Política Titulo Discussão
Lei da Anistia é ampla
e fere direitos humanos

O ponto principal da polêmica é a absolvição de torturadores
e militares que estiveram na linha de frente do regime militar

Cynthia Tavares
Do Diário do Grande ABC
11/03/2013 | 07:00
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A Lei da Anistia foi sancionada em 28 de agosto de 1979, mas até hoje causa discussões na sociedade brasileira. O ponto principal da polêmica está na absolvição de torturadores e militares que estiveram na linha de frente do regime militar. Na sexta-feira, completam 28 anos do fim da ditadura.

A legislação isenta todas as práticas realizadas entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979 para aqueles que "cometeram crimes políticos ou conexo com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da administração direta e indireta, de fundações vinculadas ao poder público, aos servidores dos poderes Legislativo e Judiciário, aos militares e aos dirigentes e representantes sindicais"

Especialistas ouvidos pelo Diário avaliaram que a legislação fere os conceitos mundiais de diretos humanos. Professor de Direito Internacional e Direito Humano na rede LFG, Emerson Malheiro analisa que os crimes cometidos durante a ditadura não podem ser abafados com a anistia dos seus praticantes. "A lei não pode perdoar torturadores. Os crimes cometidos são imprescritíveis, pois ferem os direitos humanos. Justamente por isso não pode absolver e liberar quem praticou a tortura", destacou o docente.

O STF (Supremo Tribunal Federal) entendeu que a anistia é válida porque as práticas militares e a legislação foram realizadas antes da Constituição Federal vigente - datada de 1988. "Os crimes foram anteriores, mas os efeitos persistem até hoje", defendeu Malheiro.

O Brasil assinou o Pacto de São José da Costa (elaborado em 1992) e decidiu se submeter às sanções por violações dos direitos humanos em dezembro de 1998. Porém, juridicamente, o País não vai responder pelos crimes cometidos na época. "No Direito Internacional existe um sistema de sanção que ainda é fraco. Em algumas situações funciona e em outras, não", afirmou.

A professora e fundadora do Núcleo de Educação em Direitos Humanos da Universidade Metodista de São Paulo, Roseli Fischmann, classificou como "brutalidade" as absolvições previstas na lei. "O movimento era pela anistia ampla e irrestrita, mas para que eles também tivessem o direito e ficassem com a impressão de que nada ocorreu no regime", avaliou.

A Lei da Anistia foi formulada após pressão popular, que começava a se colocar contra o regime por diversos fatores. A morte do jornalista Vladimir Herzog e a crise internacional do petróleo - com reflexos em problemas econômicos no Brasil - foram enumerados por Roseli como fatos que enfraqueceram o regime. "Nesse momento começou a voltar a atuação do sindicalismo no Grande ABC, que também teve um papel importante nessa conjuntura", salientou a professora.

 

Araguaia

A Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Brasil a investigar em âmbito penal a guerrilha do Araguaia. Cerca de 70 pessoas sumiram durante os embates entre os militantes - a maioria ligada ao Partido Comunista do Brasil - e o Exército.

 

Torturados no regime reclamam da norma

Quem passou pelos porões do regime militar não se conforma com a Lei da Anistia. Os torturados consideram que a medida é injusta e ainda hoje nutrem desejo de justiça para aqueles que lhes fizeram mal.

Diretor de escola em Mauá e ex-preso político, Olivier Negri Filho afirma que a anistia dada aos militares foi uma atitude incoerente do Judiciário. "O bandido é o torturador. Os militares foram a ponta da lança (da situação). A anistia deveria ser para os perseguidos. Precisa ter mais responsabilidade", avaliou.

Olivier ficou preso 89 dias no Dops (Departamento de Ordem Política e Social) e passou por diversas sessões de tortura. O professor destaca que, ao absolver militares, o Brasil esquece os ‘Anos de Chumbo'. "Refere-se à memória do povo que preza pela liberdade. Estão jogando a verdade para baixo do tapete", considerou. O professor conseguiu receber a anistia em pecúnia.

O aposentado de Ribeirão Pires Odair Malerba ainda busca seus direitos na Justiça. Ele ainda não conseguiu obter sua indenização pelos 15 dias que passou na carceragem e pelas torturas. "Muita gente pegou avião, foi para Cuba ficar no exílio, voltou e já recebeu (a anistia)", alegou.

O aposentado entrou com processo em 2008, alegando que não conseguiu emprego fixo por conta de ter sido fichado pelo regime. O processo está em tramitação em Brasília.

 




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