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Valor de resgate cai e nem classe média baixa se livra de seqüestro
Por Luciano Cavenagui
Do Diário do Grande ABC
22/02/2005 | 14:11
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Os seqüestros atingem cada vez mais a classe média baixa do Grande ABC. Na segunda-feira, duas funcionárias públicas foram libertadas de cativeiros vizinhos na favela do Jardim Ipê, em Mauá. Uma delas integra a Guarda Municipal de São Bernardo e a outra funcionária da Prefeitura de Mauá, casada com um vereador da cidade. A Polícia Civil prendeu nove integrantes da quadrilha apontada como autora dos  crimes. Um adolescente que teria resistido à prisão foi morto. O grupo teria exigido resgates de R$ 300 mil e R$ 70 mil, que não foram pagos.

“O perfil da pessoa seqüestrada vem mudando nos últimos tempos, principalmente de um ano para cá. Aquela imagem de milionários sendo carregados para cativeiros é cada vez mais rara. Atualmente, cerca de 80% dos seqüestros são cometidos contra pessoas de menos poder aquisitivo”, afirmou o delegado da Dise (Delegacia de Investigaçõe Sobre Entorpecentes) de São Bernardo, Paul Henry Verduraz, que também é responsável pelos casos de seqüestros na cidade.

“Os bandidos querem agora dinheiro rápido e fácil, mesmo que seja em menor valor. Os seqüestros de membros da classe alta geralmente envolvem negociações demoradas e dão poucas chances de êxito aos criminosos. Por isso, a nova tendência nesse tipo de crime”, avalia Verduraz. A opinião é compartilhada pelo delegado seccional de São Bernardo, Marco Antônio de Paula Santos, que responde também por São Caetano. “Outra característica desses novos seqüestros é que são planejados, geralmente, por pessoas conhecidas das vítimas”, afirma o delegado.

O líder do bando acusado de seqüestrar as duas mulheres, Cícero Ribeiro da Silva, 33 anos, é inquilino do marido da guarda municipal M.C.P.S., 52 anos. No outro caso, o preso Rosivandro da Silva Vianna, 26 anos, trabalhou na Prefeitura de Mauá como prestador de serviços gerais e ajudou a captar informações sobre a vítima, E.H.S., 39 anos, servidora municipal casada com o vereador Rogério Moreira Santana (PT), que atualmente exerce seu segundo mandato consecutivo na Câmara.

Em um caso da região que causou repercussão nacional, a morte da menina Emile, de 10 anos, em 6 de outubro do ano passado em Rio Grande da Serra, parte dos autores do crime era vizinha da família e a intenção inicial da quadrilha era pedir um resgate para o pai, o candidato a vice-prefeito derrotado nas eleições, Nilson Gonçalves de Souza (PT). “Infelizmente, essa é uma tendência que vem se consolidando nos últimos anos não só na região, como também em todo Estado. Muitos desses seqüestros são realizados ou idealizados por antigos ladrões de banco. Depois que houve maior repressão a esse tipo de crime, passaram a realizar seqüestros”, disse o delegado seccional de Santo André, Luiz Alberto de Souza Ferreira, que responde também por Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra.

A guarda municipal foi levada às 6h de quinta-feira quando saía de casa, no Jardim Leblon,  em São Bernardo, para trabalhar. Um fusca azul, com três bandidos, interceptou seu carro, um Gol. M. foi colocada no banco de trás do Fusca e conduzida ao cativeiro. O marido dela é aposentado e possui alguns imóveis na cidade. O líder da quadrilha, Cícero Ribeiro da Silva, era seu inquilino numa casa no Ferrazópolis. “Cícero e o resto do bando pensavam também que o marido da vítima era agiota e que tinha muito mais dinheiro, o que não é verdade”, diz o delegado Verduraz.

De quinta a domingo, foram feitos dez contatos telefônicos com a família. “No início, pediram R$ 300 mil de resgate. Fomos negociando e o valor baixou para R$ 150 mil. Desde o início do crime comunicamos a polícia e seguimos a orientação de negociar com os bandidos”, disse um irmão da vítima, J.P., 37 anos, analista de tráfico.

“Ficava o tempo todo em um cubículo no barraco, amordaçada e com os olhos vendados. Só me alimentava com bolacha e água. Meu banheiro se resumia a um balde. Na sexta-feira é que fiquei com mais medo. Os bandidos me disseram: ‘Seu marido não quer pagar. Primeiro, vamos cortar seus dedos, depois, suas orelhas, até ele mandar o dinheiro‘. Fiquei apavorada”, disse a guarda municipal.

A polícia chegou ao mentor do seqüestro após o marido da guarda revelar que havia sido procurado pelo inquilino dias antes do seqüestro. Ele pedia ao proprietário de seu imóvel que lhe trocasse um cheque de R$ 8 mil. Ele se recusou a atender o pedido, mesmo diante da insistência do inquilino, que aproveitou a visita para perguntar detalhes sobre a vida da família. Com a pista sobre o suspeito e por meio de escutas telefônicas, a polícia descobriu o líder do seqüestro, que foi preso na manhã de segunda-feira e revelou o local do cativeiro. Ao chegarem lá, às 10h30, um menor de 16 anos teria atirado contra os policiais. Um deles revidou e matou o rapaz com três tiros.

Após libertar a guarda municipal de um cativeiro, os policiais revistaram um barraco ao lado. Lá, encontraram a mulher do vereador amordaçada sob uma cama. Ela tinha sido seqüestrada às 8h de segunda, na porta de casa, no Parque das Américas, quando saía para trabalhar em companhia do marido e do filho de 2 anos. “Foi horrível, só pensava no meu filho. Ainda bem que durou pouco.”.

Na área da Delegacia Seccional de São Bernardo e São Caetano, os números de seqüestros foram os seguintes: 24 em 2001 e 2002; 13 em 2003; e quatro em 2004. Nas cidades sob comando da Delegacia Seccional de Santo André, o delegado Ferreira disse que, em 2004, foram 6. Não informou sobre anos anteriores. A Secretaria de Segurança Pública não informou quantos são os seqüestros em andamento.



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