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‘Não descarto elo com PT, mas é preciso ter foco’
Por Raphael Rocha
Do Diário do Grande ABC
06/09/2021 | 00:01
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Claudinei Plaza/ DGABC


Ex-governador do Estado, Márcio França (PSB) volta ao tabuleiro eleitoral paulista na possível composição com o também ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB). O socialista, entretanto, admite que pode abrir conversa com o PT, que, em território estadual, desenha candidatura própria com o ex-prefeito paulistano e ex-ministro da Educação Fernando Haddad. França pondera, porém, que o petismo precisa ter foco eleitoral, até porque, em sua visão, a candidatura presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva é competitiva, mas enfrentará uma eleição dura. “Quem vai para a Olimpíada sem mirar direito volta sem medalha alguma.”

A chapa Márcio França e Geraldo Alckmin está montada, vai sair?
Acho que vai sair. Só não sabemos qual posição cada um vai ocupar. Tenho relação com o Alckmin de muita lealdade. Ele é um homem que foi mais longevo dos governadores de São Paulo, com 14 anos no total. Sujeito experiente e idôneo. Não merecia o que estão fazendo com ele no governo, no partido. Esse moço disputou duas vezes a Presidência da República, foi para o segundo turno na eleição. Não tem patrimônio. Já sabe que comigo ele pode contar. A decisão de qual partido... Ao fazer a fala de que estava de saída, na política quer dizer que saiu. Sair ele saiu já. O Doria até o expulsou, na entrevista ao Roda Viva. Eu diria que estará conosco em uma mesma trincheira. Ele, em especial, no Interior de São Paulo, é um sujeito impressionante. Em Ribeirão Preto, São José dos Campos. Por conta do jeito dele. Acho que a tendência é essa. Eles terão dificuldade grande de nos enfrentar. Temos um complemento meio natural por causa das eleições. Eu acabei disputando eleição de prefeito de São Paulo (em 2020). Essa borda de Capital, Grande ABC, Região Metropolitana e Litoral, é onde normalmente eu venci e tenho vencido em pesquisa. Ele muito forte no Interior. O formato disso vamos deixar para que o tempo diga. Claro que a prerrogativa é dele, pela experiência e por tudo que representa. Trouxemos o (Paulo) Skaf para essa engenharia. Ele disputou o governo, esteve na Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), gostaria de participar. Tem o (Gilberto) Kassab (presidente do PSD), que nos traz o segundo partido de grande porte. Com os nossos partidos juntos, vamos para o equilíbrio de ter perto de 100 deputados, que equivalem a 20% do tempo de TV. É importante para uma eleição. Quem não conhece o Geraldo Alckmin é raro. Ele não precisaria de tanto tempo. Contra nós tem o Doria. Neste campo, brinco que a campanha é do Doria e do Dorinha, o vice-governador atual (Rodrigo Garcia, PSDB). Quem tomou conta do governo e evidentemente é o candidato dele. Ainda haverá alguém possivelmente do Bolsonaro. E também há um mundo paralelo que é o (Fernando) Haddad (PT) e o (Guilherme) Boulos (Psol).

Qual peso da saída de Alckmin do PSDB?
São Paulo é tão grande e tão importante que a engenharia montada aqui altera a engenharia nacional. Isso que estamos tentando fazer. São Paulo, a rigor, tem menos problema grave em relação ao Brasil. Não temos o direito de dizer que São Paulo vai se separar. Temos de ajudar o Brasil, que neste momento é decisivo. Vamos fazer disputa nacional que vai polarizada até o fim. Pelo menos se pegar as últimas quatro eleições mundiais, e nos Estados Unidos foi assim, vieram com viés de muito aperto, de 50,1% e 49,9%. Estou em busca de eleitores que votaram no Doria e se arrependeram para me dar a oportunidade de ser governador. Se você se arrependeu de votar no Doria, procure mais uma pessoa e vote em mim. Estou com medo de ter mais de 100% dos votos (risos). Sinceramente não conheço ninguém que tenha votado no Doria e esteja supersatisfeito. O Brasil tem metade que gosta do (Jair) Bolsonaro e a outra metade, odeia. Metade que gosta do Lula (Luiz Inácio Lula da Silva, PT) e a outra metade, odeia. O único homem que pode unir o Brasil é o Doria. É unanimidade. Todo mundo detesta. Nem o Dorinha gosta dele. No caso do Rodrigo, ele precisa que o Doria saia (do Palácio dos Bandeirantes). O desespero dele é que o Doria nem legenda tem. Deve ser angustiante mesmo. Se não tomar cuidado, perdem a legenda no PSDB. Arruma tanta encrenca que ele não tem legenda e terá de buscar outro partido de novo. Doria não tem amigo de um ano, de dois anos. A gente sempre tem amigo de mais de uma década. Eu não conheço nenhum amigo do Doria de mais de dois anos. Ele briga o tempo todo. O jeito de falar, acho sempre um emoji, algo sintético. Não é real. É um avatar.

Muita gente diz que o Alckmin tem demorado demais para fazer esse movimento de saída. O sr. concorda?
O prazo que ele tem é até abril para fazer isso.

Mas tinha de ser antecipada essa saída?
Depende da posição. De fato, quanto antes é melhor, ajuda a definir outras coisas. Há muita gente que irá acompanhá-lo no movimento. Fará um traço no Estado entre ser leal e ser desleal. Quem ficar ficou com a pecha. Quem quer ficar com o Doria? O Doria é um contêiner. Assim como eu falava na campanha que o Bolsonaro tinha que arrastar o Doria, agora é o Rodrigo. É duro. Você vai a um lugar e não pode andar na rua. Tem muita rejeição.

