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Seqüestrada passa três dias sem água
Por Gabriel Batista
Do Diário do Grande ABC
22/01/2006 | 09:06
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Com um dos pés acorrentado para não fugir, a empresária Luana (nome fictício), 29 anos, de São Bernardo, conversava sobre a história de vida de sua carcereira: uma menina muito jovem, bonita, morena de cabelos cacheados e longos, vestida com blusinha e calça jeans de grifes conhecidas. Enquanto batiam papo, ouviam um rádio que tocava tipos variados de música – de sertanejo a rock. Luana percebia que a menina estava nervosa e cansada. A carcereira queria que o seqüestro acabasse logo e tinha medo de a polícia aparecer por lá. Na conversa, Luana ouviu da menina que ela teve uma infância difícil, apanhou muito do pai. Não queria participar de seqüestros, mas dizia fazer isso por dinheiro.

O cativeiro onde conversavam era o segundo utilizado no seqüestro de Luana, que durou seis dias, de 22 a 27 de julho de 2005. Ela foi levada pelos seqüestradores da frente de casa, às 21h de uma sexta-feira. Preparava-se para ir a um churrasco com um amigo. Um rapaz “saiu do nada” e, com um revólver calibre 38, exigiu que sentasse no banco de trás do carro dela, uma Parati. Um outro homem armado assumiu o volante.

Rodaram um pouco pela cidade. Até que pararam o carro e colocaram Luana no porta-malas, cheio de carnes compradas para o churrasco. Aceleraram para a favela do Jardim Regina, em São Bernardo. “Até aí, eu não acreditava que isso estava acontecendo comigo”, conta Luana.

Luana foi retirada do carro e teve de colocar na cabeça o sobretudo que vestia. Na garagem de uma casa em que ela ouvia som da novela de uma TV ligada e vozes de crianças, um rapaz perguntou nome e idade de Luana e amarrou suas mãos atrás do corpo com corda de varal.

Da garagem, ela foi levada a pé até o cativeiro, uma casa de alvenaria sem acabamento, com sala, corredor com banheiro e um quartinho onde só cabia uma cama. Um homem pediu o telefone da mãe dela e anunciou: “Isso é um seqüestro. Vamos devolver o carro porque queremos você.”

Ela permaneceu no quartinho escuro. Um homem a vigiava com um revólver 38 na mão. Às vezes, ele parava na porta e rodava o tambor do revólver. “Eu só pedia cigarro. Cheguei a pedir água, mas trouxeram uma água tão suja que não tive coragem de beber.” Ficou sem comida e água nos três primeiros dias. No terceiro dia, o homem que cuidava do cárcere saiu e deixou outro em seu lugar, um rapaz que cheirava a álcool e a-parentava estar drogado. “Ele tentou me estuprar. Também bateu muito em mim”, diz.

Depois de espancada, Luana foi levada a outro cativeiro. Dessa vez, na capital. A transferência ocorreu de motocicleta em parte do trajeto e de carro no restante. Na nova prisão, ela encontrou outros carcereiros, entre eles a menina com quem manteve diálogo.

Comeu pizza e tomou Coca-Cola no quarto dia de seqüestro. Ao fim de seis dias, sem banho, foi libertada em uma viela. Recebeu ordens de sair do carro e andar sem olhar para trás. Antes, ganhou um abraço da carcereira de roupas de grife. O resgate pago pela família, sob orientação policial, foi de R$ 50 mil. Os criminosos queriam R$ 500 mil. Sete acusados foram presos, entre eles uma amiga de Luana.

Sorte – Em uma caso raro de sorte, a agente administrativa da Prefeitura de Mauá, Eliana Henrique da Silva, 41 anos, passou quatro horas em uma cativeiro na favela do Jardim Ipê e foi libertada porque a polícia estourou outro cativeiro no casebre ao lado. Eliana, que é mulher do vereador de Mauá Rogério Santana, foi arrebatada também na frente de casa em fevereiro de 2005. “Não taparam minha boca. Ouvi o barulho da polícia e pedi socorro.”



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