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Saxofonista ganha a vida fazendo serenatas

Ray Nery toca em frente a prédios da região em busca de caixinhas para garantir o seu sustento

Por Vinícius Castelli
Do Diário do Grande ABC
14/02/2021 | 00:42
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Celso Luiz/DGABC


Depois de um dia todo de trabalho, já em casa, na hora de preparar o jantar, uma música ao vivo invade, sutilmente, a casa e os ouvidos. Quem a toca é Rayrlon Bezerra Nery, 29 anos, baiano de Sobradinho que chegou à São Paulo junto com a pandemia da Covid e busca por meio da música forma para sobreviver.

Rayrlon trancou o curso de direito por questões financeiras e veio de mala e cuia morar na casa da mãe e do padrasto, na Zona Norte da Capital, com o sonho de ser reconhecido como músico. Mas é no Grande ABC que ele tem se apresentado. O palco? A calçada. Ray Nery, como é conhecido artisticamente, pega o carro e sai sem rumo programado. Apenas escolhe uma cidade, um bairro, pega seu saxofone e começa a tocar, geralmente na frente de prédios.

Ele conta que a ideia de se apresentar pelas ruas surgiu de forma muito despretensiosa, no início da pandemia. “Parei em uma esquina do bairro da Lapa e comecei a tocar para as pessoas que passavam por ali, quando do nada ouvi uma chuva de aplausos. Olhei para cima e vi que eram as pessoas confinadas em seus apartamentos. Daí me perguntaram se eu precisava de algo, respondi que queria apenas trabalhar”, relembra.

O baiano conta que os primeiros passos na música foram com incentivo do tio, Esdras José Bezerra da Silva, 50, que toca trompete. Mas a paixão dele é pelo saxofone. “Toco vários instrumentos, mas optei pelo saxofone pela sua versatilidade, a possibilidade de tocar vários estilos musicais”, comenta.

Ray explica que quando começa a tocar, a recepção é calorosa. “(As pessoas) Geralmente se emocionam e eu me emociono junto. A música nos proporciona troca muito bacana.”

Fato é que agora Ray encanta e melhora a vida das pessoas, como é o caso da mãe de um recém-nascido, que lhe agradeceu porque o som do instrumento acalmou a criança. “Certa vez, uma pessoa em situação de rua me ajudou com moedas. Me emocionei bastante”, lembra.

Mas não são só flores, como o músico explica. “Já me atiraram ovos e chamaram a polícia. A policial chegou e disse: ‘não acredito que chamaram a gente para uma coisa linda dessas’”.

A assistente de apoio a gestão Fabiana Hessel Campos Brasil, 45, foi uma que se surpreendeu com a boa surpresa. Ela mora em São Bernardo, no Baeta Neves, e foi pega de surpresa dias atrás. “Estava jantando na hora que ele estava tocando. No primeiro momento achei que fosse a TV de algum vizinho. Comecei a ouvir ele falar. Fui na janela do quarto e visualizei”, conta.

Para Fabiana, foi um momento especial. “Estamos passando por período tão difícil, com tantas perdas devido à pandemia, não perdas só materiais, mas de pessoas amadas. Aquilo alegrou o coração, não só meu, mas de todos do prédio da frente. É aquele momento como se ele mostrasse para nós que ainda há esperança, que vamos ter dias como tínhamos antes, de paz. Senti a alma leve.”

Professora aposentada, Aurora Naida Conejero Polachine, 74, também assistiu a apresentação de Ray em São Bernardo. “Foi experiência muito agradável. Algo que só havia visto em reportagem. Todos daqui e do outro prédio aplaudiram.”

Normalmente Ray começa a apresentação com Como é Grande o Meu Amor Por Você, conhecida na voz de Roberto Carlos, e encerra com Trem das Onze, de Adoniran Barbosa (1910-1982). “A primeira por ser a mais pedida do repertório e, a última, porque a letra retrata despedida”, explica o artista.

Hoje Ray consegue viver de suas apresentações. Quem gosta do show pode deixar um valor para ele. Ou até mesmo fazer doação, já que seus dados bancários pode ser conferidos em sua conta no Instagram (@raynery88). Mas, o mais importante para ele, é poder viver a arte, no sentido literário da palavra. “Tocar é maravilhoso. O que mais me faz feliz é transmitir bons sentimentos por meio da música”, encerra.
 




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