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Cocaína no ABC tem 53% de impureza
Por Glauco Araújo
Do Diário do Grande ABC
01/11/2003 | 18:54
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Que toda cocaína vem batizada (misturada a outros produtos), a maioria das pessoas sabe – ou pelo menos desconfia. A péssima notícia, para quem é usuário da droga no Grande ABC, é que aqui ela chega com um grau de impureza médio de 53%. Há casos, porém, em que as substâncias adicionais, que multiplicam e potencializam os males à saúde, representam até 88,3% do papelote vendido ao consumidor. A conclusão faz parte de um estudo revelador do perito Nelson Golçalves, diretor do IC (Instituto de Criminalística) de São Bernardo. A pesquisa é a primeira do gênero no Brasil e servirá como parâmetro para análises sobre o tema no país inteiro.

O trabalho de Gonçalves, que teve a parceria do IC de São Paulo e do ICB (Instituto de Ciências Biomédicas) da Universidade de São Paulo, foi realizado com amostras de todas as apreensões de cocaína feitas na região entre 1999 a 2001. O ponto de partida para o estudo foram os furos na lei 6.368/76, que trata sobre entorpecentes do país. Para Gonçalves, o texto legal apresenta algumas falhas, por não levar em conta a evolução do tráfico, as formas de consumo e os tipos de tratamento para dependentes químicos. “Hoje, conforme essa lei, a única preocupação é com o aspecto qualitativo, ou seja, com a identificação do tipo de droga apreendida.”

Segundo Gonçalves, é comum os processos criminais pedirem a quantificação da droga apreendida. Mas como, até então, não havia estudo ou parâmetros para determinar esses dados em laudos periciais, isso era impossível. Nos estudos do perito, foram encontradas as seguintes substâncias, todas misturadas à cocaína vendida no Grande ABC: anestésicos locais (lidocaína, procaína e tetracaína), cafeína, AAS (presente em remédios como Melhoral), efedrina, ácido bórico, manitol (composto usado em talcos), amido, açúcares (dextrose e lactose) e bicarbonato de sódio.

A pesquisa também revelou uma curiosidade: não foram encontrados produtos que, costumeiramente, são citados por traficantes e usuários como presentes na composição da droga batizada, entre eles o pó de mármore, o cimento, o gesso e o cal. “Isso é um mito quando se fala da droga. Mito criado pela mídia e, principalmente, pelos traficantes”, disse Gonçalves.

Riscos à saúde – O uso de adulterantes na cocaína não só aumenta o lucro dos traficantes, como prejudica ainda mais a saúde do consumidor, segundo estudos do Departamento de Farmacologia do Instituto de Ciências Biomédicas da USP (Universidade de São Paulo).

De acordo com o titular do departamento, Cristóforo Scavone, 46 anos, as substâncias adcionais aumentam o risco de doenças do coração. “Os anestésicos provocam um determinado efeito no sistema cardiovascular. A interação deles com a cocaína agrava esses sintomas.”, disse Scavone.

No crack, a presença desses adulterantes é mais forte. “O crack é a cocaína totalmente impura, o refugo da droga. Nesses casos, problemas no fígado são mais comuns.

Segundo Scavone, além da dependência que a cocaína provoca, os adulterantes geram um problema secundário, mas de gravidade igual ao da própria droga: a cirrose. “O alvo sempre será o fígado, comprometendo outras atividades do organismo, em um efeito dominó", disse.

Para o perito Nelson Gonçaslves, é justamente aí que reside a importância de seu estudo. “Agora podemos determinar o teor do princípio ativo de cocaína em cada amostra, que atualmente não é realizada pelos laboratórios oficiais”, explicou.




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