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‘Alaíde cumpriu mais o plano de governo que Atila’
Por Raphael Rocha
Do Diário do Grande ABC
16/09/2019 | 07:00
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André Henriques/DGABC


Homem forte do governo de Alaíde Damo (MDB), que terminou na segunda-feira, o ex-juiz João Veríssimo afirma que, do plano de governo que a chapa Atila Jacomussi (PSB)-Alaíde levou para as ruas em 2016, a maior parte foi cumprida pela emedebista. Ele destaca que a atual vice-prefeita teve coragem de enfrentar temas nevrálgicos para a administração, como impasse na relação com a FUABC (Fundação do ABC) e a dívida da Sama (Saneamento Básico do Município de Mauá) com a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), mas ressaltou que Alaíde não irá procurar medidas judiciais para reverter a situação.

Qual balanço o senhor faz desses cinco meses de governo Alaíde Damo (MDB)?
Impossível analisar a passagem da dona Alaíde só nos cinco meses. Tem de analisar todo o contexto, as três passagens. Quando você ganha uma eleição, vem com time completo. Antes de ganhar a eleição você tem na sua cabeça o que vai fazer, quem vai ajudar. Dona Alaíde, como vice, não tinha essa estrutura que o Atila (Jacomussi, PSB) tinha ou que qualquer outro candidato tem. Ela foi pega de surpresa, um ano e quatro meses depois da posse, quando foi preso. Dona Alaíde teve de montar em 24 horas uma equipe para tocar Mauá, uma cidade difícil, pobre, com um monte de problemas sociais, endividada. Na primeira interinidade, ela montou equipe boa, razoável, foi o que fez no momento. Foi tocando a administração. Foi quando um dos principais problemas de Mauá aconteceu, o encerramento do contrato da Fundação (do ABC). Ela assumiu sem nenhuma providência do governo anterior. O contrato venceu em julho e ela teve de começar a pagar indenizatório, um procedimento que não existe na legislação, inventou-se isso. Na segunda vez ela ficou uns 45 dias, foi quando cheguei. Nesta segunda interinidade, eu era advogado da dona Alaíde e do seu Leonel (Damo, ex-prefeito), e eles pediram minha ajuda. Começamos a pensar e mexer no que poderia ser mexido. Sobre o contrato da Fundação, começamos a pensar em uma providência, ver o que poderia ser feito. O Atila não havia mexido em nada. Não poderia continuar aquele indenizatório. Era um pagamento de R$ 15 milhões por mês e irregular.

Como foi conduzida a discussão com a Sabesp?
Um dos problemas que diagnosticamos era a Sabesp. O Toninho Bertucci (superintendente da Sama na segunda passagem de Alaíde), em uma das reuniões, veio com ideia de que a Sabesp poderia fornecer água para o (bairro) Sônia Maria. Decidimos sentar e conversar com a Sabesp para fazer todo serviço de Mauá. Conversei com a dona Alaíde, ela aceitou. Conversamos com a BRK (responsável pelo serviço de esgoto da cidade). Em janeiro começamos a pensar nisso. Sentamos várias vezes para estruturar como seria a relação deste contrato. Na época não falamos em valores, foi só como seria tudo, como ficaria a Sama. Logo em seguida o Atila voltou. Mas soube que o Atila estava conversando com a Sabesp também. Quando voltamos, na terceira interinidade, nos ligaram da Sabesp para a gente conversar de novo. Tivemos coisa mais concreta. A Sabesp diz que Mauá deve R$ 3,2 bilhões. O doutor Luiz Ferreira (superintendente da Sama nesta terceira passagem) contesta, mas precisava ser feita auditoria, iria demorar um pouco mais. Precisávamos definir a estrutura do contrato, remissão da dívida, investimento, funcionários. Então assinamos o protocolo de intenções. A dívida é impagável. Estivemos com o presidente da Sabesp (Benedito Braga) e em várias reuniões com a Sabesp, estruturando modelo, valores definidos, fizemos pedido de aporte, valor de repasse, de 4%. Nos espelhamos no modelo de Santo André. Havia um diferencial, porque pedimos R$ 100 milhões de aporte. Mas como em Mauá não tem gerenciamento do esgoto (na Sama), o superintendente (da Sabesp) dizia que R$ 100 milhões era difícil, mas aventou uma proporcionalidade. Acreditávamos que poderia ter aporte legal para investir em saneamento, recapeamento, resíduos sólidos. A estrutura do contrato está pronta, com 40 anos de concessão.

E a questão da FUABC? É solucionável?
É caso seriíssimo. Ninguém fez nada, ninguém teve coragem, foi empurrando com a barriga. Nesta última interinidade, decidimos acabar com isso. O Tribunal de Contas nos cobrou. O Ministério Público vivia cobrando a gente. Sentamos todos, no governo, e decidimos enfrentar essa parada. Analisamos todas as possibilidades que poderiam acontecer. No início começamos a pensar. Tivemos várias reuniões com a Fundação no Ministério Público. O Luiz Mario (Pereira de Souza Gomes, presidente da FUABC) disse para mim, na frente do doutor (José Luiz) Saikali (promotor de Justiça) e de outros funcionários, que faria tudo para atrapalhar que Mauá largasse a Fundação. Já que vai fazer tudo para atrapalhar, teríamos de tomar providência. Sentamos com o secretário de Saúde, que era o David (Ramalho), e tomamos uma decisão. Com todas as cautelas. Abrimos chamamento público junto com o (contrato) emergencial. Eu só não achei que o despacho do doutor Glauco (Costa Leite, juiz de Mauá) seria tão bom para o município. O que o Saikali estudou o contrato em um ano, o doutor Glauco, em uma noite, desvendou tudo que poderia ser feito. As dívidas trabalhistas não cabem à Prefeitura, são de responsabilidade da Fundação. Está no despacho. Nem recorremos porque todo aquele despacho era o que queríamos. Tem de fazer o chamamento, ele disse. A gente tinha feito. O raciocínio dele foi lógico e prático. Não precisava fazer emergencial porque já estava com a Fundação (em caráter precário). Não achamos ruim por causa disso, porque legalizou nosso indenizatório. Nos deu prazo para fazer chamamento. Se a Fundação quiser participar, pode, normalmente. Se o Atila quiser, tem tudo na mão para fazer outro chamamento. O que a gente não poderia era aceitar situação de não saber formalmente o que a gente pagava.

