Economia Titulo Leilão
Trabalhador dá lance e acumula dívida
Por Soraia Abreu Pedrozo
04/11/2012 | 07:00
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Tiago Silva/DGABC


Movido pela curiosidade e pelo fato de achar que outro lance superaria o seu, o trabalhador de Santo André, que preferiu não se identificar, de um dia para o outro acumulou dívida de R$ 21.680. Pela internet, ele começou a olhar os lotes de veículos disponibilizados em leilão e, na brincadeira, em vez de um, deu lance para adquirir dois carros. "Eu pensei que haveria um lance maior do que o que eu dei. Não achei que fosse arrematar", disse.

Para sua surpresa, seus lances foram únicos, e ele recebeu o boleto para, em 24 horas, pagar o valor à vista pelos dois carros. Sua reação imediata foi ignorar a cobrança. Foi então que começaram os telefonemas em seu celular - que não foram atendidos - e na empresa em que trabalha, quando percebeu que o negócio era realmente sério, principalmente quando o avisaram que, se o pagamento para a aquisição dos bens ou a multa pela desistência não fossem feitos, ele seria acionado na Justiça.

A multa, composta por 5% do valor arrematado, despesas com taxa de administração e 30% do custo do bem leiloado, totalizava R$ 7.800. Mesmo sem dispor dos recursos, o trabalhador propôs ao site de leilões online a possibilidade de ficar com um dos automóveis, e se isentar da multa. "Ofereci o acordo quando percebi que o valor da multa era quase o preço de um dos carros." A proposta foi aceita, contanto que ficasse com o veículo mais caro, um Gol 1.0, geração quatro, básico, duas portas, ano 2009 por R$ 12.155. O valor incluía o preço do veículo, R$ 11.100, mais R$ 555 de comissão do leiloeiro e R$ 500 de despesas de organização e depósito.

O trabalhador dispunha de R$ 4.155 apenas, então, por conta do prazo de pagamento apertado, sequer procurou o gerente do banco para negociar. Fez um empréstimo no caixa eletrônico no valor de R$ 8.000, com juros mensais de 3,75% (as taxas para financiamento de veículos hoje giram em torno de 1,5%). Resultado: 20 parcelas de R$ 590.

Ponto fundamental na participação de leilões não realizado foi a visitação do bem e a pesquisa de preço, para verificar se estava abaixo do praticado no mercado. Até porque característica atrativa de leilões é que o custo do produto pode ser até 90% menor. Para tanto, porém, é imprescindível verificar se o item está em bom estado.

A atividade de leiloeiro, regulamentada em 1932 pelo decreto nº 21.981 do então Presidente da República Getulio Vargas, exige registro na Junta Comercial e prevê pena para a atividade mal exercida. O profissional representa o vendedor e é remunerado pela prestação de serviço, portanto, se algo dá errado e o arrematante desiste do bem, a operação mal sucedida é de responsabilidade do leiloeiro. "Por isso é essencial que os interessados leiam o edital. No documento todas as regras de participação estão explícitas", aponta o advogado e responsável pela Sold Leilões Online, Leonardo Takemoto, que fez o acordo com o trabalhador. "O leilão é uma disputa idônea, não posso escolher quem leva o produto. Quem der o maior lance leva."

De acordo com Takemoto, em torno de 5% a 10% dos participantes desistem de pagar pelo bem arrematado. "Neste caso, a maioria age por impulso ou não lê o edital e não tem noção de que o pagamento é feito à vista ou, ainda, não visita o lote antes de dar o lance." A primeira ação para fazer com que o arrematante pague pelo item ou arque com a multa (que gira em torno de 40% do valor do produto) é o bloqueio do cadastro - assim, se a pessoa quiser participar de outro leilão, é impedida. O segundo passo, diz Takemoto, é a cobrança incisiva via telefone e e-mail. Se não houver resposta, é feita a cobrança jurídica com ingresso de ação judicial. "É bom ressaltar que tudo isso é avaliado. Estamos abertos à negociação. Nossa ideia não é viver de multa."

Na avaliação da diretora do Procon de Santo André, Ana Paula Satcheki, o código civil prevê que, em leilões, quando é dado o lance, é preciso assumi-lo. "Isso está descrito no edital do leilão, por isso é fundamental lê-lo antes de dar o lance. Já vi casos em que o juiz consegue anular o arremate, mas a pessoa geralmente tem uma justificativa." Ela destaca, porém, que casos assim acontecem mais com leilão judicial, quando o bem ofertado estava penhorado ou era proveniente da massa falida de empresa.

A Sold Leilões é especializada em vendas de bens de apartamentos decorados, mas também oferta veículos e imóveis. No caso dos carros, 70% são oriundos da troca de frota de companhias. Hoje, segundo Takemoto, a empresa possui 1,3 milhão de clientes e, neste ano, foram realizados 600 leilões. Para efeito de comparação, em 2009 eram 35 leilões com a participação de 120 mil pessoas.

Construtoras ofertam peças de decoração

O engenheiro Luiz Carlos Torres, 51 anos, de São Caetano, gosta de olhar oportunidades oferecidas por sites de leilões online, especialmente para adquirir peças que foram usadas em apartamentos decorados pelas construtoras para visitação do público em empreendimentos vendidos na planta. Ele já conseguiu boas pechinchas, como uma secadora de roupas, uma pia, uma luminária e outros itens, com valores, pelo menos, 30% mais em conta que os vendidos em lojas.

Esse tipo de leilão já se tornou tradição, pois para as construtoras é uma forma de otimizar seus espaços, sem ter de gastar com frete para retirar os movéis e acessórios. Além disso, cada decoração não costuma ser repetida, já que é feita sob projeto para o ambiente dos novos condomínios.

Para Torres, a experiência da compra em leilões desse tipo tem sido positiva, mas exige alguns cuidados. "Tem de pesquisar, para poder comparar com o preço de mercado", assinala. Ele cita ainda que é preciso fazer as contas para saber se vale a pena a aquisição, já que há despesas como a comissão do leiloeiro (5%), a taxa de administração e o transporte da mercadoria.

Informar-se sobre as regras é fundamental, para o comprador não se arrepender depois, dizem as próprias empresas do ramo. "Nossa primeira recomendação é ler o edital antes de participar, para ver quando o leilão começa e termina e quando se pode visitar para ver o bem, por exemplo", afirma Carla Umino, leiloeira oficial do site Lance Total. Normalmente, as oportunidades de oferta duram cerca de 15 dias na internet e, nesse prazo, dá para analisar o custo de frete, se precisará de mão de obra para carregar o produto e os valores que a pessoa está disposta a dar.

As recomendações são importantes, já que, apesar da possibilidade de se adquirir pechinchas, os compradores têm de saber que esse tipo de negócio tem regras próprias. Trata-se de relação de consumo específica, híbrida, em que há normas do Código de Defesa do Consumidor que não se aplicam.

Por exemplo, não há o prazo de garantia legal de 90 dias, existente se a compra for realizada por uma revenda. Isso significa que a pessoa não pode reclamar de defeitos, após levar para casa o bem adquirido, segundo o advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, Guilherme Varella. (Leone Farias)

 

 




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