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Terreno nebuloso do WhatsApp

Paços usam ferramenta para divulgar ações, mas falta de regulamentação deixa aporte incerto

Raphael Rocha
Diário do Grande ABC
27/01/2019 | 07:00
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Administrações públicas do Grande ABC têm aproveitado a esteira do sucesso do uso do WhatsApp na eleição nacional para difundir informações aos moradores. As mensagens vão desde alertas de serviços públicos – como falta d'água ou possibilidade de enchente – até a ações do governo. Entretanto, o emprego de recurso público em um terreno ainda nebuloso faz com que a situação seja, no mínimo, incerta.

Isso porque, no Brasil, não há regulamentação sobre a utilização da ferramenta para esse fim. Essa brecha faz com que distorções sejam vistas, como a criação de empresas que coletam número de celular de clientes sem autorização e que disparam centenas de milhares de mensagens sem consentimento. A campanha do presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), foi acusada – e ainda é investigada – por dispor desse mecanismo para difundir atos positivos de Bolsonaro e também críticas ao PT, adversário eleitoral.

Sem legislação vigente, não é possível saber, por exemplo, o entendimento de conselheiros do TCE (Tribunal de Contas do Estado) sobre o uso de recursos públicos para esse tipo de comunicação. Nem ter ciência do que é informação institucional ou ação de governo, que pode, de alguma maneira, beneficiar o prefeito que utiliza o canal.

O WhatsApp tem buscado freios em seu próprio sistema após ser acusado de fechar os olhos para a propagação de fake news (notícias falsas) durante a eleição. Porém, enquanto a Lei Geral de Proteção de Dados não entrar em vigor, qualquer passo dado nessa seara parece ser no escuro. O ex-presidente Michel Temer (MDB) sancionou em agosto de 2018 a nova legislação, com regras mais específicas sobre o trabalho na internet, contudo, o texto só passará a valer, de fato, em fevereiro de 2020.

“Por enquanto, as empresas e os órgãos públicos pouco se atentaram às questões. Temos esse período de preparação e quase nada é feito. A Lei Geral de Proteção de Dados colocará série de obrigações sobre a coleta, o uso e a integridade dos dados pessoais, com aplicação de multas e sanções em caso de descumprimento dos artigos”, comentou o advogado Fernando Santiago, especialista no assunto e que trata sobre o caso no Brasil e também na Europa – atua junto à Commission Nationale de l’Informatique et des Libertés, órgão regulador francês que busca preservar informações pessoais na internet. Empresa pode ser multada em até 2% do faturamento ou até R$ 50 milhões por infração, pontuou o especialista.

Santiago distingue duas situações envolvendo as administrações municipais. A primeira é se a Prefeitura disponibiliza canal de contato e o morador opta, espontaneamente, por registrar o número para receber informações públicas. “Nesse caso, a relação me parece ser mais saudável, embora o uso desses dados tenham de ser preservados. Mas há necessidade de criar canal de interrupção do consentimento se o usuário assim desejar. E, claro, preservar os dados”. Outro caso é com relação ao disparo de mensagens sem anuência do munícipe, ainda mais se for para espalhar ações de governo. “Essa é uma relação mais complicada.”

No Grande ABC, duas prefeituras admitem uso do WhatsApp para comunicação com o morador: Santo André e Mauá. Ribeirão Pires declarou estudar a possibilidade de adotar o sistema. São Bernardo, Diadema e Rio Grande da Serra comentaram que não utilizam o serviço. São Caetano não respondeu aos questionamentos da equipe do Diário.

No caso de Santo André, a gestão de Paulo Serra (PSDB) disse que despende de R$ 0,10 a R$ 0,29 por mensagem, dependendo do teor, e que contratou duas empresas: a Via WhatsApp e a Levelclick Digital Performance. “A Prefeitura de Santo André entende a importância de utilizar os mais diversos meios para se comunicar com os munícipes e usa o WhatsApp como uma das ferramentas para levar informações aos moradores da cidade”, discorreu o Paço, ressaltando ter banco de cadastro para informações sobre merenda e Defesa Civil. “Foi implementado o WhatsApp Business, com criação de banco de dados e gerenciamento das informações, realizados por funcionários da Prefeitura. O Paço mantém esses dados sob sigilo e, como os próprios moradores que solicitam o envio, concordam com a utilização de seus números para o recebimento de mensagens.”

Em Mauá, a administração mantém contrato com a Iddéias Consulting Eireli para o serviço, com valor de R$ 68 mil ao mês. “Os custos estão contemplados dentro da implantação e operação da central de relacionamento, por atendimento global, implantada dentro da Prefeitura com 16 atendentes, dois supervisores, gerente e estações de suporte. O cadastramento é feito pelo tratamento de bases de dados e acionamento telefônico, todos os dados são sigilosos e protegidos conforme legislação, além disso, é oferecida a opção de não receber mensagens.”

As demais administrações da região declararam que a comunicação de ações de governo é feita, de forma voluntária, por secretários ou agentes públicos. “Por hábito próprio, o prefeito Orlando Morando (PSDB) interage por WhatsApp pessoal com moradores, em questionamentos sobre municípios, serviços”, citou a Prefeitura de São Bernardo. Em Ribeirão Pires, a gestão de Adler Kiko Teixeira (PSB) pontuou que “funcionários e moradores realizam compartilhamento de informações produzidas pela Secretaria de Comunicação de forma espontânea, inclusive pelo WhatsApp”. “Portanto, ação que não gera impacto financeiro ao município.”  




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