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‘Bolsonaro perdeu a chance de liderar o País’, diz Fausto Pinato

Deputado federal do PP de São Paulo afirma que presidente da República optou pelo negacionismo no combate à pandemia

Por Júnior Carvalho
Do Diário do Grande ABC
01/11/2021 | 00:36
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Celso Luiz/ DGABC


Crítico ferrenho à condução do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na pandemia de Covid-19, o deputado federal Fausto Pinato (PP) avalia como tiro no pé a postura negacionista do chefe da Nação durante a crise. “O Bolsonaro perdeu uma grande oportunidade na vida dele. A pandemia não foi culpa do presidente, mas ele perdeu uma grande chance de liderar o País em um momento histórico para o mundo no combate a uma pandemia que estava atacando todo mundo. Ele se acovardou”, analisa, em visita à sede do Diário. O parlamentar faz mea culpa por apoiar o hoje presidente e defende ainda que Bolsonaro responda por espalhar fake news durante a crise sanitária.

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O sr. é um crítico à condução da pandemia feita pelo governo federal. Como avalia o atual momento da crise?
Eu acho que não teve condução. Houve, na verdade, uma repulsão à ciência. Teve país que agiu de um jeito e outros, de outro. Mas sempre tentando buscar a ciência, baseados em uma estratégia para que de certa forma pudessem proteger a economia e as pessoas. Nós, não. Simplesmente viramos puxadinho do (Donald) Trump (ex-presidente dos Estados Unidos). Eu acho que o Trump tem responsabilidade na irresponsabilidade do (presidente Jair) Bolsonaro. O presidente, juntamente com seus filhos, achou que era monarquia, que ia dar um golpe e se perpetuar no poder. Se perderam. O discurso do Bolsonaro até que me agradava muito, apesar de eu ser de centro. Eu sempre achei que não tínhamos que ir nem para lá, nem para cá. Para nós que somos do debate, nenhum dos dois lados sempre tem toda razão. Virou a política de ódio.

As divergências dos discursos durante a pandemia atrapalharam no combate à Covid. O próprio Bolsonaro e seus filhos foram indiciados pela CPI. O sr. concorda com o relatório?
Eu não participei, acompanhei tudo pela mídia a questão do mérito da CPI. Mas um crime que está cometido é o da desinformação, das fake news. Isso levou muitas pessoas a acreditarem. O País está dividido. Metade gosta da esquerda e a outra, da extrema direita. Mas existe um meio aí que não é politizado e que tende a acreditar no seu governo. É difícil acreditarem que o presidente da República vai querer o mal para o seu povo. Então a gente percebe que realmente houve a desinformação. Deputados da extrema direita pediram para o povo ir às ruas. No mínimo, isso é indução ao suicídio porque o mundo inteiro estava falando sobre os riscos da doença. Eu chegava a apelar e falava: ‘Gente, vejam bem, copiem os Estados Unidos ou Israel que vocês tanto se espelham. Só façam igual, mas não deixem o povo morrer. Se não gostam da China, da Rússia ou da Europa, tudo bem, mas copiem aqueles que vocês se espelham’. Não é possível que o mundo inteiro esteja errado. Com todo respeito que eu tenho ao presidente Bolsonaro, mas é importante a pessoa ter a sensibilidade de buscar informações de organizações sérias, de métodos sérios, que possam proteger a população.

Por que o sr. acha que o presidente apoiou o negacionismo?
O Bolsonaro perdeu uma grande oportunidade na vida dele. A pandemia não foi culpa do presidente, mas ele perdeu uma grande chance de liderar o País em um momento histórico para o mundo no combate de uma pandemia que estava atacando todo mundo. Ele se acovardou. Ele terceirizou ações para os governadores, para os prefeitos. O Brasil ficou meio choco nisso. A partir do momento em que o ministro das Relações Exteriores (Ernesto Araújo) não buscava informações, estava proibido defender ou buscar vacina em um primeiro momento. O presidente falava até que as pessoas iriam virar jacaré. Eu entendo que nós atrasamos e perdermos oportunidades. Nem estou falando se teve desvios de verba, cada um responde pelos seus atos. No caso dos governadores, montaram os hospitais de campanha por ouvirem dizer que podia acontecer. Não teve uma coalizão de estratégia. O que faltou nesse momento foi espírito de estadista tão defendido por um ex-militar que, na minha opinião, se mostrou ser um grande trapalhão. Ele causou todo um caos social na saúde e, acima de tudo, econômico.

Então o sr. defende que o presidente e seus filhos sejam punidos?
Por causa das desinformações prestadas, não tenho dúvida. Me lembro de quando o Brasil atingiu 300 mil mortos e ele disse que não era coveiro. Isso mostra uma falta de sensibilidade. Ouvi de alguns psiquiatras amigos meus a tese de que Bolsonaro não está no juízo perfeito. Tem alguma coisa errada, porque não é normal. Ele deixa de ouvir até os amigos e aliados que queriam ajudar. Eu sou um cara que votei no Bolsonaro, trabalhei para ele e me sinto enganado. Todo o discurso mais conservador, na questão de família, ficou para trás. Eu não sou um cara nem de direita, nem de esquerda, sou pragmático. Acho que ideologias levam a gente ao totalitarismo, à burrice. De um lado, a esquerda patrocina Cuba, Venezuela. Por outro lado, entra o Bolsonaro combatendo isso e de certa forma copiando uma pessoa totalmente desequilibrada que é o Trump, que não deu certo nos Estados Unidos e mesmo assim ele vem insistindo em agir dessa maneira. Isso só prejudicou o País e eu acho que precisamos montar uma coalizão equilibrada.

