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Saramago afiado

Autor está na Capital para divulgar exposição, que abre na próxima sexta-feira, às 20h, para convidados

Por Dojival Filho
Do Diário do Grande ABC
26/11/2008 | 07:00
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Nem mesmo a ameaça da morte, provocada por um quadro de insuficiência respiratória que o manteve internado em janeiro último, tirou do escritor português José Saramago o senso crítico, a serenidade e o humor refinado. "Não sou um pessimista, o mundo é que é péssimo", resumiu o vencedor do Prêmio Nobel de 1998, em entrevista concedida ontem à tarde no Consulado de Portugal em São Paulo.

O autor está na Capital para divulgar a exposição José Saramago: A Consistência dos Sonhos, que abre na próxima sexta-feira, às 20h, para convidados - com a presença do próprio - no Instituto Tomie Ohtake (tel.: 2245-1900), em São Paulo. O público poderá conferir a mostra a partir de sábado e até 15 de fevereiro, de terça a domingo, das 11h às 20h. A entrada é franca.

O evento reúne cerca de 500 documentos digitalizados e que contam com recursos audiovisuais, entre poesias inéditas, manuscritos, primeiras edições, fotografias e vídeos, que traçam um perfil da vida literária do homenageado. No bate-papo com os repórteres, o escritor, de 86 anos, falou sobre política, literatura, conceitos filosóficos e seu processo de recuperação.

"Foi uma doença que valeu mais que toda obra do Paulo Coelho. Não precisamos mais ler os livros dele", afirmou, em tom irônico, ao ser perguntado sobre o período em que passou no hospital.

A verve sarcástica do lusitano não poupou os jornalistas. Instado a comentar uma declaração recente, em que dizia considerar as entrevistas como ‘caldo requentado', ele não titubeou e provocou gargalhadas entre os presentes. "Em parte, a culpa é vossa. Como fazem sempre as mesmas perguntas, compreendo que se repitam as respostas."

A geração de maio de 1968 ganhou alfinetadas de Saramago. "Nós devemos muito a maio de 1968. Muitas coisas velhas caíram e outras novas surgiram. Mas acredito que o slogan É proibido Proibir deve ter contribuído, de alguma forma, para a crise de autoridade a que chegamos."

O autor de Ensaio Sobre a Cegueira, livro transposto para as telas este ano pelo diretor Fernando Meirelles, em versão elogiada pelo escritor, criticou ainda os neoliberais. "Essa gente vivia dizendo que o Estado era o inimigo, que quanto mais longe ele estivesse seria melhor.Agora, é o Estado que vai salvar o Citibank. Seria cômico, se não fosse trágico."

Saramago mencionou o constante desrespeito dos governos à Declaração Universal dos Direitos Humanos, que completará 60 anos no próximo dia 10.

"Os direitos humanos não existem, estão apenas em um papel e não são cumpridos em nenhuma parte. As populações não sabem sequer o que está escrito. A grande causa que deveria mobilizar toda a gente é a reivindicação dos direitos humanos."

A Viagem do Elefante - A visita de Saramago também se deve ao lançamento do livro A Viagem do Elefante, seu primeiro trabalho após o relato autobiográfico Pequenas Memórias (2006). A obra narra a insólita e divertida viagem de um elefante chamado Salomão, que, no século 16, foi oferecido pelo então rei de Portugal e Algarves, Dom João 3º ao arquiduque austríaco Maximiliano 2º. "Cheguei a dizer que provavelmente não teria tempo de terminar o livro. Antes de o meu estado de saúde agravar, já tinha escrito 40 páginas e, dois dias depois de chegar do hospital, já tinha recomeçado a trabalhar. As páginas foram escritas de modo risonho e não se nota qualquer vestígio do que tive de viver com essa doença."




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