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Oração, para quê?

O avassalador desenvolvimento tecnológico ocorrido nos últimos 40 anos está elevando o ser humano

Por Dom Pedro Cipollini
20/03/2017 | 07:06
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O avassalador desenvolvimento tecnológico ocorrido nos últimos 40 anos está elevando o ser humano a uma categoria de quase onipotência. Por meio da técnica, o ser humano multiplica sua presença, nas videoconferências, nos diagnósticos precisos na área da Saúde, no perscrutar o universo e no alterar o ritmo da natureza, isso entre tantas outras façanhas que envolvem o auxílio de inúmeras e novas máquinas inteligentes.

Diante desse quadro, pode-se perguntar pela necessidade da fé em Deus, o que equivale a perguntar sobre o valor da oração, pois somente reza quem tem fé. Com tanto poder em suas mãos, o ser humano é tentado a se esquecer de Deus ou a substituir o próprio Deus em sua vida, sendo Deus para si mesmo. Mas lá no seu íntimo o homem percebe que permanece o lugar secreto onde mora o próprio Deus, pois o homem é criado à imagem e à semelhança de Deus. Criado para ser semelhante a Deus. O problema – na verdade, o conflito – surge quando quer ser semelhante a Deus sem Deus.

A Palavra de Deus ensina que Deus é criador e amigo do ser humano. Tem satisfação em entrar em contato com ele (Gn 3,8-9). Deus associa o homem à criação, fazendo dele o guardião da natureza. E ao se assombrar diante da natureza e mesmo das suas próprias capacidades, o ser humano carrega em si, neste assombro, um elemento positivo de oração.

A oração é dirigir-se a Deus, que sabemos que nos ama, e falar com Ele na simplicidade. Jesus recomenda: “Importa orar sempre e não cessar de o fazer” (Lc 18,1). Jesus reza sempre e ensinou a belíssima oração do Pai Nosso. É preciso orar não só para pedir, mas para demonstrar amor por Deus. Até Ele não chegarão palavras desprovidas de sentimento. Orar é necessário para que sintonizemos nossa vontade com a de Deus. Vontade que é a fonte de todo o bem.

O Brasil no alvorecer da República estava dominado pelo pensamento positivista que via a religião como fruto da ignorância. Pois bem. Nesse período um dos brasileiros que mais se sobressaíram pela inteligência escreveu: “Oração e trabalho são os recursos mais poderosos na criação moral do homem. A oração é o íntimo sublimar-se da alma pelo contato com Deus. O trabalho é o inteirar, o desenvolver, o apurar das energias do corpo e do espírito, mediante a ação contínua sobre si mesmo e sobre o mundo onde labutamos” (Rui Barbosa).

A Bíblia dá-nos exemplos significativos de oração, tanto pública como privada, sendo os Salmos o exemplo mais universal. Neles estão espelhadas orações de súplica, louvor, arrependimento, petição, orações que Jesus levará à perfeição. É possível orar sempre, até em um mercado ou passeio solitário, no seu trabalho, comprando ou vendendo, ou mesmo cozinhando. Esta é a opinião de muitos santos.

À pergunta que dá título a este texto respondo com a surpreendente conversa de dois personagens do inigualável romance de Guimarães Rosa: “O que mais penso, texto e explico: todo o mundo é louco. O senhor, eu, nós, as pessoas todas. Por isso é que se carece principalmente de religião: para se desendoidecer, desdoidar. Reza é que sara da loucura. No geral. Isso é que é a salvação da alma...” (Grande Sertão: Veredas p.8).

Que nesta quaresma possamos percorrer o caminho da oração. 




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