Brasil, que os próprios profissionais do País não estão tendo compromisso com os brasileiros. O compromisso dos médicos é apenas financeiro. Então fica difícil agregar funcionários em uma UBS no Eldorado, bairro com vulnerabilidade social alta e de extrema pobreza. Fica complicado para a gente colocar os profissionais onde precisamos. Eles só querem vir trabalhar no plantão do Quarteirão da Saúde porque ganham mais, é no Centro. Quero médico para minha periferia”, argumentou o prefeito.

Em Diadema, os salários de médico variam de R$ 3.342,98 para 12 horas semanais a R$ 11.143,28 para 40 horas semanais, sendo R$ 800 de valor de plantão durante a semana e R$ 1.300 aos fins de semana. Do quadro, 73% dos funcionários têm gratificação.

Diante dessa situação, a Prefeitura informou que estuda proposta para gratificação e/ou aumento salarial para os profissionais. “A contratação está aberta. Inclusive, peço publicamente para os médicos interessados virem para Diadema, que estamos contratando. Quem quiser trabalhar, tem emprego”, comentou Lauro. “Queremos gente disposta a trabalhar. O cara que vem, bate o cartão e vai embora sem botar a mão no paciente, a gente não quer. Não adiante ter médico para a população reclamar do atendimento.

Profissional diz que pediu demissão por mudanças feitas pela atual gestão

Ao rebater as acusações do prefeito de Diadema Lauro Michels (PV) – que acusou os 82 médicos de pedir exoneração por não aceitar cobranças por mais profissionalismo –, uma clínica que pediu demissão da Prefeitura afirmou que saiu por não concordar com mudanças implementadas no sistema de Saúde pela atual gestão. Ela pediu para não ser identificada.

“Falaram que iam transferir a gente. Na Saúde da Família, a gente trabalha com cuidado contínuo do paciente e acompanhamento da família. Trabalhar sem saber como ia ser o dia seguinte é ruim. Por isso, pedimos para sair.

A Prefeitura não dava nenhuma mostra de que ia nos dar condições de continuar atuando da mesma forma”, disse.

De acordo com a profissional, os médicos descontentes com a situação entregaram carta de reivindicação ao secretário de Saúde, José Augusto da Silva Ramos (PSDB), pedindo que fossem mantidas as equipes na unidade, além da possibilidade de continuar recebendo alunos de Medicina e manter os diálogos com a comunidade local. “Não tivemos garantia de nada disso”, afirmou. O tucano foi chamado de truculento por ela.

Apesar de relatar a insatisfação da equipe com as mudanças, a médica confirmou casos de falta de profissionalismo. “A gente sabe que uma parte dos que saiu era mal intencionada, foi embora para não se sujar. Tinha caso de médico que estava na escala de plantão e não ia trabalhar. Existem muitos casos desses, mas não dá para generalizar e dizer que foram todos. Eu, por exemplo, saí porque vi que a Prefeitura não iria investir mais no programa Saúde da Família.”

A equipe do Diário solicitou entrevista com o secretário, mas não conseguiu contato. Em nota, o representante da Pasta afirmou que a conduta dele pode ter sido mal interpretada “se forem considerados truculência o comprometimento do profissional e cumprimento de jornada de trabalho contratada.”




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