Cultura & Lazer Titulo
Gianecchini só quer fazer rir
Por Alexandre Coelho
Da TV Press
27/11/2005 | 08:41
Compartilhar notícia


“O pobrema é todo por carsa das mina, tá ligado?”. A frase é uma pérola recorrente do personagem de Reynaldo Gianecchini em Belíssima (Globo), o borracheiro Pascoal. Mais associado a galãs dramáticos como o Edu, de Laços de Família, ou o Toni, de Esperança, o ator confessa que não é fácil se livrar do estereótipo. A tal ponto que Gianecchini adiou mais uma vez os planos de voltar a atuar no teatro, tão logo recebeu a confirmação do próprio Silvio de Abreu, autor da novela, de que faria um personagem cômico na trama. Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

PERGUNTA: Onde você buscou inspiração para fazer o Pascoal?
REYNALDO GIANECCHINI: Busquei muitas referências. No interior de São Paulo, em relação ao sotaque, por exemplo, me inspirei nas ruas, ouvindo motoboys, pessoas conversando no ônibus ou nas ruas. Também vi alguns filmes. Uma referência que eu quis trazer para o personagem foi o trabalho de Vittorio Gassman em O Incrível Exército de Brancaleone, que é incrível. Eu queria aquela soltura, de um personagem que se atrapalha com tudo mas que vai fazendo as coisas, não pensa, é mais instintivo. Também conversei com alguns mecânicos para saber como é o universo de uma borracharia, quais são os sonhos deles, como é viver ali. Foi muito interessante. A mulher é sempre um assunto muito recorrente. E o tesão pelo carro, que todos têm. É realmente uma atividade que dá muito prazer para eles.

PERGUNTA: Quanto tempo você teve para preparar o personagem?
GIANECCHINI: Cerca de dois meses. O convite surgiu em março, quando eu estava em Los Angeles e o Silvio me chamou. Na verdade, estava previsto de eu fazer a novela há bastante tempo, mas seria apenas uma participação, no papel de Pedro, que ficou com o Henri Castelli. Depois o Silvio disse que queria que eu fizesse um personagem inteiro, me propôs o Pascoal e eu adorei. Achei muita ousadia do Silvio, mas fiquei muito feliz que ele tivesse acreditado em mim para fazer um personagem como esse. É um personagem de um risco enorme para um ator. Ainda mais eu, que sempre fiz muito galã e as pessoas tendem a estereotipar. E o Pascoal é um antigalã.

PERGUNTA: O Pascoal é sensível e grosseiro ao mesmo tempo. Como você construiu essa personalidade tão ambígua?
GIANECCHINI: Eu não queria fazer um personagem caricato, mas um personagem que existe de verdade. Ele é grosseirão porque nunca teve educação, mas ele tem princípios muito fortes. Como ele nunca teve uma família, foi criado solto, apegou-se a muitos princípios. Ele quer ser um cara bacana, preza a relação de uma família, preza o casamento. Eu queria fazer um cara que não teve muitas oportunidades mas quer dar certo na vida. Ele tem uma vontade enorme de ser respeitado. Mas também tem muito mau-humor. Conheço algumas pessoas que têm esse mau-humor e sempre achei isso muito engraçado. E fui buscar inspiração em alguns amigos com relação a esse mau-humor.

PERGUNTA: É um personagem muito diferente de tudo o que você já fez.
GIANECCHINI: Eu sempre fiz o mocinho e o ator nunca pode trazer muitos elementos para o mocinho, tem de ser uma interpretação simples. Qualquer coisa que você coloque a mais fica over. Com esse personagem é o contrário. Se eu fizesse ele simples, uma interpretação básica, ficaria muito pouco. É um personagem que exige um tom a mais de interpretação. Isso é novo para mim, mas me estimula a brincar com a criatividade, testar um monte de coisas, arriscar. Nunca tive um personagem para o qual eu pudesse trazer muitos elementos, pudesse brincar, fazer piadas. Isso é uma coisa que nunca tinha experimentado: me divertir em cena. Sempre fiz personagem sofredor. E para o ator, buscar aquele sofrimento é também um sofrimento. Já na comédia, para o público se divertir, você tem de se divertir primeiro.

PERGUNTA: Você disse que quando recebeu o convite estava em Los Angeles.
GIANECCHINI: Eu fiquei lá dez meses. Foi um período fundamental para mim, para eu exercitar a minha criatividade, abrir a cabeça para outras coisas, me renovar e ter vontade de fazer outra novela. Aprendi muito, porque estudei o tempo todo lá, tinha aulas de domingo a domingo. Também foi muito bom ser uma pessoa anônima, pegar o meu caderninho e estudar, ser apenas mais uma pessoa naquela cidade e fazer novos amigos que não estavam nem aí para o fato de eu trabalhar na TV. Sabia que precisava disso, mas não sabia que seria tão importante como foi. Fiz um pouco de dança, um pouco de canto, mas meu foco foi sempre interpretação.

PERGUNTA: O mito da beleza nas sociedades contemporâneas é um dos temas centrais da novela. O que você acha do Silvio abordar esse assunto?
GIANECCHINI: Gosto muito desse tema, do peso que a gente dá a essa questão da aparência, do ser belo, a loucura que isso virou, o que as pessoas fazem para se sentir belas, atraentes. As referências se perdem um pouco, essa vaidade, a busca pela beleza, pelo desejo. Esse mundo da beleza, de ser desejável e buscar o objeto do desejo é muito estimulante, de ver até onde as pessoas podem chegar para conquistar ou para serem conquistadas. Acho um tema muito feliz.

PERGUNTA: Há cobrança sobre quem é bonito?
GIANECCHINI: A beleza te limita muito. As pessoas têm muito preconceito pelo fato de uma pessoa ser bonita. É quase como se aquela pessoa tivesse que pagar um preço por ser bonita. As pessoas acham que ela não pode ser ao mesmo tempo bonita e inteligente. Ou ser bonita e talentosa. As pessoas cobram mais. É inegável, eu sinto isso o tempo todo. Até com o Pascoal, eu acho que as pessoas têm uma certa resistência de me ver no papel. Cabe ao ator querer mudar um pouco isso, querer buscar outras formas de se desenvolver.

PERGUNTA: E como você lida com a sua imagem?
GIANECCHINI: Eu me cuido para me sentir bem. É importante você se sentir bonito. Mas eu não faço nenhuma loucura. A minha preocupação com beleza tem mais a ver com saúde. Essa imagem está muito associada ao fascínio da televisão. Eu gosto do meu conjunto, eu gosto de mim. Mas vejo tanta gente mais bonita do que eu. Então, eu acho que é uma fantasia que a televisão exerce sobre as pessoas. Eu nunca fui um cara que saía nas ruas e as pessoas desmaiavam. E de repente eu virei isso. Tem mais a ver com a fama. E se eu fosse um cara que realmente trabalhasse em uma borracharia?




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;