Economia Titulo Mudanças
Leis trabalhistas podem
sofrer mais alterações

Em 2019, Bolsonaro pretende tornar mais flexíveis os direitos para aproximá-los da informalidade

Caio Prates
do Portal Previdência Total
24/12/2018 | 07:30
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Marcello Casal Jr/Agência Brasil


As relações de trabalho no Brasil estão em transformação acelerada, principalmente após a aprovação da reforma trabalhista, que completou um ano no dia 11 de novembro. Trabalho intermitente, terceirização ampla, novas regras para o home office ou teletrabalho e a flexibilização de série de regras da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) impactarão diretamente no cotidiano de profissionais e empresas. E novas mudanças podem acontecer no futuro breve, pois o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) já sinalizou que pretende tornar mais flexíveis os direitos e as leis trabalhistas para aproximá-las da informalidade.

Bolsonaro defendeu, recentemente, que o artigo 7º da Constituição Federal “está engessado” e que “é muito difícil ser patrão no Brasil”. Ele também já tinha defendido um “aprofundamento” da reforma trabalhista em seu governo, com medidas mais favoráveis aos empregadores para estimular novas contratações.

Segundo especialistas e acadêmicos, o posicionamento de Bolsonaro deve ser tendência que, por um lado, ameaça os trabalhadores, mas que, por outro, faz parte de um processo de modernização das leis trabalhistas no País.

Os direitos sociais constitucionais previstos nos artigos 6º e 7º da Constituição Federal, de acordo com a advogada Denise Arantes, sócia do escritório Mauro Menezes & Advogados, são cláusulas pétreas, que não podem ser modificadas, pois configuram o núcleo intangível do texto constitucional. O artigo 7º trata dos direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, como férias, 13º salário, descanso semanal remunerado, licença-maternidade, seguro-desemprego e FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).

“Esses direitos não podem ser objeto de emenda constitucional, como já decidiu o STF (Supremo Tribunal Federal). Assim, os direitos sociais, em toda a sua extensão, abrangendo, inclusive, os direitos dos trabalhadores, expressam a opção do legislador constituinte em instituir Estado Democrático de Direito, pautado na promoção e efetivação dos valores sociais e individuais, à luz do princípio da dignidade da pessoa humana”, explica a especialista.

O advogado Anderson Santos da Cunha, do Stuchi Advogados, também defende que, além de ser cláusula pétrea, a alteração do artigo 7º da Constituição afronta o princípio constitucional que veda o retrocesso de avanços sociais. “São alguns desses direitos: proteção de emprego contra a dispensa arbitrária, FGTS e seguro-desemprego, salário mínimo, irredutibilidade do salário, 13º salário, adicional noturno, horas extras, férias anuais, licença à gestante e à paternidade, aviso prévio, adicional de insalubridade e periculosidade, entre outros”, elenca Cunha.

CARTEIRA VERDE-AMARELA
Em seu programa de governo, Bolsonaro também propôs a criação de nova carteira trabalhista, a chamada carteira de trabalho verde e amarela, que seria voluntária e destinada aos novos trabalhadores. A proposta prevê que todo jovem que viesse a ingressar no mercado de trabalho poderia optar entre vínculo de emprego baseado no atual ordenamento jurídico ou no novo modelo, no qual o contrato individual de trabalho prevaleceria sobre a CLT, mantendo-se apenas os direitos constitucionais.

Os especialistas divergem sobre a legalidade da nova carteira e o real impacto na geração de empregos no País. “Por enquanto, não existem muitos detalhes, mas durante a campanha, o que foi dito é que seria uma alternativa à carteira de trabalho clássica, de cor azul, com foco nos jovens que ingressam no mercado de trabalho”, aponta o advogado especialista em Direito e Processo do Trabalho, Danilo Pieri Pereira, sócio do Baraldi Mélega Advogados.

Ele completa que, segundo especulações de campanha, o jovem, ao ingressar no mercado formal de trabalho, poderia optar pela Carteira Verde e Amarela, com maior versatilidade em direitos e obrigações, podendo negociar mais livremente as cláusulas dos contratos de trabalho, com a garantia de direitos mínimos previstos na Constituição. “O objetivo seria a menor incidência de encargos trabalhistas, de forma a reduzir o desemprego entre os mais jovens”, explica.

Para Denise, a suposta criação de nova modalidade de carteira de trabalho não tem o condão de revogar direitos trabalhistas. “A revogação de direitos previstos em lei, no caso da CLT, só é possível mediante processo legislativo no âmbito do Congresso Nacional, como aconteceu no caso da reforma trabalhista”, diz.

Para Cunha, a carteira verde amarela representaria ao jovem trabalhador uma alternativa entre ter emprego ou ter direitos trabalhistas. “É uma opção muito prejudicial para as relações de trabalho, pois visa tão somente regular o emprego informal e precário, sem direitos, além de criar evidente discriminação no ambiente laboral, onde em uma mesma empresa haveria empregados com direitos trabalhistas diferenciados”, avalia. “A política sinalizada pelo novo governo deixa evidente que é muito difícil ser empregado no Brasil, pois a todo instante tem seus direitos ameaçados e desrespeitados”, complementa.

Reforma não alcança objetivo principal, dizem especialistas

A reforma trabalhista não alcançou seu objetivo principal, que era o aumento no número de criação de empregos em 2018. Para a economista e coordenadora de pesquisas e tecnologia do Dieese, Patrícia Pelatieri, além de não crescer substancialmente o número de empregos, a reforma provocou o fenômeno da substituição de postos de trabalho. “Estamos vendo que a flexibilização não gerou empregos, houve uma substituição de postos mais protegidos e mais bem remunerados por empregos mais frágeis.”

Denise Arantes reforça que a flexibilização de direitos não acarreta geração de empregos. “É uma falácia. O que gera empregos é o desenvolvimento econômico que, em um País como o nosso, em que as desigualdades sociais são gritantes, deve vir atrelado a efetivas políticas de desenvolvimento social. A drástica redução de direitos e a precarização do trabalho promovida pela reforma apenas ampliaram essas desigualdades.”

Danilo Pieri diz que a flexibilização é positiva. “É muito importante que as normas trabalhistas sejam modernizadas a fim de abarcar evoluções nas relações sociais entre patrões e empregados. Vivemos na era da informática de ponta, com regras trabalhistas voltadas para as máquinas de escrever. Não há mais sentido nisso. O corporativismo da Era Vargas falhou e a sociedade anseia por evolução na mentalidade que una empresas e trabalhadores em prol de um bem comum em vez de colocá-los como antagonistas”, aponta.
 




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