Setecidades Titulo À espera de uma família
Região tem 36 crianças para adoção

Número de menores em abrigos caiu 76% na pandemia; casal de São Bernardo concretiza o sonho após cinco anos

Bia Moço
Do Diário do Grande ABC
01/08/2021 | 07:00
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Claudinei Plaza/ DGABC


Adoção. Essa pequena palavra, por si só, é imensa e remete a amor e dedicação, mas, principalmente, a paciência, sobretudo diante dos processos morosos que fazem a ponte entre crianças e adolescentes e suas futuras famílias. No entanto, se de um lado a pandemia da Covid parou o mundo e atrasou todos os trâmites legais, na Vara da Infância e Juventude a crise sanitária parece não ter interferido. Segundo o TJ-SP (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo), de fevereiro a junho deste ano, as 18 unidades de acolhimento das sete cidades da região registraram queda de 76,3% de ocupação, passando de 434 crianças e adolescentes recrutados no serviço para 103.

Essa diminuição pode estar atrelada tanto à retomada dos menores aos seus lares – processo de reintegração familiar que baliza o judiciário –, ou às adoções realizadas no período. Por enquanto, dos acolhidos, somente 36 estão aptos para serem adotados, ou seja, são menores que foram destituídos de suas famílias biológicas e podem iniciar nova vida com uma das 678 pessoas que estão na fila de espera.

Um dos casos de sucesso em meio à pandemia foi o da pequena Bia (nome fictício), 2 anos, que foi recebida de braços abertos pela pessoa que mais aguardou sua chegada: o irmão Vinycius Caim Rodrigues, 13. O nome verdadeiro da menina teve de ser ocultado, já que o processo de adoção está em período de finalização. O pseudônimo utilizado foi a pedidos da família, que está com a guarda provisória da menor. Hoje, Vinycius e Bia parecem ter vivido juntos por uma eternidade. Mas foi somente há dez meses que essa história de amor de irmãos começou, ainda de forma virtual.

Moradores de São Bernardo, os pais da dupla inseparável, Sandra Caim Rodrigues, 43, e Victor Hugo Coutinho Rodrigues, 45, contaram que sempre tiveram o desejo de ter mais do que um filho. “O Vinycius nasceu de um processo de fertilização e, quando completou 4 anos, realizamos algumas novas tentativas de fertilização para darmos uma irmãzinha para ele, porém, sem sucesso”, relembrou Sandra. “Com isso, começamos a pensar em entrar no cadastro nacional de adoção”, revelou a mãe.

Sandra comentou que Vinycius sempre pediu “uma irmã”, assim mesmo, no feminino. Mas como a família sabia que o processo de adoção é demorado e sem garantia de concretização, deram a ele um cachorro de presente, o qual ele chama carinhosamente de “cachorro-irmão”.

Como o primogênito tem síndrome de Down, no cadastro nacional de adoção, feito em 2015, a família optou por receber uma criança que não tivesse deficiência, já que Vinycius demanda cuidados especiais. “Passados cinco anos após o cadastro no programa, de certa forma, já tínhamos até perdido um pouco as esperanças de sermos selecionados. Entretanto, em agosto de 2020, em plena pandemia, recebemos um telefonema do Fórum de São Bernardo questionando se ainda tínhamos interesse no processo de adoção”, relembrou Sandra, que confessou ter ficado surpresa pelo tempo que havia passado.

Com receio de que o filho, já adolescente, não tivesse mais a intenção de dividir a vida com uma irmã, os pais, antes de responderem ao fórum, conversaram com o garoto. No entanto, Vinycius foi quem mais gostou da ideia e, animado, prontamente afirmou que ele queria ter essa irmã.

No primeiro encontro, a família estava aguardando Bia chegar, em uma sala no abrigo. A menina, ainda tímida, logo se rendeu aos braços do futuro irmão, dando um beijo no rosto dele. “Foi muito emocionante. Ela nos completou”, revelou o pai. “Quando pudemos realizar o primeiro encontro com ela, foi um momento mágico, ela, primeiramente, abraçou o irmão e ficou muito à vontade com ele, foi amor à primeira vista”, completou Victor.

Vinycius fez questão de assinar a papelada junto com os pais, afirmando que ele era responsável pela pequena Bia, irmã que ele evita dizer que é adotada. “Ela nasceu para mim. Era a peça que faltava na nossa família”, finalizou a mãe, emocionada.

Mãe que venceu burocracia cria rede de apoio aos pretendentes

Ser adotante pode parecer fácil, mas o processo, que vai desde a inscrição no CNA (Cadastro Nacional de Adoção) até a adaptação do menor à família, requer tempo, paciência e, sobretudo, informação. Pensando nisso, a psicóloga e escritora Maria Angélica Amarante dos Anjos, 62 anos, moradora de São Bernardo, decidiu criar a página Anjos da Guarda – Serviços de Apoio à Adoção, para auxiliar as famílias que têm ou desejam ter filhos adotados, fazendo com que as crianças e adolescentes que estão nos abrigos encontrem um lar e uma família que os ame.

Angélica, como é chamada, casou-se com Wilson dos Anjos, 55, aos 47, em fevereiro de 2006. O sonho do casal de constituir família já fazia parte das conversas desde o namoro, entretanto, diante dos riscos de gravidez devido à idade, o casal optou por se cadastrar no CNA em 2011 em busca de uma criança que tivesse entre 7 e 10 anos. O perfil escolhido é, normalmente, o menos requerido, já que as famílias costumam dar preferência a bebês ou crianças de até 3 anos e, por isso, logo Jonas Henrique Amarante dos Anjos, 15, chegou para ser o filho tão desejado do casal. Hoje, a família é composta ainda com o cachorro Fred, de 12 anos.

“Acredito que nada é por acaso. A adoção é um reencontro de almas. O nosso filho chegou em 2011, com 8 anos e meio. Ele nasceu em abril de 2006, dois meses depois do nosso casamento”, disse, emocionada a mãe.

Com as dificuldades que encontrou no caminho, Angélica decidiu que poderia usar sua experiência para ajudar outras famílias. Hoje, sua página tem 3.700 seguidores e, só em 2019, ela teve contato com mais de 1.000 adotantes em palestras. Os livros Fui Adotada aos 56 Anos – Uma História Real de Adoção Tardia e Histórias na Varanda, retratam parte dessa trajetória.

Angélica criticou a forma como a Justiça conduz os processos de adoção, sobretudo pela demora em cumprir prazos, além de que, defende que o foco deve ser o bem do menor. “As crianças que estão disponíveis para adoção precisam de visibilidade. Os processos precisam mudar. Espero que esses meus projetos, este conceito do que é uma família verdadeira, se expandam e sejam sementes lançadas nos corações humanos.”




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