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Após acusação de racismo, Bombril tira do mercado a esponja relançada ‘krespinha’

Semana foi marcada por discussão; item para higiene já foi polêmica nos anos 1950

Por Tauana Marin
Do Diário do Grande ABC
21/06/2020 | 07:00
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Banco de Dados/DGABC


A Bombril, empresa brasileira com sete décadas de atividade na indústria de higiene e limpeza – com sede em São Bernardo –, ganhou as mídias semana passada, após relançar a palha de aço intitulada ‘krespinha’. No próprio dia, quarta-feira, a companhia tirou o produto de sua página na internet, acusada de racismo. O mesmo item, na década de 1950, ganhou os comerciais, nos quais uma boneca negra com os cabelos crespos apareciam.

“Não é de hoje que a empresa tem repetido nos seus produtos uma demonstração do seu pensamento racista. Não se pode mais aceitar que em pleno século 21, em meio às manifestações e protestos contra o racismo pelo mundo afora, isso aconteça. E mesmo aqui no Brasil, diante de várias crises – sejam elas sanitária, política, moral ou de assassinatos de nossos jovens e crianças negras –, não dá para aceitar que uma empresa nacional, como a Bombril, venha ferir a dignidade, humanidade da população negra com seus produtos. Sabendo que a maioria da população brasileira é negra”, avalia Márcia Regina Damaceno Silveira, ativista, militante, coordenadora do Fórum de Promoção da Igualdade Racial de Diadema Benedita da Silva e do Fórum de Promotoras Legais Populares da cidade.

Questionado sobre o relançamento da esponja, o professor e integrante do Núcleo de Estudos Africanos e Afro-brasileiros da UFABC (Universidade Federal do ABC) e autor do livro Desigualdade Racial no Brasil – Causas e Consequências, Ramatis Jacino, avalia que o nome do produto “evidencia que parte significativa do empresariado e do mercado publicitário mantém uma mentalidade racista”. “O fato de, talvez, considerarem que o nome não era ofensivo não diminui a gravidade da escolha, pois demonstra a incapacidade de compreender um debate que, há décadas, está presente na sociedade brasileira e ganhou notoriedade nas últimas semanas, por conta dos episódios que ocorreram recentemente nos Estados Unidos e no Brasil.”

Ainda segundo ele, duas atitudes foram fundamentais para que a empresa recuasse, sendo elas a denúncia nas redes sociais e nas mídias tradicionais, e a ação rápida e firme do movimento negro e seus aliados. “Ações judiciais, com exigência de reparação coletiva, também não devem ser descartadas.”

Para Márcia, a Bombril é avaliada como uma empresa “que não conhece a construção do processo histórico de desigualdades sociais/raciais em que todas as instituições foram cúmplice, além de não ter política de ações afirmativas a serviço da valorização/representação da comunidade negra. A saída é mesmo boicotar e denunciar pelo crivo racista em seu produto.”

Se uma empresa e seus publicitários consideram que esse tipo ‘krespinha’ é sinônimo de bom “marketing”, evidencia o quanto o racismo está naturalizado. “O positivo é o debate que proporcionou, resultado da visibilidade conquistada a partir das denúncias e manifestações de indignação. Necessariamente, esse episódio leva a reflexões e à busca de ações para que não mais ocorra. O prejuízo financeiro da empresa também foi bom, pois é pedagógico. O racismo é uma patologia social, estrutura as relações no nosso País e não é resultado da ignorância de alguns indivíduos. Ele é resultado de uma construção ideológica muito bem elaborada e formulada, surgiu para justificar o colonialismo e a escravidão”, analisa Jacino. “O racismo não só mata de bala perdida ou marcada, mas mata também quando faltam políticas de ações afirmativas, quando nos ridiculariza”, conclui Márcia.

Questionada pela equipe do Diário, a Bombril não se pronunciou até o fechamento desta edição.

Especialista avalia a imagem da empresa nacional diante do produto
Diante do relançamento da esponja de aço ‘krespinha’ pela Bombril, houve questionamentos sobre a imagem e a reputação da empresa nacional. Nesse sentido, Laércio Bento, do curso de marketing da Universidade Metodista de São Paulo, explica que a companhia continua a ter uma boa reputação, conquistada ao longo dos anos. “A identidade da marca é uma construção aspiracional – os profissionais de marketing planejam e dedicam investimentos na construção dessa identidade. Então, assim como um fato isolado não contribui positiva ou definitivamente para a construção, quando negativo, não pode destruir a reputação.”

No entanto, ele orienta quanto aos cuidados que as empresas devam ter permanentemente. “Vou além: entendo que todas as companhias deveriam ter departamento voltado para o desenvolvimento de políticas de sustentabilidade social, com real compromisso, que envolva programas de mudança de comportamento social, saúde, educação, civilidade. Não dá mais para empresas existirem simplesmente pelo lucro.”




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