O sr. acha que pode ter debandada do PSDB com a saída de Alckmin?
Há situação que quando se fala em governo, prefeitos e tal, o sujeito quer evitar atritos com quem está no governo. É normal. Do ponto de vista de coração, ética, comportamento, caráter, é quase indefensável. O que está sendo feito com o Geraldo não tem defesa. Expor um cara com a importância dele, passou a vida inteira dele lá, não teria por que expor um cara assim. Não há defesa, nem o filho do Doria defende algo assim. Para efeito de todo mundo que é PSDB, está uma saia justa, um constrangimento. Vale tudo pelo poder? Foi erro que muitos cometeram. O poder é importante mas não vale tudo. Eu me recordo que chegou determinado momento da eleição (de 2018) pediam para eu falar do Bolsonaro. Um monte de gente. Eu preferi perder a eleição a falar isso.

O sr. tem feito duras críticas ao Doria. Mas a vacina não é um ativo importante dele?
A vacina é mérito dele. Mas a rigor o Butantan existe há 100 anos. Com Doria ou sem. Neste momento, o Butantan deveria estar produzindo a vacina nossa, não importando e envazando aqui. Temos tanto padrão quanto tecnologia para São Paulo. Temos 14% dos impostos arrecadados indo para pesquisa, na veia. Espero liderar os índices, claro. Mas liderar positivamente. Não com os números ruins. É inadmissível ter números que temos (de mortes e casos de Covid). Aguardávamos que o governador do privado trouxesse ideias privadas aqui, com eficiência. Ele aumentou todos os impostos, menos o de combustível de avião, que ele reduziu pela metade. Não preparou alternativa diferenciada. Ele não comanda a Polícia Militar. Lá ele é unanimidade. Não comanda a Polícia Civil.

Como faz para enfrentar as máquinas do Estado e do PSDB, que têm mostrado forças sucessivas nas eleições paulistas?
Não foi pela máquina que eles ficam tanto tempo. O PSDB tinha nomes que representam a estabilidade. O sujeito sempre diz que mora em São Paulo, com certo orgulho. Tem coisa que quer mexer, claro, mas não quer trocar a estabilidade. O Estado de São Paulo é muito arrumado. Viaje pelo Interior, veja que impressionante. Eu às vezes ficava boquiaberto por ver como as cidades são potentes, organizadas. A vida do cara de lá é boa. Ele tem emprego, com família, as crianças estão nas escolas públicas. Vai trocar isso pelo quê? Hoje ele vê São Paulo atraído para a instabilidade nacional. Qual a estabilidade que temos no Estado? Não sabemos nem o que vai acontecer depois de amanhã. Em uma semana inventaram quatro programas. Em outro lugar, até vai. Aqui é São Paulo, amigo. Eles fizeram governo bom e eficiente ou não. A verdade é que não fizeram. Nem na pandemia porque não tivemos número melhor do ponto de vista do Estado nem economicamente. Não tinha aumento de imposto deste tamanho havia décadas. O sonho da menina agora é que galinha bote bife porque ela não aguenta mais comer ovo.

Divisão que se projeta na direita favorece uma candidatura da esquerda?
Para efeito aparente sim. É pouco provável achar que o Lula não será competitivo. Se ele é competitivo, provavelmente puxa junto um pouco das coisas ligadas a ele. O que acho é que o Lula não é mais o Lula de antes. Ele foi sujeito mais importante do ponto de vista eleitoral do País, a figura pública que conheci mais famosa no mundo e que percebeu que pode perder. Passou pela cabeça dele algum dia que ele poderia perder? Quando ele estava naquele auge? O Lula hoje, ele pode surpreender nos movimentos para frente.

Em qual sentido?
Percebendo essa circunstâncias, não vi correr risco. Vai evitá-los. Quem acha que a eleição está definida, está equivocado. A eleição está muito apertada, nacionalmente falando.

Está descartada a composição com o PT em São Paulo?
Não. Não descarto. Acho que o PT tem um nome nacional, que disputou a Presidência da República, um rapaz muito preparado, ministro, prefeito de São Paulo. Se você vai para uma Olimpíada, é preciso mirar. Gato que corre atrás de três ratos, não pega nenhum deles. Se vai para Olimpíada com múltiplos focos, volta para casa sem medalha alguma. Se fossem eleições fáceis, nunca tinha se perdido e já se perdeu. Eles sabem disso também. Eu nunca fui de outro partido, então até discuto muito isso com meus amigos mais velhos tucanos. Não tenho o mesmo problema que eles têm com petistas. Eu nunca tive esse embate com o PT.

Qual avaliação o sr. faz do Rodrigo Garcia, com quem dividiu o secretariado de Alckmin no passado?
Ele tem seus méritos. É rapaz que tem mais qualidades. Mas não tem histórico para este instante. Você olha se a pessoa tem experiência. Ele até tem certa experiência pelas passagens que teve, só que acho que ele deu azar. Ele torce até o fim para o Doria não ter legenda e não ser candidato a presidente. Se isso acontecer, ele pode até sonhar em se salvar. Mas o problema é que se isso acontecer o Doria pode querer ser candidato a governador. Ele para desfazer o que falou são dois palitos.

RAIO-X

Nome: Márcio Luiz França Gomes
Estado civil: Casado
Idade: 58 anos
Local de nascimento: Santos (Litoral de São Paulo) e mora em São Paulo
Formação: Direito, pela Universidade Católica de Santos
Hobby: Gosto de surfar, de cultivar aquário e fazer política
Local predileto: Onde estão meus netos
Livro que recomenda: A Revolução dos Bichos, de George Orwell
Artista que marcou sua vida: Ariano Suassuna
Profissão: Advogado e político
 




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