Voar pelos céus brasileiros exige conhecimento teórico e muita prática. A pressão lá em cima, dizem os pilotos, é tremenda. “Estamos sempre no limite”, confidencia o piloto aposentado Luiz Henrique de Bessa, 70 anos.
Ele ainda se lembra das aulas teóricas de piloto privado no Aeroclube de São Paulo, em 1955. Era o primeiro passo de uma carreira que durou 27 anos. “Na minha época não era fácil e hoje está mais difícil.”
Antes de ocupar o cargo de comandante – o posto mais alto dentro de uma aeronave – o profissional precisa de habilitações de piloto privado e comercial. “Ser piloto privado é a primeira etapa para qualquer interessado em aviação”, explica Klaus Schween, coordenador da escola de Aviação Wings, que fica ao lado do aeroporto de Congonhas, cenário do acidente com o avião da TAM.
São 270 horas de aula teórica e, no mínimo, 40 horas de vôo antes da prova. Entre as cinco disciplinas cursadas, estão regulamento de tráfego aéreo e conhecimentos técnicos de aviação.
CARREIRAO conteúdo é complicado para um iniciante e a prova, elaborada pela ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), exige sete como nota mínima. No ar, o teste é ainda mais difícil. Vale de zero a cinco e só recebe a habilitação quem tirar quatro ou mais.
“Na prova prática, o piloto tem de mostrar conhecimento, técnica e habilidade. Enquanto está no comando da nave tem que responder perguntas difíceis e saber sair de situações adversas”, explica Schween.
Aos 18 anos, Luiz Henrique Bessa obteve a melhor classificação na turma de piloto privado. Ganhou a habilitação para conduzir aviões monomotores e o prêmio de 200 horas de vôo gratuitas, usadas por ele durante o curso de piloto comercial.
Hoje, o valor de uma hora de vôo em um avião monomotor não sai por menos de R$ 200.
SONHONathália Cohen, 19 anos, conhece bem os termos técnicos da aviação civil. Por diversas vezes acompanhou de perto o trabalho do pai. “Eu sempre viajei na cabine enquanto meu pai pilotava, mas só agora decidi seguir a mesma profissão”, conta.
Para isso, ela assiste com dedicação às aulas teóricas de aviação. “Vou ser comandante. Meu pai já me disse que é muito difícil, mas me apóia.”
O curso de piloto comercial segue os mesmos moldes do de privado. “É claro que o número de disciplinas aumenta e fica tudo mais complicado”, afirma o coordenador da escola Wings.
As aeronaves, nesta categoria, são mais complexas e o vôo passa a ser com instrumentos, ou seja, não é preciso visibilidade para pilotar. O curso teórico tem 320 horas e, na prática, é preciso no mínimo 150 horas de vôo.
COMEÇOAno de 1958. Aos 21 anos, Luiz Henrique de Bessa ingressou na Vasp. Lá fez um treinamento de seis meses para poder pilotar o avião DC3, com capacidade para 28 pessoas.
A exigência mínima para a vaga era que o piloto tivesse 1,5 mil horas de vôo como piloto comercial. Essa é a mesma exigência da TAM hoje.
Dentro da companhia, o piloto faz cursos específicos para pilotar cada aeronave. Começa com uma mais simples e de menor porte e vai evoluindo, de acordo com a experiência.
“O DC3 era completamente diferente dos aviões que eu já tinha pilotado”. lembra Bessa. “Quando eu coloquei o fone de ouvido na orelha, eu pensei: acabou minha carreira, eu não entendo nada o que dizem”, relata, sobre como o sistema de comunicação era precário.
Com o tempo, se acostumou. O último vôo do comandante da Vasp foi a bordo de uma aeronave A-300, com capacidade para 252 pessoas.
PRESSÃO“A gente lida com outras vidas. Tem que ficar ligado 100% do tempo, da decolagem ao pouso”. Na época, ele afirma que os pilotos tinham mais autonomia durante o vôo e que não eram pressionados. “A gente decidia a rota e se ia pousar ou não. Se eu achasse que estava chovendo muito e a pista poderia estar lisa eu não aterrizava e pronto.”
Além disso, ele salienta que os pilotos constantemente passam por reciclagens. “Temos que estudar sempre.” Hoje, a situação mudou e Bessa tem certeza que os pilotos sofrem muito mais.
“Há muitos interesses comerciais envolvidos e o dinheiro no Brasil sempre foi muito mal empregado”, resume, ao referir-se à falta de investimento em tecnologia e segurança dos aeroportos.Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.