O presidente também flertou com o autoritarismo. O sr. vê o presidente como golpista?
O presidente só não deu um golpe porque as Forças Armadas estão amadurecidas e, apesar de ter apoiado um governo de direita, ele se aproveitava muito. O Bolsonaro é um cara que leu algumas folhas de Maquiavel. Não chegou a ler o livro inteiro, graças a Deus. Em determinado momento ele colocava os filhos e a ala ideológica para atacar os militares. Outra hora colocava os militares para ameaçar o Congresso Nacional e o Supremo. Ele só não deu o golpe porque não tinha força militar. Os militares não aceitaram, tanto é que tivemos demissão do ministro da defesa e dos três comandantes militares.

Então por que a Câmara ainda não instaurou o processo de impeachment? O presidente da casa é do seu partido…
Cada um responde pelo seu mandato. Aí você tem que perguntar para o Arthur Lira. Eu respondo pelo meu mandato. Eu não tenho partido que me breca. Eu sou um cara independente. Aliás, para mim, partido hoje só serve para encher o saco porque, na verdade, você vai para o partido porque precisa se eleger e ter acesso ao fundo partidário. Mas hoje eu vi uma declaração do presidente da Câmara que já me comoveu de maneira positiva. Ele defendeu que o presidente deve responder por declarações sem base científica. A gente vê que até a lealdade do Arthur de tentar consertar os buracos e as burrices deve estar chegando no limite.

Mas o sr. defende o impeachmet? Acha que dá tempo?
O impeachment é ruim para o País. Eu acho que o Congresso tem que dar um freio no Bolsonaro e deixar ele aí. Acho que ele nem vai para o segundo turno se ele continuar com essas conversas dele. Não é possível que a irracionalidade vá prevalecer sobre a racionalidade humana. O povo brasileiro é inteligente, sabe enxergar o que é certo e o errado e o que é exagero. Hoje o Brasil está cercado entre o diabo e um falso profeta.

O sr. defende uma coalizão equilibrada, uma terceira via. Mas ninguém decolou ainda…
Isso é o que menos importa. Prefiro perder uma eleição e defender o que eu acredito do que ficar de puxadinho. Eu gosto de ser muito justo. Não tenho nada contra o (ex-)presidente Lula, mas acho que a prisão dele foi legal. Entendo que ele foi um bom presidente, como o Bolsonaro, que entrou muito bem intencionado, mas foi influenciado pelo filhos e por essa ala ideológica.

Mas as pesquisas indicam que o eleitor prefere Lula ou Bolsonaro…
Não vai ter mais facada ou fake news como teve em 2018. Nós vamos para as propostas, com certeza, se aparecer uma pessoa de uma terceira via com um plano de governo com menos ideologia e mais pragmatismo, vai decolar. Tem que ouvir os dois lados. Tem que reconhecer os avanços sociais dos governos de esquerda. Nós precisamos formar uma coalizão e, quem sabe, montar uma chapa de centro esquerda e centro direita.

E quem seria esse nome?
Nós temos as prévias do PSDB aí. Estou torcendo para o Eduardo Leite (governador do Rio Grande do Sul). Temos o próprio presidente (do Senado, Rodrigo) Pacheco (PSD), temos o ex-presidente Michel Temer (MDB). Estou falando de fazer palanque. Não é só cabeça de chapa, é grupo. O ACM (Neto, DEM) vai sair candidato na Bahia, o Geraldo (Alckmin) vai para qual partido? É política de palanque. O Bolsonaro apostou tudo na internet, nas fake news e está derretendo.

Mas vai chegar o momento em que o eleitor vai enxergar essa terceira via?
Eu tenho certeza que o eleitor deve enxergar uma terceira via como uma alternativa de poder. Podemos até perder a eleição para um ou para outro, mas tem que se criar uma ala moderada.

Em São Paulo, o PP deve apoiar a candidatura do hoje vice-governador Rodrigo Garcia (PSDB)?
Eu não sei com quem o partido vai caminhar, eu não vou com o Rodrigo Garcia, eu não caminho com o (governador João) Doria. Meu apoio está declarado ao Márcio França (PSB) e ao Geraldo Alckmin, caso haja esse casamento, que é a chapa do equilíbrio.

E se o Bolsonaro se filiar ao PP?
Eu não sou um crítico a isso. Para mim era até bom, porque ele montaria a chapa. Desde que eu mantenha minha independência.

O sr. fala em independência, mas hoje o PP é da base governista…
O partido é do governo, mas acho que fez a aposta errada. Apostou que Bolsonaro seria moderado, que poderia ouvir o Ciro Nogueira (ministro-chefe da Casa Civil), que é muito habilidoso, ou o Arthur Lira, que é digno de lealdade. O que eu ouço é: o homem não tem jeito. As escolhas erradas e a falta de humildade de alguns líderes levam a esse caos.  




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