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Há exatos 100 anos, era editada 'O Mystério', 1ª história policial do País
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20/03/2020 | 07:00
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Tudo começou em um sábado, dia 20 de março de 1920. O jornal carioca A Folha, hoje extinto, publicou o primeiro capítulo de um romance, O Mystério, que se tornaria histórico. Afinal, com a divulgação de seu epílogo, no dia 20 de maio, estava também encerrada a primeira trama policial da literatura brasileira. E foi um sucesso, pois, no mesmo ano, quando publicada em livro, a história conseguiu três edições.

"O mistério começava mesmo pela autoria do enredo", comenta Tito Prates, um dentista e administrador de empresas que, de tão apaixonado por histórias policiais, tornou-se especialista nesse gênero - especialmente na obra de Agatha Christie. "Logo no início da publicação, que era diária, o leitor sabia que os capítulos eram assinados alternadamente por Coelho Neto, Afrânio Peixoto, Viriato Corrêa e um quarto autor identificado apenas como '&'. Logo se descobriu que se tratava de Medeiros e Albuquerque, que também era proprietário do jornal."

Aos leitores da época, foi oferecido o convite para acompanhar dois desafios - primeiro, o da própria trama policial e seu mistério habitual; o segundo era acompanhar como cada um dos quatro autores se desdobravam para escrever seu capítulo. É que nenhum deles sabia o teor da escrita do outro. "Com isso, Coelho Neto, por exemplo, só dava prosseguimento à história depois de ler, no próprio jornal impresso, o que seu antecessor produziu", conta Prates.

Segundo o historiador, que preside a Associação Brasileira dos Escritores de Romance Policial, Suspense e Terror, os quatro autores de O Mystério deram características distintas ao romance. "Enquanto Afrânio era mais poético, Coelho Neto puxava mais para o humor. Aliás, esse é um detalhe importante porque o cômico predomina em muitas passagens da história."

De fato, para exemplificar, basta selecionar uma das últimas frases, escrita por Afrânio Peixoto: "Nos crimes, só lucram a Polícia e a Justiça. Se os criminosos soubessem..."

É justamente o tom jocoso que torna O Mystério muito peculiar, pois, apesar de a trama começar com um crime, já despertando uma investigação, os passos seguintes apostam mais no humor ao ressaltar os infortúnios sofridos pela polícia do Rio de Janeiro. O enredo acompanha a trajetória de um jovem pobre, Pedro Albergaria, que tem um incontrolável desejo de vingança de um banqueiro, Sanchez Lobo. O motivo é nebuloso - sabe-se apenas que, no passado, houve algum atrito entre eles.

"É um romance híbrido, pois conversa com o mistério típico do policial inglês, tem pitadas de humor e ainda há um romance, cujo desfecho é mais espetacular que a própria resolução do crime", observa Tito Prates. A trama é mirabolante, especialmente quando o jovem Pedro, leitor voraz de obras policiais, arquiteta o que considera um perfeito plano de vingança sem ser descoberto.

O que o rapaz não espera é ter de se deparar com figuras únicas, como o detetive Mello Bandeira, um major conhecido por "O Sherlock da Cidade", pois se baseia nos métodos dedutivos do personagem criado por Conan Doyle. O humor aparece quando Bandeira é ridicularizado por se basear na ciência como base para a investigação.

Prates lembra que foi Monteiro Lobato quem primeiro editou a história em livro, tão logo encerrou a publicação em capítulos no jornal. E, apesar de estrondoso sucesso na época (ao final de 1928, já na terceira edição, totalizava dez mil cópias vendidas), o livro caiu no ostracismo para não mais ganhar uma nova edição. E continua sem editora porque um de seus autores, Viriato Corrêa, foi o último dos quatro autores a morrer, em 1967, não somando, portanto, o tempo mínimo (75 anos e um mês) para que uma obra caia no domínio público. "Também não deixou herdeiros, o que dificulta uma negociação", complementa Prates.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.




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