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Seminários abordam análise lúcida de Terry Eagleton
Cássio Gomes Neves
Do Diário do Grande ABC
21/03/2006 | 08:47
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A filosofia afrouxou a gravata, tudo bem. Mas, concomitantemente ao relaxamento dos modos sisudos e das letras carrancudas, deixou de analisar as grandes estruturas culturais e políticas para investigar a metafísica por trás do batom vermelho de Madonna ou a razão pela qual homens são de Marte e mulheres de Vênus, ou coisa que o valha. Efeitos colaterais do pós-modernismo e de seu use-e-abuse característico. Basta! E quem diz isso é o crítico e teórico britânico Terry Eagleton, autor a merecer a atenção de Ricardo Lísias na quarta sessão dos Seminários Avançados sobre a Pós-Modernidade, no próximo sábado (25), em Santo André.

Estranho no ninho, exceção da regra, raposa solta no galinheiro. "Eagleton é o primeiro antípoda que aparece no seminário. O primeiro do qual a gente falará que não trata o pós-modernismo de forma festiva e deslumbrada como o (filósofo Michel) Maffesoli, por exemplo", diz Ricardo Lísias, escritor e professor que semanalmente ministra os seminários da série.

Para Eagleton, o pós-modernismo foi nuvem passageira que durou um bocado mais do que precisava, uma neblina cujos entusiastas julgaram tratar-se de uma nevasca das brabas. "Eagleton acha que o pós-modernismo foi uma fase do modernismo – não exatamente um período de suspensão –, uma hipótese que não funcionou", informa Lísias. Nem por isso, o crítico inglês abre mão de protocolos pós-modernistas, como o coloquialismo e a ironia, para defender que o marxismo, os temas de implicações universais e as grandes narrativas não tinham os dias contados, como entoavam os ritos pós-modernos. "Ele sempre desconfiou do pós-modernismo como um processo de transformação, perene; para ele, não passou de um modismo".

O despertador definitivo para as conclusões de Eagleton foi o 11 de Setembro e seus desdobramentos para a geopolítica e para os desajustes culturais. "Em um de seus livros mais recentes, Depois da Teoria (editado pela Civilização Brasileira), Eagleton chega a fazer uma gozação ao dizer que ninguém explicou ao (terrorista Osama) Bin Laden o que era pós-modernismo", diz Lísias. Ou seja, com o terrorismo na ordem do dia e a mobilização dos Estados Unidos como tropa de choque do capitalismo globalizante estão de volta as dicotomias, os maniqueísmos e a tendência à bipolarização dos dias de Guerra Fria. O marxismo, e conceitos clássicos como a luta de classes, foi reordenado mas não extinto. A regressão cronológica e cultural talvez tenha de ser mais crítica, em se tratando de Eagleton e do atual contexto cultural. Em sua obra mais recente, Holy Terror (Terror Sagrado, inédito no Brasil), o autor compara Bush e Bin Laden a Penteu e Dionísio, adversários nas Bacantes, de Eurípedes, que comungam do mesmo fanatismo e de meios violentos para defenderem suas respectivas causas. Em outras palavras: em pleno século XXI vivemos uma bela de uma tragédia grega.

Os Seminários Avançados sobre a Pós-Modernidade são uma iniciativa conjunta da Secretaria de Cultura, Esporte e Lazer de Santo André, da Escola Livre de Literatura e da Casa da Palavra, com apoio do Diário. Os textos de orientação dos seminários, publicados às terças-feiras no jornal impresso, permanecem disponíveis para consulta no site do Diário.

Seminários Avançados sobre a Pós-Modernidade – Série de seminários; sábado (25), das 15h às 18h. Na Casa da Palavra – praça do Carmo, 171, Santo André. Tel.: 4992-7218. Entrada franca. Até 1º de julho.




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