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Falsa deficiente pede esmola em Santo André
Por Leandro Calixto
Do Diário do Grande ABC
27/09/2005 | 07:59
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“Tio me dá um dinheiro. Estou precisando para comprar um chinelo novo.” Se apoiando em uma bengala, com o corpo todo encurvado, usando roupas maltrapilhas e descalça, Helena da Silva, 48 anos, comovia todos os motoristas que passavam durante a tarde nebulosa de segunda-feira pela avenida XV de Novembro, em frente ao Paço Municipal de Santo André. Por volta das 18h50, após ter cumprido pouco mais de cinco horas de “expediente”, a falsa deficiente física deixou a bengala de lado, colocou um par de chinelos e começou a andar normalmente pela rua. Pacientemente, ela parou no primeiro bar que encontrou e começou a contar os trocados do dia.

Antes de deixar o bar, a suposta mendiga tomou um café para, quem sabe, espantar o frio. Em seguida, ela acelerou os passos e em nada lembrava aquela frágil senhora que sensibilizava a todos há alguns minutos atrás. Depois de deixar o bar, ela entrou em um estabelecimento que tinha algumas máquinas caça-níqueis, comprou duas fichas e fez uma fezinha.

Assim que saiu da casa de apostas, ela deu continuidade à peregrinação. Entrou em uma loja de CDs, onde permaneceu por cerca de dez minutos. Olhou atentamente os lançamentos do mês, mas nada levou. Não satisfeita, Helena entrou em um açougue. Foi ver as promoções do dia. Muito falante, conversou com os funcionários do estabelecimento antes de comprar 1 Kg de carne.

Assim que deixou o estabelecimento, ela buscou abrigo em um novo bar. Tomou mais um café, conversou com outros clientes e partiu em direção à estação ferroviária. Sem esconder a alegria com os lucros que teve no dia, foi abordada pela reportagem do Diário. A primeira reação foi de susto. Questionada porque se fingia de deficiente física, ela contou com todas as letras que sobrevivia com a venda de balas nos cruzamentos de Santo André.

“Moço, sou uma mulher de rua. Não tenho casa, nem família. Então, preciso vender balas para sobreviver”, justificou. Três horas antes, o carro da reportagem passou pela senhora, que estava parada na avenida XV de Novembro. Naquele momento, ela lamentava o frio e dizia que precisava de dinheiro para sustentar os filhos e toda a família. “Me dê uma ajuda, por favor”, implorava, com voz embargada.

Toda vez que o semáforo fechava, ela seguia em direção aos veículos. Caminhando lentamente e com corpo encurvado, ninguém poderia imaginar que sem aquela bengala ela poderia andar. A reportagem presenciou aproximadamente 30 motoristas dando algum dinheiro para Helena. Alguns ofereciam moedas e outros, mais generosos, chegavam a deixar R$ 10 de esmola.

Quando a chuva apertava, ela se refugiava atrás de uma pequena moita, que separa o canteiro da avenida XV de Novembro. Tranqüilamente, ela acendia pontas de cigarro que encontrava na rua. “É revoltante saber que existem pessoas assim. Tenho dó, porque ela realmente parece ser uma mulher solitária. Mas se passar por doente para garantir um trocado é vergonhoso. Por isso que o Brasil não toma jeito”, lamentou o camelô Augusto Pedro do Santos, assim que soube da farsa vivida por Helena.

Ao cair da noite e após ter sido abordada pela reportagem, Helena voltou a apertar os passos e dizia que precisava acordar cedo porque hoje seria um novo dia. “Me deixe em paz, moço. Não tenho mais nada para dizer”, implorou a falsa deficiente física, que ostentava no braço esquerdo uma enorme cicatriz.




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