Qual situação do Paço?
Muita coisa caminhando para ficar em ordem. Até o Banco do Brasil nos procurou para oferecer dinheiro para o município. Mudamos de classificação de D para C (na nota fiscal). A dona Alaíde não quis nem pegar o empréstimo. Ela sabia que havia muita coisa para fazer pelo município, mas naquele contexto não poderia endividar. Montamos equipe essencialmente técnica, com muitos jovens. Tiramos um pouco o eixo de nomeações políticas. A maioria dos nossos secretários era bacharel de direito, engenheiros, jovens. A relação com a Câmara foi tranquila neste período porque todo mundo viu que a gente queria regularizar a situação.

Atila disse que houve relação de troca de cargos pelo impeachment. Como o senhor avaliou?
Não é verdade. O que teve com a Câmara foi relação pós-impeachment, não pré-impeachment. Não houve barganha.

Foram quatro anos perdidos para a cidade com toda essa instabilidade política?
Não digo perdidos porque alguma coisa de boa saiu, vai sair. É ano que poderia ter sido muito melhor. Se você for pegar o plano de governo da chapa (Atila-Alaíde), quem mais cumpriu foi a dona Alaíde. Estávamos prontos para encaminhar estatuto do magistério, tudo conversado com os vereadores, com o sindicato. Demos aumento aos funcionários públicos. Tudo dentro do orçamento. Os passos estruturantes foi a dona Alaíde quem teve coragem de fazer. Ela não teve medo de nada e ela não tem medo de nada. Ela pergunta se está certo e pede para não fazer coisa errada.

Essas idas e vindas atrapalham de que tamanho?
Atrapalham mesmo. Você começa a fazer um projeto e no meio do caminho tem de tirar férias. Você volta três quatro meses depois, pega seu projeto modificado. Infelizmente na administração pública é assim: se eu começo a fazer algo, quem me sucede não vai querer seguir para não levar meu nome. Ele para, muda de nome, recauchuta. Mas leva tempo, desgasta.

O senhor conversou com a dona Alaíde sobre alguma medida jurídica com a anulação do impeachment?
Conversamos, mas não chegamos a uma conclusão neste sentido. Até onde sei, ela não vai (tomar medida jurídica). Queria até ressaltar que a dona Alaíde me surpreendeu nessas três interinidades. Na primeira não participei diretamente, mas tinha contato com ela. Mas na segunda e na terceira passagens, minha admiração pela dona Alaíde só cresceu. É uma mulher muito inteligente, franca, prática. Já discutia com empresários de igual para igual, com firmeza e segurança, o que foi legal. Achei que ela gostou de exercer o mandato. É inegável. Em nenhum momento ela pediu para dar um jeito de voltar. Ela quer que Mauá tenha tranquilidade. Se tiver que ser com o Atila, que seja com o Atila. Se for com ela, que seja com ela. Não que ela vá provocar qualquer situação para tirar o Atila.

Como o senhor vê o cenário político de Mauá para 2020?
Eu não sou bom em fazer prognóstico na questão política. Apesar de ser de família de político (é filho da ex-vereadora Celcina Fernandes e irmão do ex-vereador Rômulo Fernandes), nunca pratiquei. Acho que Mauá precisa é de gestão. Principalmente na segunda interinidade, vi que Mauá, com gestão boa, consegue avançar. Os governos federal e estadual disponibilizam vários convênios. Sem técnicos bons para ir atrás do recurso você perde dinheiro. Mauá precisa descobrir caminho para esse tipo de recurso. Tem de diminuir a máquina.

O grupo que estava com a Alaíde terá nome na eleição? Ela conversou com o senhor se tem esse desejo?
Foi tão rápido. Não esperávamos o retorno do Atila nesta oportunidade. Não conversamos sobre isso. Falo que a dona Alaíde gostou muito de administrar a cidade, até pela disposição que ela tinha.

Mas já começa a circular pela cidade uma predileção pelo seu nome como candidato...
É cedo para essas coisas. Muita gente tem me procurado. Mas não sentei para analisar isso. Sou sincero. Muita gente me procurou. Até pelo perfil, do fato de eu ter sido juiz, por eu ser negro. Essas coisas pesam. A pessoa acaba nem pensando tanto no João, mas no potencial político. Não que se alinhe comigo politicamente ou filosoficamente. Momento do País converge, tem (o presidente da República, Jair) Bolsonaro, (o ex-juiz e atual ministro da Justiça) Sergio Moro, governador do Rio (Wilson Witzel, ex-juiz). Às vezes querem surfar nessa onda. Mas não sentei seriamente com ninguém sobre isso. 




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