Política Titulo Grande ABC
Só 6% dos vereadores são negros

Apenas nove dos 142 vereadores eleitos no
último pleito na região se declaram negros

Por Júnior Carvalho
do Diário do Grande ABC
10/09/2017 | 07:00
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Celso Luiz 13/3/17


A população negra do Grande ABC ainda ocupa espaço reduzido na política. Levantamento feito pelo Diário, com base em dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), revela que apenas 6,3% do total de vereadores eleitos na região no pleito do ano passado são declaradamente negros (veja mais na tabela ao lado). 

Do total de 142 parlamentares das sete cidades da atual legislatura, apenas nove se autoclassificaram pretos – um em cada 15 –, sendo a maioria em Mauá: Fumassa (PSDB, Santo André); Ana Nice e Joilson Santos (ambos do PT, São Bernardo); Suely Nogueira (PMDB, São Caetano); Gil Miranda (PRB), Ricardinho da Enfermagem (PTB), Samuel Enfermeiro (PSB) e Sinvaldo Carteiro (PSDC), de Mauá; e José Nelson da Paixão (PPS, Ribeirão Pires). 

No estrato social feminino esse cenário é ainda mais ínfimo, visto que, desses nove, apenas duas mulheres negras exercem a vereança na região. Na chefia dos Executivos, outro histórico negativo: Donisete Braga (PT, 2013-2016), de Mauá, está isolado na história política das sete cidades como primeiro e, até hoje, único prefeito negro eleito no Grande ABC. 

Professora de Direito da Faculdade Zumbi dos Palmares, Marilene de Mello lamenta esse cenário e avalia que a restrição de negros no parlamento é reflexo do próprio racismo e da falta de conscientização da sociedade sobre a diversidade racial, “principalmente no Estado de São Paulo”, sentencia. “Vão alegar que não nos posicionamos, contudo, aqueles (negros) que ousam se candidatar apesar dos obstáculos não conseguem passar da primeira fase. Os que passam, não conseguem apoio no decorrer da carreira e os que ousam tentar fazer algo acabam simplesmente desaparecendo ou até mesmo sendo acusados de corrupção, por exemplo”, analisa Marilene, que é negra e fez parte da primeira turma de Direito na universidade, que é formada por maioria massacrante de alunos afrodescendentes.

De acordo com o TSE, das aproximadamente 500 mil pessoas que se candidataram pelo Brasil nas eleições municipais passadas, apenas cerca de 8% (42,5 mil) eram declaradamente negros. Taxa semelhante foi registrada na região, quando 8,5% (268) do total de candidatos (3.145) eram pretos. “A não obrigatoriedade do ensino da história da África nas escolas foi um duro golpe no avanço da luta do povo negro”, relembra a professora, ao reconhecer que o discurso de figuras políticas negras, como o vereador Fernando Holiday (DEM), da Capital, que é declaradamente contrário às tradicionais bandeiras do movimento negro, como a defesa das cotas raciais nas universidades, por exemplo, atrapalha. “Demonstram ignorância e desrespeito à nossa história, aos nossos antepassados e aos nossos guerreiros que lutaram e lutam bravamente para que chegássemos onde estamos.”

Apesar de tímido, o índice de atuais parlamentares negros supera o da população preta no Grande ABC em 2010 – dado mais recente. Segundo o Censo daquele ano, essa parcela de moradores representava 5,3% do total de habitantes.

No Congresso Nacional e nas assembleias legislativas por todo o País, eles são apenas 3%. A eleição de 2014 foi a primeira em que a Justiça Eleitoral exigiu que candidatos declarem sua cor ou raça. 


Orgulho e isolamento, classificam as duas únicas vereadoras negras

Ouvidas pelo Diário, as duas únicas vereadoras negras eleitas no Grande ABC em 2016, Ana Nice (PT, São Bernardo) e Suely Nogueira (PMDB, São Caetano) classificaram esse reduzido cenário da bancada negra feminina em duas palavras: orgulho e isolamento.

“Sinto-me orgulhosa e triste ao mesmo tempo por não ter mais gente comigo, tanto da raça quanto do gênero”, avalia Suely, que, além de única parlamentar negra em São Caetano, é a única mulher entre os 19 vereadores da cidade.

A peemedebista rasga o discurso e renega qualquer inferioridade atribuída à cor. “Sou mulher negra, gorda e pobre, mas sou guerreira. Sempre tive que provar para mim mesmo que esse negócio de negro ser menos que qualquer outra pessoa tinha de acabar”, conta, ao reconhecer, porém, que não carrega a bandeira do movimento negro porque, segundo ela, “nunca teve apoio” desses coletivos no município.

“Não é tranquilo, eu me sinto isolada. Nesse cenário as mulheres estão estão numa situação mais marginalizada na sociedade. Somos discriminadas duas vezes: por sermos mulheres e por sermos negras”, disse Ana Nice, que ascendeu politicamente do movimento sindical. “Sou um ponto fora da curva.”

Ana Nice e Suely, porém, divergem sobre alternativas para aumentar a representatividade dos negros na política, como a existência de cotas na formação de chapas, como já há para mulheres. “É uma saída, mas não garante vitórias. São necessários outros mecanismos, como reforma política”, pontua a petista. “Não defendo cotas. Quem é político já nasce. Defendo um maior interesse do povo negro”, avalia Suely. 




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