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Tinhorao explica a mania festeira do brasileiro
Melina Dias
Da Redaçao
16/04/2000 | 17:39
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As origens das nossas comemoraçoes populares, de tantos feriados, e até da tendência de transformar qualquer amontoado de gente em festa, podem ser entendidas por meio da leitura do novo livro do crítico José Ramos Tinhorao As Festas no Brasil Colonial (Editora 34, 178 páginas, R$ 19). Aos 72 anos, o autor tem mais de uma dezena de livros publicados e pode ser considerado o maior especialista vivo em música popular brasileira.

Como a pesquisa é baseada em documentos históricos, a primeira peça analisada nao poderia deixar de ser a carta de Pero Vaz de Caminha, "escrita de porto seguro de Vera Cruz com data de 1º de maio de 1500 a El-Rei d. Manuel", dando conta do "achamento" da nova terra que viria a ser o Brasil. Segundo o autor, o encontro inicial de europeus com os índios "revestiu-se de um claro clima de festa". Quando os primeiros índios vieram a bordo das caravelas houve troca de objetos e confraternizaçao para espanto de Caminha ao ver brancos e índios "mesturados".

Importante ressaltar que a trilha sonora da primeira festa pública em nosso país foi o som rural português. "Havia, aliás, uma explicaçao para esse fenômeno da presença dos homens do campo entre as tripulaçoes nas naus portuguesas (...): e a explicaçao estava no êxodo rural que enchia a Lisboa de despontar dos 1.500 desocupados, prontos a aceitar qualquer oferta de emprego."

Mas logo os jesuítas trataram de conter a espontaneidade dessa perigosa combustao entre desterrados e índios, impondo as datas religiosas e oficiais da Coroa como os únicos motivos aceitáveis para reunioes coletivas. A missao dos religiosos, comandados pelo padre José de Anchieta, era muito clara: absorver a cultura dos locais para depois aniquilá-la. Para isso, segundo apurou Tinhorao, os padres aprenderam a língua dos nativos e se apropriaram de suas músicas para ensinar-lhes versos destinados a desviá-los de suas tradiçoes.

Tinhorao trata de pontuar essas e outras informaçoes com transcriçoes dos documentos originais, que, por vezes, chegam a ser muito divertidas. Um bom exemplo ilustra essa feliz iniciativa do autor, que torna o volume de leitura agradável e acessível. O capítulo seis, Contribuiçao Holandesa de Nassau: o Boi Voador, contempla o período de 1630 a 1654 e destaca o impagável episódio protagonizado pelo príncipe holandês Maurício de Nassau. Com o "rasteiro" objetivo de recuperar o dinheiro investido na construçao de uma ponte sobre o rio Capiparibe, por meio da cobrança de pedágio, Nassau bolou uma festa-espetáculo. Anunciou que, na inauguraçao da obra, seria mostrado um "boi voador". Mandou encher de palha o couro de um boi, pendurou-o em uma corda e o fez sobrevoar a multidao de pagantes.

Outro atrativo sao as ilustraçoes raras, bem contextualizadas por Tinhorao: Frans Post e Zacharias Wagener para o período holandês; Antonio Francisco Soares, com os desenhos dos pouco conhecidos carros alegóricos das festas pelo casamento do príncipe dom Joao VI com a princesa Carlota Joaquina, em 1786; e Carlos Juliao, que retratou as coroaçoes de reis do Congo no século XVIII; gravuras inéditas em livro de Debret para o século XIX; além de Augustus Earle, Taunay e Chamberlain.




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