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Memorialista precoce dedica livros a famílias de S.Bernardo
Por Ângela Corrêa
Do Diário do Grande ABC
13/03/2005 | 17:36
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Maria Servidei Demarchi, Peri Ronchetti, Luiz Pequini, Ângelo Duzzi, José Versolatto e Ângelo Battistini. Quem anda por São Bernardo certamente já está familiarizado com esses nomes, espalhados por placas de ruas. Pois foi inspirado nos sobrenomes impressos nas placas, a maioria italianíssimos, que o estudante Fábio Silva Gomes, 17 anos, filho de cearenses e morador do Jardim Farina, foi atrás da história viva por trás desses sobrenomes tradicionais de sua cidade. O resultado já são três volumes escritos do livro Origem das Famílias de São Bernardo do Campo, dos quais apenas um foi lançado, em 2002.

“Quando comecei a freqüentar a escola, percebi que grande parte dos meus professores tinham sobrenomes iguais aos das ruas pelas quais eu passava no Centro. Quando tinha 12 anos, fiquei muito interessado e decidi ver quantas pessoas com aqueles sobrenomes moravam por aqui”, conta o garoto, com impressionante maturidade para seu fim de adolescência. E para conseguir ter acesso a essas famílias, Fábio lançou mão de um dos mais eficientes e antiquados métodos: a lista telefônica. “Eu chegava da escola à tarde e ficava procurando os possíveis entrevistados por família”, diz.

Na época, ele tinha apenas 12 anos e o primeiro desafio era convencer o interlocutor, com uma rápida conversa, de que o telefonema não era simples trote de criança. “As pessoas ficavam até com medo de falar comigo, duvidavam que a intenção era escrever a história das famílias. Foi muito complicado”, relembra, quase adulto em seu traje composto por camisa bem passada e calça social. A primeira a lhe dar o voto de confiança foi Ludia Flordalice Demarchi Battistini, oitava filha do casal Matteo Demarchi e Maria Servidei, casada com um representante da família Battistini. “Ela me recebeu em sua casa, junto com a filha, muito contente em poder me contar a história da família, mostrar fotos e tudo mais”, diz o jovem escritor.

E foi justamente o depoimento de dona Alice, hoje com 96 anos, que lhe abriu as portas do mundo dos descendentes daqueles que emprestaram seus nomes para as placas de rua. “As vizinhas dela ficaram sabendo e me deram entrevista também. A partir daí, tudo ficou bem mais fácil”, conta. “Foi muito gratificante fazer esse trabalho. E dessa forma eu escrevi também um pouquinho da história de São Bernardo. O legal é que tenho contato com pessoas mais velhas, que querem contar a história de verdade, que desejam conversar”, afirma.

Ao fim de dois anos, ele já tinha fechado 58 biografias das famílias em São Bernardo. Bancado por “paitrocínio” e por alguns comerciantes do bairro que publicaram anúncios na edição, o livro foi finalmente lançado pela editora Edicon. Após mais três anos de trabalho, o caçula de quatro irmãos produziu mais 86 biografias, que já estão em fase de revisão e produção, mas que ainda carecem de patrocínio para ganharem as livrarias.

A produção literária do garoto começou bem cedo. Em 2000, teve publicados os livros Um Sonho, de crônicas, e a peça A Neve e a Rosa Vermelha, que escreveu enquanto fazia parte do grupo de teatro do Emia Aron Feldman, em Santo André. O pai, Francisco, conseguiu patrocínio na empresa onde trabalhava e colocou dinheiro do próprio bolso para viabilizar o projeto. “Meu filho é muito inteligente, temos muito orgulho dele e sempre procuramos ajudar”, conta. Escreveu ainda mais três livros: Hino D‘América, Sem Limites para Sonhar e Cântico Celeste, lançados em 2001. A produção em série começou ainda na infância. “Comecei a ler aos 5 anos. Lia tudo que caía na minha mão, revistas e jornais que ficavam na minha casa sem que ninguém mexesse”. Segundo ele, o primeiro livro inteiro que leu foi Memória Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, livro que consta na lista dos principais vestibulares do país.

O detalhe é que o menino leu o clássico aos 7 anos. “É um livro difícil, mas foi um bom começo. Gosto muito de literatura brasileira”, conta ele, que para bancar o vício da leitura vive de empréstimos de biblioteca e de ler livros disponíveis na internet. Mas não é só à prosa que ele se dedica. No ano passado, ganhou dois troféus pela participação com duas poesias no Premio Internazionale ‘Il Convivio’, realizado anualmente na Itália.

E por conta de tanta experiência no mundo das letras, o discurso adolescente inexiste. Não há um pingo de gíria em suas frases, pronunciadas como orador de turma. Apenas a postura de menino denuncia os 17 anos por baixo do traje social. “Gosto de ouvir MPB e música clássica, mas minha grande atividade é a leitura mesmo”, conta. Com bolsa parcial do Colégio Viva Vida, ele prestará vestibular no fim do ano. “Quero ser jornalista, acho interessante esse contato com as pessoas e ainda as pesquisas que vou poder fazer”, afirma. Se tudo correr como planejado, Fábio é candidato a integrar o rol de memorialistas da região para aprimorar ainda mais seu trabalho de guardião da história do Grande ABC.



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