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Cartas de amor sob a ótica de Felipe Hirsch
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08/05/2008 | 07:02
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A memória sempre foi o principal combustível para os trabalhos da Sutil Companhia de Teatro, como Os Solitários e A Vida É Cheia de Som e Fúria, que projetou nacionalmente o grupo em 2000. "A partir de temporada de Gripe, a memória deixa de ser tema e passa a ser ferramenta, o que nos possibilita caminhos mais originais", comenta o diretor Felipe Hirsch que criou a peça autoral Não Sobre o Amor, que estréia nesta quinta-feira para convidados e sexta para o público, no CCBB.

Certamente o trabalho mais intimista de sua carreira, Não Sobre o Amor é baseado na relação epistolar entre o russo Victor Shklovsky e a franco-russa Elsa Triolet, representados por Leonardo Medeiros e Arieta Corrêa. Em cena, a dupla verbaliza o conteúdo das cartas supostamente trocadas pelo casal. Isso porque Shklovsky, depois que saiu de Petersburgo, foi morar em Berlim, próximo ao zoológico, onde começou a escrever as cartas, com objetivo literário. "Aparentemente, trata-se da relação epistolar amorosa. Mas na verdade o que se destaca é uma obra que fala sobre distância, origem, raízes."

Autor das biografias de Laurence Sterne e Tolstoi, o russo Shklovsky (1893- 1984) via a literatura como uma coleção de ferramentas estilísticas que obrigam o leitor a perceber o mundo sob uma nova perspectiva. Algo como as imagens distorcidas de uma paisagem vista a partir de lentes coloridas: não se trata da realidade, mas de uma nova forma de encarar a própria realidade.

"Por ser formalista, ele deliberadamente utilizou a relação com Elsa para construir uma obra pela qual fala sobre amor, solidão e exílio. Mesmo apaixonado, Victor teve a preocupação de produzir literatura", diz Hirsch.

O diretor inspirou-se no livro Letters Not About Love para construir, ao lado de Murilo Hauser, a delicada teia de Não Sobre o Amor. Também inseriu na peça trechos da correspondência entre a também escritora Lilia Brik, irmã de Elsa, e seu amante, o poeta Maiakovski.

Assim, a cena se divide entre a narração das lembranças de Shklovsky e acontecimentos produzidos por sua mente, na qual Elsa toma forma. "Na literatura russa, a escrita é irônica e exacerba a paixão. A ironia devora as palavras e, com isso, o espetáculo passa a ter muitas camadas." A encenação não-realista é marcada por projeções que, com o cenário, a iluminação e a trilha sonora, criam a atmosfera ideal de um espetáculo de câmara.

Daniela Thomas, parceira de Hirsch desde Nostalgia (2001), criou um cenário compacto, no qual a posição dos móveis não respeita a tradicional ocupação, espalhando-se pelas paredes e pelo teto. "O mundo do homem tem de ser desconstruído sensivelmente", observa o diretor, que conta com outro trunfo: a iluminação cuidadosamente desenhada por Beto Bruel, outro veterano parceiro.

Como o cenário foi criado para um espaço pequeno, Hirsch pediu que os atores não fossem iluminados diretamente. Assim, Bruel pesquisou diversos tipos de madeira para que o reflexo da luz, vinda principalmente de uma janela no teto, iluminasse Arieta e Medeiros. "Com isso, o trabalho tornou-se uma pintura", diz o diretor.

Não Sobre o Amor - Teatro. Estréia sexta-feira, às 19h30. No Centro Cultural Banco do Brasil 125 - R. Álvares Penteado, 112, Tel.: 3113-3651. De quarta a sábado, às 19h30; domingo, às 18h. Ingr.: R$ 15. Até 6 de julho.




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