O planejamento tributário que as
empresas fazem utilizando brechas da legislaçao para reduzir o
valor dos impostos e contribuiçoes devidos é o alvo de dois
princípios que o governo federal pretende introduzir na
legislaçao brasileira: uma norma geral anti-elisao fiscal e a
cobrança do Imposto de Renda Mínimo. Essas novidades estao em
dois projetos de lei encaminhados recentemente pela Receita
Federal à Comissao Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Bancos e
deverao tramitar à parte da emenda constitucional da reforma
tributária - limitada a mudanças nos tributos sobre o consumo.
As duas propostas contam com o apoio do presidente Fernando
Henrique Cardoso.
O projeto de lei que modifica o atual Código Tributário
Nacional (Lei 5172 de 1966) prevê a aplicaçao de uma regra geral
anti-elisao, inspirada na legislaçao francesa e alema, pela qual
os Fiscos da Uniao, Estados e municípios podem desconsiderar,
para efeitos de recolhimento de tributos, os falsos prejuízos
"fabricados" por meio de cisoes, fusoes ou aquisiçoes de
empresas. Segundo o secretário da Receita Federal, Everardo
Maciel, a introduçao dessa norma é o que tem de mais ousado
entre as medidas de aperfeiçoamento da legislaçao tributária
propostas ao Congresso.
"Na França e na Alemanha é assim: as autoridades
fiscais verificam o planejamento tributário e mandam desfazer os
cálculos se ficar comprovado que o objetivo era enganar o
Fisco", afirmou Maciel. Caberá à regulamentaçao da lei, se
aprovada, especificar os casos em que o fiscal teria o direito
de desfazer os cálculos da empresa para apurar os tributos
devidos. "É claro que é necessário ter limites", acrescentou o
secretário, lembrando que vários tributaristas foram ouvidos
para a elaboraçao do projeto de lei.
A Receita rejeitou a sugestao de alguns especialistas no
sentido de o projeto de lei prever a possibilidade de uma
consulta prévia ao Fisco por parte das empresas antes de
realizar negócios sujeitos ao enquadramento da nova norma. "É
muito comum o planejamento tributário para simular prejuízos.
Cisoes falsas e utilizaçao de laranjas para simular operaçoes
com prejuízo financeiro, como ocorreu a torto e direito na
compra e venda de precatórios", enfatizou Maciel.
O novo instrumento, com o qual o Fisco pretende reduzir
a elisao fiscal, é o parágrafo único acrescentado ao artigo 116
do Código: "a autoridade administrativa poderá desconsiderar
atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de
dissimular a ocorrência de fato gerador do tributo ou a natureza
dos elementos constitutivos da obrigaçao tributária, observados
os procedimentos estabelecidos em lei".
Para o ex-ministro e consultor Maílson da Nóbrega, é
preciso analisar com cuidado a possibilidade de um fiscal passar
a deter o poder de impugnar o planejamento tributário de uma
empresa. "O planejamento tributário ainda é um instrumento
legítimo em todo o mundo", lembrou o economista.
Outra soluçao apresentada pela Receita para reduzir o
planejamento fiscal que reduz o recolhimento dos tributos é a
implantaçao no Brasil do Imposto de Renda Mínimo. O novo tributo
serviria para antecipar o recolhimento do Imposto de Renda das
Pessoas Jurídicas (IRPJ), que continuaria existindo e do qual
seria abatido o Imposto de Renda Mínima no ajuste anual, se a
empresa apresentar lucro. Se a empresa der prejuízo, o Imposto
de Renda Mínimo nao seria abatido. "Hoje já é assim para cerca
de 90% das pequenas e médias empresas que que recolhem o IR com
base no lucro presumido, uma estimativa das receitas",
argumentou Maciel.
Segundo o secretário da Receita, ao estimar o lucro
presumido, na prática isso é feito em cima da estimativa de
receitas. Por isso, ele propoe que o Imposto de Renda Mínimo
seja cobrado em cima de todas as receitas - inclusive a
remuneraçao financeira - e nao do lucro.
"Queremos que as grandes empresas também paguem
impostos", afirmou Maciel. "Se as empresas apurarem prejuízo,
um imposto mínimo já foi recolhido e nada será devolvido,
reduzindo os mecanismos de elisao fiscal", acrescentou o
secretário.
O conjunto de medidas anti-elisao fiscal - a reduçao de
tributos por meio de utilizaçao de brechas legais - possui um
terceiro instrumento que a Receita Federal pretende obter. É a
diminuiçao, para um ano, do prazo de validade das liminares
concedidas pela Justiça em açoes que questionam a cobrança de
tributos. Hoje, essas decisoes judiciais sao usadas pelos
contribuintes para protelar o recolhimento de tributos durante
vários anos, estimulando a chamada "indústria de liminares".
Pela proposta, as liminares nao julgadas depois de um
ano perderiam seu efeito suspensivo do recolhimento dos tributos
em juízo e da exigência dos tributos.