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Barão de Mauá: mais do mesmo

Moradores de residencial, cenário de tragédia
em 2001, seguem à espera de solução

Por Vanessa de Oliveira
05/02/2017 | 07:05
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Banco de Dados


Já passaram pouco mais de 15 anos – aliás, em agosto, serão completados 16 anos –, muitas famílias se mudaram dali, outras ocuparam os mesmos apartamentos, mas o que não sofreu alterações é o sentimento de medo que atormenta as cerca de 5.000 pessoas que moram no Condomínio Barão de Mauá, no Parque São Vicente, em Mauá. E o temor é mais do que justificado, quando em agosto de 2001 descobriu-se que a área onde foram erguidas 11 torres estava contaminada com 44 substâncias químicas tóxicas, inclusive gases explosivos. Além de estarem assentados praticamente sobre uma bomba, os moradores correm o risco de contraírem doenças respiratórias ou outras moléstias, mas a situação tem também outro ingrediente que é verdadeira espada na cabeça de toda essa população: o fato de não terem a documentação dos imóveis não lhes dá o direito de vender ou envolver o apartamento em uma troca por outro imóvel.

“Se a gente falar que não tem medo de continuar aqui, está mentindo”, fala a dona de casa Diva Aparecida Sartori, 56, que mora no condomínio desde o ano da tragédia.

A preocupação que acompanha a desempregada Ana Paula de Aquino Fiorante, 40, é a de “morar em cima de uma bomba”. “Esperamos que a justiça seja feita, que a gente receba os danos morais e que o imóvel tenha seu valor novamente.”

A área traz insegurança e marcas até para quem não vive lá. No caso do autônomo Marcus Vinicius Lazari Ferreira, 37, as marcas são na pele. Ele teve 25% do corpo queimado quando trabalhava na manutenção na bomba da caixa-d’água que explodiu e vitimou fatalmente o patrão, Geraldo Riviello, 37. 

“Fiquei 40 dias internado, peguei infecção hospitalar, fiz 14 cirurgias reparadoras e estéticas e levei um ano para voltar a mover os braços”, recorda Ferreira. 

Reconstruir a trajetória foi caminho árduo. Por conta das cicatrizes que carrega no rosto, braços e parte do pescoço, oportunidades de emprego lhe foram negadas. “Não me aceitavam por causa da minha aparência”, recorda. 

O sonho de cursar a universidade também teve de ser protelado. No fim do ano, ele se forma como tecnólogo de Mecânica Automobilística. No entanto, o adiamento por conta do ocorrido lhe fez, em sua visão, perder a melhor fase para a entrada no mercado de trabalho. “Eu não atuo mais com carteira assinada porque o mercado tem emersão de trabalhadores novos e gente com 40 anos sendo mandada embora.”

Já as marcas trazidas pela comerciante Maria Francesca Santaella Gigliotti Riviello, 48 são na alma. Ela perdeu o marido Geraldo Riviello, companheiro de trabalho, pai amoroso dos dois filhos que, na época, tinham 3 e 10 anos. “Foi difícil perder o apoio da pessoa que eu mais amava, que era meu porto seguro e tocar a vida com os filhos e o lado financeiro destruído”, conta. 

O amparo da família e os filhos foram o que lhe deram forças para seguir, porque nem ela, nem Ferreira, nunca receberam nenhum tipo de assistência das empresas envolvidas. Os processos com pedido de indenização tramitam na base dos recursos. “Mas o meu principal valor, meu marido, não está mais aqui”, conclui.

Recuperação da área, iniciada em 2014, segue de forma morosa

O primeiro de dois ciclos do plano de remediação do Condomínio Residencial Barão de Mauá, apresentado pelas rés no caso – Cofap, Administradora e Construtora Soma, SQG Empreendimentos e Construções e Paulicoop –, o Ministério Público e a Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), foi iniciado em 2014 e deveria ter sido finalizado em abril de 2016. Porém, continuam em andamento. 

“A Fase 1 da remediação está em andamento. A conclusão das intervenções deverá ocorrer até o fim deste ano”, diz a Cetesb. A companhia informa ainda que a construção dos prédios que acomodariam provisoriamente moradores dos andares térreos de 11 blocos do condomínio, ainda não foi iniciada. 

Segundo a Cofap, dentre as ações já feitas, foi realizada a remoção de solo em duas das cinco áreas previstas no Plano. A empresa ressalta que não é parte no processo que envolve as vítimas da explosão e que promove reuniões periódicas com os síndicos para explicar o andamento das obras.

O Diário procurou a Soma para comentar sua atuação no processo, mas os advogados empresa disseram que não seria possível prestar as informações solicitadas no prazo pedido pela reportagem “dada a complexidade do caso”. As demais empresas não foram localizadas. O Ministério Público também declarou que não consegueria retornar à tempo. 

Tanta demora para solucionar a questão faz com que outro sentimento dos moradores seja a descrença. “Nossas esperanças sumiram no horizonte. Somos seres humanos, deveríamos ser prioridade nesse processo”, lamenta o presidente da Comissão dos Moradores do Residencial Barão de Mauá, Lindomar Alvins, 48 anos. 




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