Responsável pela reprovação de 34% dos alunos que desejam obter a primeira habilitação nas categorias A e B (moto e carro), o exame prático realizado pelo Detran-SP (Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo) é um dos principais desafios dos candidatos a motoristas no Grande ABC. Entretanto, esquema de propina oferecido por autoescolas da região promete solucionar esse problema. Isso porque três de 11 unidades visitadas pela reportagem do Diário trabalham para facilitar a vida dos alunos que não estão dispostos a correr o risco da reprovação.

Com um gravador, repórter deste Diário visitou na última semana autoescolas da região e recebeu as propostas ao se identificar como candidato que precisa finalizar o processo para obter a CNH (Carteira Nacional de Habilitação) antes de setembro, período que iria embarcar para intercâmbio no Exterior. As unidades foram escolhidas aleatoriamente. Embora a prática seja ilegal e coibida pelo Detran-SP, funcionários não hesitam em oferecer o acordo para candidatos que desejam obter a primeira habilitação sem problemas.

Em São Caetano, por exemplo, na Auto Moto Escola Kennedy, localizada no bairro Santa Maria, caso o aluno opte por pagar a propina, o atendente cogita, inclusive, que o mesmo nem precise realizar a prova prática. “Você quer ter certeza que vai ter a carta na mão. É 900 ‘paus’, velho. E esse 900 ‘pau’ (sic) é a vista. Esse dinheiro você vai pagar para a gente e aí a gente vai levar seu nome e lá no dia que você for fazer, ele vai estar sabendo. Então não sei nem se você vai entrar dentro do carro, mas você tem que comparecer”, explicou.

Em Mauá, embora atendentes afirmem que o esquema esteja suspenso temporariamente em virtude da troca dos examinadores que compõem a banca avaliadora, autoescolas continuam a oferecer o serviço, como foi o caso da Stock Car, na Vila Assis Brasil. “Estou há uns dois meses sem (a compra do teste prático). Falam que vai voltar em maio.”

Conforme atendente da unidade, caso o esquema volte, a autoescola avisa os candidatos sobre o esquema dias antes da realização do teste. “Como faço orçamento fechado, porque não sei se vai ter ou não vai ter e qual valor eles vão me jogar, duas semanas antes ou até três semanas eu digo: ‘Olha, vai ter e será tal valor.’ Geralmente é na faixa dos R$ 700.” A mesma justificativa foi dada pela Auto Moto Escola Trânsito Urbano, também em Mauá, que admitiu o esquema.

Segundo diretor de habilitação do Detran-SP, Maxwell Borges de Moura Vieira, o órgão tem empenhado esforços para coibir ações como essas. “Temos intensificado as fiscalizações em autoescolas, que estão mostrando resultado. Além disso, temos duas centrais de comunicação com a população que alcançam índices satisfatórios. Nossa ouvidoria recebe, por mês, média de 1.200 reclamações.”

No ano passado, apuração do Detran-SP descobriu quase 5.000 CNHs emitidas de maneira irregular porque os motoristas compraram o documento. Pelo menos R$ 10 milhões foram movimentados no esquema. Na época, a fraude foi detectada em autoescolas de diversas cidades, incluindo São Caetano. Entre as carteiras irregulares estava a do jogador de futebol do Corinthians Malcom Filipe Silva de Oliveira. Após completar 18 anos, ele declarou em entrevista ter um protocolo que o permitia dirigir, o que não existe.

Projeto propõe instalação de câmeras em veículos

Anunciado em 2015, o projeto piloto que propõe o monitoramento por câmeras e telemetria das provas práticas de direção veicular para categoria B (carro) deve ser iniciado ainda neste semestre em São Bernardo.
“Estamos na fase final de implantação. Nossa expectativa é que em junho os testes práticos sejam realizados”, revela o diretor de habilitação do Detran-SP, Maxwell Borges de Moura Vieira.

Ao todo, serão seis carros com câmeras, sensores e equipamentos para operação do processamento e armazenagem dos dados. O objetivo é combater fraudes no momento do exame prático.