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Guignard e as chinesices
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22/06/2010 | 07:06
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A tranquilidade das paisagens mineiras do pintor Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), em que montanhas se fundem com nuvens e nas quais balões de festa de São João que evaporam pelos ares como as pequeninas igrejas sempre presentes em suas criações, pode ter relação com as chinesices (modos ou usos da China) que se encontram em Minas Gerais desde o século 18 - seja a partir da vivência de chineses na época na região brasileira ou por meio de representações vindas nas caixinhas de chá ou pelo comércio de produtos entre Macau e Portugal. "Nas pinturas das igrejas de Sabará vê-se entre chinesices céus tranquilos pintados com aves de asas compridas e papagaios e pipas, o que teria surtido influência por tabela no Guignard", diz o crítico e curador Paulo Herkenhoff.

Como ainda não pensar que uma pintura do brasileiro como Paisagem Imaginante, de 1941, seria uma versão de um ‘mundo flutuante' ou que, como adianta Herkenhoff, as casas, pessoas e balões das obras de Guignard não seriam "quase ideogramas"? Essa discussão já era antiga, como afirma o curador, mas pela primeira vez é aprofundada, a ponto de ser o mote principal de uma mostra, Guignard e o Oriente: China, Japão e Minas, aberta amanhã para convidados e na quinta-feira para o público no Instituto Tomie Ohtake.

Herkenhoff, ao lado de Priscila Freire, ex-diretora do Museu de Arte da Pampulha, de Belo Horizonte, se debruçou no último ano a esse tema particular, uma relação natural e concreta entre a obra de Guignard, um dos maiores pintores brasileiros que viveu desde a década de 1940 em Minas, com as tradições artísticas orientais, não só as da China, mas também do Japão. O resultado da pesquisa é a exposição, feita em parceria com a Casa Fiat de Cultura e com concepção de Priscila Freire, por enquanto será apresentada apenas em São Paulo.

A mostra reúne cerca de 100 obras, quase a metade desse número de pinturas de Guignard e mais ainda telas de pintores chineses contemporâneos do artista, gravuras japonesas da tradição Ukiyo-e (de Hiroshige e Kunisada), fotografias e objetos como um biombo chinês, um relógio e um oratório de meados do século 17 com moldura à moda de laca chinesa. Priscila já tinha consigo uma pesquisa sobre as chinesices em Minas Gerais e convidou Herkenhoff para a empreitada. "Viajamos a Mariana, Sabará e ao Caeté", conta o curador.

NATUREZA
Guignard teve sua formação artística na Europa, mas é a partir de um "encantamento com a natureza brasileira", como lembra Herkenhoff, que o artista vai criar verdadeiramente sua marca. Uma relação primeira de Guignard com o japonismo já se pode ver nesse período, quando o artista, instalando seu ateliê em 1930 no Jardim Botânico do Rio, se interessa pelo tema da vegetação. "Bambus e árvores com fundo iluminado, o chamado efeito treliça, é uma característica da gravura japonesa. Isso se vê em obras de Monet do século 19 e, no Brasil, nas de Carlos Oswald", afirma o curador.

Um diálogo direto da estética da treliça se percebe nitidamente no óleo sobre madeira Jardim Botânico, dito Paisagem Tropical, pintado por Guignard em 1937 - mais adiante, ainda, na pintura Parque Municipal de Belo Horizonte, de 1949. "Buscar entender o compromisso da arte e da natureza além da mera representação realista é o que se vê de mais forte na ligação entre Guignard e o Oriente", informa o curador.

Guignard e o Oriente - Exposição. No Instituto Tomie Ohtake - Av. Brigadeiro Faria Lima, 201, São Paulo. Tel.: 2245- 1900. Visitação a partir de quinta-feira. De terça a domingo, das 11h às 20h. Entrada franca. Até 29 de agosto.




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