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COLUNA
Desigualdade aqui e ali
Rodolfo de Souza
01/08/2019 | 07:00
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Chateia-me ver o ser humano pedindo esmolas. É uma pessoa como outra qualquer, desfavorecida pelas circunstâncias, provavelmente odiando cada minuto de sua vida. Prostrado ali no passeio público, sem perspectiva, sem nada, só gesticula com as mãos e balbucia qualquer coisa. Nem procura articular direito as palavras, por não julgar necessário.

Não deveria ser assim, tendo em vista a quantidade de alimento produzido neste imenso rincão, o espaço disponível, a grana que rola solta em vários segmentos desta sociedade que assiste impassível à tragédia que ora nos esfrega na cara a nossa impotência. Mas assim é o Brasil. Pátria rica o suficiente para oferecer trabalho a todos, nobre atividade que traz moradia, comida, consumo... Consumo! Isso mesmo! A única maneira de fazer girar a economia é, sem dúvida, o emprego que tem o poder de gerar compra. Eu, que nem economista sou, sei disso. Mas não é assim que funciona. Não aqui.

Entretanto, no exterior, em países de economia forte, também é possível encontrar gente em situação de pobreza extrema. Noutro dia, por exemplo, presenciei pessoa nessas condições em país rico. Soa até estranho. Parece mesmo improvável que cena assim possa ser vista lá no hemisfério norte. 

Pedinte de olhos azuis é o que vi bem diante dos meus olhos castanhos. Olhos dos trópicos, habituados à desigualdade social tão comum que se tornou invisível para a pessoa que ainda trabalha, mas que já percebe, apreensivo, a derrocada de uma grande nação.

Mas a mulher estava lá numa calçada britânica, caneca na mão, implorando uma moeda ao transeunte apressado. Não havia motivo para surpreender-me, a não ser o fato de chorar, chorar copiosamente. De fato chamou-me a atenção justamente por demonstrar sofrimento pungente, aquela pessoa que parecia inconformada, mergulhada num sentimento de profunda humilhação. Lembrei-me, inclusive, do pedinte brasileiro. Parece-me que este se encontra anestesiado, imune à dor que sentia aquela pedinte de primeiro mundo.

É provável que o claro sintoma de desespero dela tenha tocado o meu coração. Obviamente que o motivo real que conduziu aquela pessoa a tamanho desalento me era desconhecido. Por isso, como mero expectador, logo associei a tristeza da moça à sua condição social, embora admitisse outras possibilidades. Fiz conjecturas a respeito, mas acabei por aceitar a única que me saltou aos olhos.

Aqui, em pátria Tupinambá, as pessoas que fazem da rua o seu lar, nem choram mais. Estão embrutecidas pela antiga e costumeira situação de penúria, e nem se julgam merecedoras de uma vida com um fiapo de dignidade. É possível até que já nem sonhem com um teto, um prato de comida, roupas e todas as coisas das quais toda a gente necessita para viver.

Logicamente que o caro leitor indagará acerca dos meus sentimentos com respeito a essas pessoas compatriotas minhas. Compadeço-me delas igualmente. A diferença é que a mulher sentada na calçada londrina mantinha ainda a capacidade de chorar, e lágrimas comovem até turistas habituados à miséria de seus países. Não resta a menor dúvida. 




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