Setecidades Titulo Caso Tayná
‘Quero minha filha de
volta’, diz mãe de Tayná

Polícia investiga suposto erro médico em
menina que passou por 12 cirurgias em Mauá

Camila Galvez
Do Diário do Grande ABC
03/05/2014 | 07:00
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Marina Brandão/DGABC


A pequena Tayná Andrade da Silva, de vestido rosa, olha para a câmera com carinha de sapeca, levanta as perninhas, coloca a mão na boca. Quando a foto foi tirada, ela balbuciava as primeiras palavras: papai, mamãe, tata, dá. Mamava no peito. Seu sorriso enchia de luz a vida da dona de casa Madalena dos Santos Andrade Silva, 38, mãe de outros três filhos do primeiro casamento e moradora do Jardim Oratório, em Mauá. “Quero minha filha de volta.”

Após ser submetida a 12 cirurgias no Hospital América, da rede particular de Mauá, Tayná, 1 ano e 4 meses, é outra criança. Deixou de andar, não fala mais, não sorri, não abre os olhos nem as mãos e perdeu os movimentos. Em internação domiciliar, alimenta-se por sonda.

A mãe garante que a menina ficou assim após a realização da 11ª cirurgia para colocação de válvula a fim de conter os efeitos da hidrocefalia, consequência de meningite que a menina teve logo após o nascimento. “Minha filha nasceu no dia 13 de dezembro de 2012, prematura de 30 semanas. Foi para a UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do Hospital América, onde também fiz todo o pré-natal, porque estava com desconforto respiratório.”

Fora isso, Madalena afirma que a criança não tinha nada. “Ela era pequena, nasceu com 1,8 quilo. Mas se desenvolveu bem até completar 17 dias.” Foi então que a mãe ouviu dos enfermeiros que a filha estaria com meningite bacteriana. “Questionei os médicos, mas eles não confirmavam. Era arriscado para o hospital admitir que a bactéria tinha conseguido entrar ali”, opina Madalena. No atestado de alta da menina, 49 dias e uma cirurgia depois, consta meningite, seguida de um ponto de interrogação.

Como consequência, Tayná teve hidrocefalia, acúmulo de líquido que comprime o cérebro contra os ossos do crânio. Para minimizar as sequelas, foi submetida à primeira cirurgia para instalação de válvula que suga o líquido, chamado de liquor, em 24 de janeiro de 2013, o 41º dia na UTI. A partir daí, a vida da família mudou.

REJEIÇÃO

A válvula não foi bem aceita pelo organismo de Tayná, que formava cistos para combatê-la, obrigando a remoção. “Eles tentaram consertar o problema com uma cirurgia atrás da outra”, diz Madalena.

Foram 12 no total, incluindo o procedimento chamado de terceiroventriculostomia, técnica na qual se produz um orifício na parte inferior do cérebro para que o liquor saia. Nada, porém, solucionou o problema. “Usavam sempre a mesma marca de válvula, e a Tayná reagia do mesmo jeito.”

Desesperada, Madalena procurou uma alternativa após a filha ser submetida à décima cirurgia, no dia 10 de fevereiro. Achou no Google um bom neurologista da Capital e, mesmo sabendo que o dinheiro faria falta, pagou R$ 300 pela consulta. Ouviu do especialista que havia outras alternativas. “Ele disse que precisavam testar outra marca de válvula. Falou que ela poderia ter uma vida normal, pois, dividindo-se o cérebro em quatro partes, apenas uma delas havia sido afetada pela hidrocefalia.” Há relatos de pessoas com o problema que chegam a cursar o Ensino Superior, inclusive.

DESCONFIANÇA

A mãe começou a desconfiar que algo estava errado no hospital ao pedir que a marca da válvula fosse trocada. Segundo ela, houve negativa da equipe, que garantiu que o equipamento utilizado era “da melhor qualidade”. “Podia até ser, mas para a minha filha não funcionava.”

No dia 15 de março, com a cabeça inchada e vazando, Tayná voltou a ser internada no Hospital América para instalação de mais um dispositivo, da mesma marca da anterior.

Os dias foram passando e o liquor ia sendo sugado, mas continuava vazando por pontos ainda não cicatrizados na cabeça da criança. Conforme Madalena, no dia 30 de abril decidiram que a menina deveria receber um curativo para conter o vazamento. Eram 19h quando o procedimento foi solicitado. Até as 21h30, os enfermeiros não haviam aparecido.

A família chamou a polícia. “Quando a viatura chegou, os enfermeiros apareceram correndo. Não registrei o boletim de ocorrência, mas os policiais disseram que, qualquer problema, poderia chamá-los de novo.” Em vídeo feito no celular da mãe neste dia, Tayná aparece sentada na cama do hospital, brincando, movimentando os bracinhos e gargalhando.

No dia 31, com a válvula ainda sugando o liquor, Madalena começou a reparar que a moleira (parte de trás da cabeça) da filha estava afundada. “Perguntei aos enfermeiros e ao médico, mas ninguém fazia nada. E minha filha começou a apagar.”

VEGETATIVO

Tayná fechou os olhos e não abriu mais. Com as pálpebras fechadas, lágrimas escorriam sem que ela emitisse nenhum som. “Ver minha filha nesse estado acabou comigo.”

Os médicos submeteram Tayná à 12ª cirurgia. A menina, porém, não reagiu mais. A válvula foi retirada após drenar até mesmo sangue do cérebro da criança. Foi removida na própria UTI. A menina voltou para casa no dia 25 de abril. Sem diagnóstico.

No mesmo dia, Madalena registrou boletim de ocorrência no 1º DP de Mauá, onde será investigado suposto erro médico. Na quarta-feira foi feito exame de corpo delito no IML (Instituto Médico-Legal) de Santo André. A polícia pediu o prontuário médico de Tayná, mas até agora o hospital não disponibilizou o documento. “Com fé em Deus, minha filha vai voltar ao que era. Nunca mais entraremos no Hospital América. E eles terão de responder na Justiça pelo que fizeram.”

Hospital diz que ‘lamenta insatisfação’ da família

Procurado pela equipe do Diário, o Hospital América, na Vila Bocaina, em Mauá, afirmou que “lamenta a insatisfação da representante legal da menor”.

Conforme a unidade, todos os atendimentos necessários foram prestados, mas, por questões de sigilo e ética profissionais, não foram fornecidos detalhes médicos. “O Hospital América sempre preza e tem como princípio o atendimento médico humanizado, com ampla qualidade, buscando a excelência na prestação de serviços médicos”, finaliza a nota. 




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