Cultura & Lazer Titulo
Filha de Ari Barroso quer montar Museu do Músico
Por Do Diário do Grande ABC
25/08/1999 | 15:01
Compartilhar notícia


A filha do compositor e radialista Ari Barroso, Mariuza Barroso Salomao, pode nao ter herdado dele o talento musical, mas aprendeu com ele a ter idéias arrojadas. De posse do arquivo do pai, com discos, partituras, troféus, fotos e até alguns desenhos originais do Zé Carioca, de Walt Disney, ela quer transformar esse material no acervo inicial do Museu do Músico. E já escolheu o imóvel que o abrigaria, a antiga Casa da Moeda, na Praça da República, centro do Rio.

A instituiçao ainda nao existe, mas ela idealiza o local como um centro cultural e uma casa em que músicos possam encontrar-se, fazer pesquisas e mostrar seus trabalhos. E Mariuza pensa em reunir lá, além do arquivo de Ari Barroso, os de outros compositores, como Tom Jobim e Pixinguinha, e de pesquisadores de música popular brasileira, hoje espalhados em várias instituiçoes ou com os herdeiros deles. "Seria um centro de memória da nossa música", sonha Mariuza. "Entrei em contato com várias pessoas do meio e todas acham a idéia boa."

Idéia antiga - Mariuza pensa nesse museu há quase 50 anos, desde sua primeira viagem à Europa, aos 14 anos, quando visitou, o Museu Verdi, em Roma. "Fiquei encantada ao ver que a Itália se preocupou em preservar a memória do compositor, colocando à disposiçao de outros músicos, de estudiosos e do público em geral tudo que havia a respeito dele", conta ela. "Desde entao comecei a juntar coisas de meu pai, com essa intençao."

Produtor cultural - Nao foi fácil. Além de compor "Aquarela do Brasil", "Na Baixa do Sapateiro", "Risque", "Na Batucada da Vida" e pelo menos uma centena de clássicos, Ari Barroso foi também um radialista (lançou em seu programa Calouros em Desfile, na Rádio Tupi, cantoras como Elza Soares e as irmas Batista e criou um estilo de locuçao esportiva), jornalista (foi editor de Esportes de O Jornal, dos Diários Associados) e produtor cultural, quando essa profissao nem existia. Criava shows e trilhas para filme, (até mesmo para "Você já foi à Bahia?", de Walt Disney), foi um dos responsáveis pela projeçao de Carmem Miranda nos Estados Unidos e levou nossa música para lá, muito antes da Bossa Nova.

"Ele nunca se preocupou em guardar nem um bilhete, uma matéria de jornal ou partituras que escrevia, porque as mandava para os arranjadores e depois se esquecia de pedir de volta", conta Mariuza. Nem a partitura original de "Aquarela do Brasil" existe mais por esse motivo. "Mesmo depois que eu passei a guardar seu material, tivemos brigas enormes porque ele ia no arquivo, tirava papéis e eu ficava chateada porque sabia que iam se perder."

Preciosidades - Mesmo assim Mariuza conseguiu juntar em seu apartamento muitas lembranças e documentos importantes. Num grupo de quadros perto do piano em que Ari trabalhava, ela tem desenhos originais de Walt Disney, para o filme "Você já foi à Bahia?", até mesmo um esboço a lápis do Zé Carioca, assinado pelo próprio Disney. Ela guarda também uma série de caricaturas do pai, a primeira ediçao de partituras antigas de músicas e até um raro disco de 10 polegadas (aqueles antigos, com três músicas de cada lado), em que o compositor interpreta as próprias músicas ao piano.

"Tenho também cartas, troféus e comendas com as quais ele foi homenageado e nao queria, de forma alguma, desmembrar esse acervo", explica Mariuza, que já recusou a oferta da Biblioteca Nacional para cuidar do material em papel e do Museu da Imagem e do Som (MIS), que ela acha muito pequeno. "Havia muito mais, mas de vez em quando fico desanimada e me desfaço de alguma coisa, porque se eu guardar tudo, este apartamento nao será minha casa e sim a dele."

Por motivos afetivos, ela nao mexe na correspondência que os pais trocaram durante toda a vida, especialmente nos longos períodos que Ari Barroso trabalhou nos Estados Unidos. "Seria como desrespeitar um sentimento que era só deles", justifica Mariuza. "Aliás, sempre que começo a mexer com as coisas de papai tenho de parar porque me emociono demais e, além disso, nao sou especialista." É por isso que ela gostaria de ver o acervo aberto para quem quisesse consultar e ouvir de novo as músicas de Ari Barroso. A antiga Casa da Moeda pertence atualmente ao Arquivo Nacional, que a restaura por meio da Lei Rouanet e com assessoria técnica do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Segundo o chefe da Divisao Técnica do Iphan, Theodoro Joels, é improvável que o imóvel, dois prédios de dois andares, onde ficavam a administraçao e a fundiçao das moedas, tenha o destino desejado por Mariuza. "O Arquivo Nacional já iniciou as reformas para criar um centro cultural no prédio da frente e seus depósitos de arquivos no de trás", explica Joels. "Foi esta a destinaçao dada ao imóvel no pedido para restauraçao aprovado pelo Programa Nacional de Ajuda à Cultura (Pronac)."

Alternativas - Mas Joels acha a idéia do museu ou casa do músico excelente "porque Ari Barroso, apesar de nascido em Minas, foi um grande carioca". Conhecedor profundo das construçoes antigas espalhadas pelo Rio, públicas ou particulares, tombadas ou nao, dá dicas a Mariuza. "Se ela encontrar um imóvel tombado, pode obter financiamento para restaurá-lo e, sendo a finalidade usá-lo para museu, conseguirá mais recursos ainda", diz ele. "É só se informar direitinho."

Ele tem até uma sugestao de local. "A Praça Tiradentes, no centro do Rio, vai ser restaurada com o financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e um dos prédios tombados, o antigo Detran, nao tem destinaçao ainda", lembra Joels. "Seria um excelente local, até porque era lá que os músicos se encontravam para buscar trabalho até meados dos anos 60."




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;