Setecidades Titulo Saúde Mental
Autismo na ficção é
diferente da vida real

Personagem de novela gera polêmica
e promove discussão sobre a síndrome

Por Camila Galvez
Do Diário do Grande ABC
02/02/2014 | 07:00
Compartilhar notícia
Nario Barbosa/DGABC


Assim como a Linda, representada pela atriz Bruna Linzmeyer na novela Amor à Vida, da Rede Globo, que acabou na sexta-feira, a filha da jornalista Carla Zomignani, 48 anos, Amanda, 19, quer se casar. “Mas acho que ela não sabe o que significa ter um relacionamento. Ela liga mais o casamento às roupas, à festa. Não sei se consigo imaginá-la casada, mas por que não?”

A personagem da novela gerou polêmica entre aqueles que têm filhos autistas ou convivem com pessoas portadoras da síndrome, de origem mental, mas causas desconhecidas. Muitos criticam o rápido desenvolvimento de Linda, que passou do autismo severo não-verbal para o leve e verbal por conta do amor que sente por Rafael (Rainer Cadete). “A Linda só existe no mundo da fantasia”, garante o professor de Neurologia Infantil e membro do Núcleo Especializado em Aprendizagem da Faculdade de Medicina do ABC, Rubens Wajnsztejn.

O especialista acredita, porém, que feitas as devidas ressalvas à ficção, é importante que a novela discuta assuntos desse tipo. “Claro que os pais não podem achar que os filhos terão o mesmo comportamento que a personagem. Cada autista é único, tem uma personalidade única e um quadro único de sintomas.”

A jovem Amanda, diagnosticada aos 8, por exemplo, não aprendeu a ler e escrever. Mesmo assim, Carla fez questão de mantê-la em escola regular de currículo construtivista em Santos, cidade na qual a família vive. “Ela participou inclusive da formatura com os colegas da sua idade, e foi um momento marcante para ela, que sempre gostou de interagir com as pessoas, apesar das dificuldades.”

Diferentemente de Amanda, o andreense André Luiz Pinheiro, 42, foi diagnosticado há apenas um ano. O autismo leve, antes chamado de Síndrome de Asperger, segundo classificação internacional de doenças, nunca o impediu de se desenvolver intelectualmente. Ele é formado em Pedagogia e está cursando a quarta pós-graduação, agora em Educação Especial. “O diagnóstico me proporcionou entender quem eu sou e porque tenho certos comportamentos considerados estranhos pelos demais, como a dificuldade para me relacionar e criar empatia. Meu sonho, agora, é ajudar crianças autistas a desenvolver suas potencialidades”, diz o hoje funcionário público da Prefeitura de Santo André.

Pinheiro mora com os pais e acredita que é possível que autistas se casem, como a personagem Linda. No entanto, essa oportunidade nunca apareceu para ele. “Tudo depende de como a pessoa é. Não adianta julgar.”

Mesmo sem uma companheira, ele leva vida ativa: além de trabalhar e estudar, dá aulas de informática na paróquia que frequenta, atua como palhaço em comunidades carentes e mantém a rádio on-line www.radioxiririca.com.br. Em meio a tudo isso, encontrou tempo para escrever suas memórias no livro O Mistério do Palhaço Azul, cor que faz alusão ao autismo.

A SÍNDROME

Trata-se de uma alteração mental que afeta a capacidade de comunicação e de socialização, dificultando relacionamentos. As pessoas diagnosticadas como autistas também têm alterações de comportamento, ou seja, não respondem apropriadamente aos estímulos ambientais. O autismo acomete um a cada 110 nascidos vivos, em média. As causas são desconhecidas, mas estudos internacionais apontam fatores genéticos e ambientais. O tratamento é baseado em terapia comportamental e ocupacional.

Na região, faltam centros especializados

Por ser considerado alteração mental, o autismo é geralmente tratado pela rede pública de Saúde da região nos Caps (Centros de Atenção Psicossocial). O funcionário público André Luiz Pinheiro, portador da síndrome, critica a falta de profissionais especializados, principalmente no caso de adultos. “O único neurologista que conseguiu me diagnosticar é da Capital, e nem o meu convênio cobre. Gasto R$ 300 por consulta a cada 6 meses.” A psicoterapia comportamental é feita na Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais), mas também é paga: custa R$ 45 a sessão.

Em Santo André, a Rede de Atenção Psicossocial atende pessoas com autismo. O paciente é incluído em escolas, terapias e atividades físicas. Na Educação, há 145 alunos com autismo matriculados na rede de ensino, do total de 1.112 deficientes incluídos.

Em Mauá, autistas podem ser atendidos tanto nos Caps quanto no Centro de Reabilitação. São desenvolvidos projetos terapêuticos adaptados a cada caso, podendo contemplar atendimentos em assistência social, psicoterapia, psiquiatria, terapia ocupacional, fonoaudiologia, fisioterapia e nutrição. Na rede municipal de Educação, são 30 os alunos autistas matriculados.

Em São Caetano, a Prefeitura oferece tratamento no Ambulatório de Saúde Mental Dr. Ruy Penteado e na Unidade de Saúde da Criança e do Adolescente Amabili Moretto Furlan. A rede de ensino conta com 60 estudantes matriculados e o atendimento terapêutico é feito na Fundação Municipal Anne Sullivan.

No Caps Infantil de Diadema, 37,5% do total de pacientes pertence a alguma faixa do espectro autista, o que representa 98 jovens. Na área da Educação, 128 crianças com transtornos do espectro autista estão matriculados na rede municipal de ensino.

Em Ribeirão Pires as crianças com suspeita de autismo são encaminhadas pelas escolas para a Apraesp (Associação de Prevenção, Atendimento Especializado e Inclusão da Pessoa com Deficiência), onde é agendada avaliação com equipe multidisciplinar da entidade, que também oferece terapias. Há hoje 14 alunos autistas incluídos em escolas municipais na cidade. 




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;