Setecidades Titulo
Uma viagem ao país dos mortos
James Capelli
Do Diário do Grande ABC
26/05/2001 | 15:32
Compartilhar notícia


  Eles encaram a morte e tentam mudar os seus efeitos. São os funcionários do Serviço Funerário de Santo André, o único do Grande ABC no qual há necromaquiagem (maquiagem de cadáveres) e preservação de corpos por meio de embalsamamento e tanatopraxia – técnicas que permitem retardar o sepultamento ou transportar o corpo a longas distâncias para o enterro. “No Brasil, só se embalsama o corpo para levá-lo para outra cidade ou país, ou quando familiares vão demorar para chegar. Nos Estados Unidos, a prática é comum. O embalsamamento é feito para ganhar tempo e organizar o funeral”, disse Manoel Cunha de Castro, diretor executivo do Serviço Funerário Municipal.

Os serviços de preservação de corpos (embalsamamento, tanatopraxia e necromaquiagem) estão disponíveis desde dezembro do ano passado e são realizados no IML (Instituto Médico Legal) de Santo André.

O médico patologista Sigmar Horst Cardoso, 54 anos, responsável pelos embalsamamentos, explicou que há diferentes técnicas de preservação dos corpos. “O embalsamamento pode ser feito de três formas: formolização, embalsamamento para viagens nacionais e para viagens internacionais.” Nos três casos, troca-se o sangue do cadáver por uma solução de formol. “Cortamos a veia femoral e deixamos o sangue sair. Depois injetamos formol”.

A formolização (R$ 257) é exigida para que o corpo possa ser transportado de uma cidade para outra por via rodoviária. O corpo fica preservado por cerca de três meses.

Para viagens nacionais por avião, o procedimento é mais complexo. “Além da formolização, as vísceras do corpo são substituídas por serragem”, disse o médico. Para as viagens internacionais, é necessário tratar quimicamente o colchão e o travesseiro da urna funerária.

As técnicas de embalsamamento exigidas para traslados internacionais são utilizadas em autoridades e personalidades que morrem. “O aspecto da pessoa fica bem-preservado. É o caso do corpo de Lênin, que está em exposição na Rússia, e o de Evita Perón, na Argentina”, disse Cardoso. Esses tipos de embalsamamento praticamente mumificam o corpo. “Ele não se decompõe. Pode se manter por 3 ou 4 mil anos”, disse o patologista.

Cardoso é professor da Universidade Federal de São Paulo, fez mais de 120 mil autópsias e mil embalsamamentos em 34 anos de carreira. Em Santo André, realizou apenas oito embalsamamentos. O preço do embalsamamento (nacional ou internacional) é de R$ 500.

A tanatopraxia é feita pelo motorista do serviço funerário, Carlos Medina de Campos, 48 anos, formado na Faculdade de Medicina de Botucatu, da USP (Universidade de São Paulo). “É como a formolização, só que a retirada do sangue e a colocação dos produtos químicos são feitas com o auxílio de uma bomba automática. O corpo fica bem-preservado por cerca de três ou quatro semanas.”

A necromaquiagem – sem custo adicional – é a maquiagem do rosto do cadáver. “Para ficar natural, parecendo dormir, e não morto”, explicou Maria do Carmo Santos, 49 anos, que fez curso na Faculdade de Medicina da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). “Uso uma massa especial para cobrir os machucados graves na face e igualo com base”, explicou. Os cosméticos usados são os mesmos dos maquiadores de teatro. “Há poucas coisas específicas, como o líquido que deixa o rosto corado.”

Ela conversa com os familiares para saber como era a pessoa falecida. “Se era discreta ou se carregava na maquiagem, qual a cor que usava de batom, essas coisas que ajudam a deixar o rosto do falecido mais natural’, contou.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;