Setecidades Titulo Caso Eloá Pimentel
'Ele solto não vai resolver toda a minha dor'

Ana Cristina fala sobre possível progressão de pena de Lindemberg, que executou sua filha a tiros, em 2008

Por Yasmin Assagra
Do Diário do Grande ABC
22/11/2020 | 00:29
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Nario Barbosa/DGABC


“Cada vez mais é difícil de acreditar, minha filha está morta e ele, vivo. Preso ou solto, não trará minha filha de volta”. A frase é da comerciante Ana Cristina Pimentel da Silva, 54 anos, mãe da estudante Eloá Cristina Pimentel, morta em 2008, aos 15 anos, no Jardim Santo André, pelo ex-namorado Lindemberg Fernandes Alves. Desde a tragédia, o detento cumpre pena em regime fechado, porém, no início do mês a defesa dele solicitou progressão ao regime semiaberto, o que gerou revolta e indignação da família.

Há 12 anos, Eloá ficou em cárcere privado em seu apartamento por cerca de 100 horas. A jovem morreu com dois tiros. Lindemberg foi detido e condenado a 39 anos de prisão, cumprindo sua pena em Tremembé, no Interior. Ainda não há data para que seu pedido de progressão da pena seja analisado, uma vez que o detento precisa ser submetido a exame criminológico antes (leia mais abaixo). 

Para Ana Cristina, apesar da dificuldade em falar sobre o assunto, não a impressiona que isso ocorra. “Fiquei sabendo, não fiquei surpresa, pois já esperava. Tenho certeza de que ele não é pessoa sã. Ele é ruim. Mas, infelizmente, a Justiça é falha. Com ele solto, não vai resolver os meus problemas e toda minha dor”, lamenta a mãe. Ana lembra que a família de Lindemberg ainda mora no Jardim Santo André e torce para não encontrá-lo, caso o regime semiaberto seja autorizado. 

A angústia em saber que isso está perto de acontecer torna a realidade mais difícil, e Ana teme que a tragédia que ocorreu com sua filha atinja outras meninas. “Depois de ter todo meu apartamento destruído (após a tragédia), nós precisamos recomeçar, por ela e por nós. Trabalhamos e temos nosso sustento. Ele, lá (na cadeia) tem alimentação, academia e trabalha. Depois disso, ainda pode sair. O ruim é que, Deus me livre, mas pode haver próximas vítimas. O que ele fez com ela (Eloá) faz com qualquer uma. Ele era um filho para mim, mas não duvido mais de nada”, lamenta Ana Cristina. 

Com lágrimas nos olhos, a mãe relata a dificuldade em receber a indenização do Estado. Até agora a família não recebeu nada. A Justiça já negou dois recursos de ação movida pela família. O valor era de cerca de R$ 800 mil. Na época, a família alegou que a morte da jovem foi resultado da conduta inadequada da Polícia Militar ao tentar libertar Eloá. 

“Não recebemos nada, tudo foi recusado. Mas vou recorrer, ainda posso recorrer, é o mínimo. Nenhum valor paga tudo o que aconteceu, mas é inadmissível”, lamenta a mãe. 

LEMBRANÇAS
Ana Cristina relembra momentos com a filha e projeta que, com 27 anos, Eloá estaria formada em medicina veterinária, seu sonho de infância. “Sabemos das nossas condições, mas eu ia lutar para fazer com que ela se formasse na profissão dos seus sonhos. Estudiosa ela era, tenho certeza que estaria trabalhando na área”, comenta a mãe.

A saudade de Eloá, às vezes, é confortada por fotos e roupas que a mãe guarda, além “do apoio de Deus”, que Ana busca. “Me apego em Deus. Todo mundo que conheceu Eloá sabe quem ela era e isso também nos traz conforto. Ela espalhou amor”, ressalta. 

Há pelo menos cinco anos, a família se mudou do bloco 24 da CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano), local da tragédia, mas continua morando no Jardim Santo André. Ana Cristina, seu marido e pai de Eloá, Everaldo Pereira dos Santos, seu filho, Everton Douglas Pimentel, sua nora e seu neto, Luigi, de apenas um mês. Na residência, Ana ainda guarda pertences da filha, aos quais recorre como refúgio nos dias em que a saudade fica forte. “Tenho bonecas, roupas, ursos de pelúcia e, principalmente, fotos. Ela será meu guia, para sempre”, conta a comerciante. 

Sobre Lindemberg, Ana espera a justiça de Deus. “Quem perdoa é Ele, então, enquanto nossa Justiça é falha, a justiça do Senhor é digna. Ele (Lindemberg) não precisa pedir perdão para mim, é com Deus que ele precisa conversar”, finaliza a mãe de Eloá.


Especialista crê em progressão da pena

O pedido da defesa de Lindermberg Alves para progressão da pena ao regime semiaberto depende da análise da juíza Sueli Zeraik, da Vara de Execuções Penais. A defesa solicitou a progressão levando em consideração o tempo cumprido e sua remição. Por trabalhar na cadeia, o detento teve 313 dias de pena perdoados. Caso aprovado, Lindermberg pode trabalhar ou estudar de dia, retornando à noite para a prisão.

Lindemberg deve passar nos próximos dias por exame criminológico, realizado por equipe composta de psiquiatra, psicólogo ou assistente social do sistema prisional nomeado pelo Judiciário. O intuito é identificar se o preso tem ou não as condições de estar em liberdade. Ainda não há data definida para que Lindemberg realize o exame, mas, depois da análise, os laudos são avaliados pela juíza, que irá decidir sobre o pedido.

De acordo com o especialista em direito penal e professor da Faculdade de Direito São Bernardo Vladimir Balico, para autores de crimes hediondos, como é o caso de Lindemberg, existe a possibilidade de solicitar a progressão após ter cumprido um sexto da pena, além da redução de um dia de detenção a cada três dias trabalhados na prisão. 

“Para que a juíza autorize a progressão é necessário seguir os objetivos e os subjetivos. Os objetivos são relacionados à pena, se ele já cumpriu esse um sexto, ou seja, praticamente 12 anos preso. Hoje, a lei fala em progressão para 50% a 70%, para crimes como esse, mas como ocorreu com a lei antiga, ele segue esse um sexto”, detalha. O especialista explica que os ‘subjetivos’ são pelo bom comportamento, ou seja, a penitenciária precisa emitir uma nota relatando o comportamento do detento e, se for positivo, já é suficiente para autorizar o semiaberto.

“Com isso, a juíza ainda solicitou esse exame criminológico, em que ela pode exigir, mas não é obrigatório. Se o exame der negativo, ele (Lindemberg) talvez não tenha a autorização para o semiaberto, já o se exame der positivo, de que não oferece riscos para a população, ele acaba preenchendo todos os requisitos para o semiaberto”, detalha. 

Balico ainda ressalta que, apesar de ter sido crime violento e repugnante, isso acaba não impedindo o pedido de semiaberto ao detento. “Depois que chegar o resultado do exame a juíza vai ouvir o MP (Ministério Público) e novamente a defesa de Lindemberg”, conclui o especialista.

Lindemberg foi condenado em fevereiro de 2012 a 98 anos e dez meses de reclusão pela morte de Eloá e outros 11 crimes. Entretanto, em junho de 2013 sua pena foi reduzida para 39 anos e três meses em regime fechado. 




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