Setecidades Titulo Em quatro cidades
Ambulantes da região enfrentam a ilegalidade à espera de licenças

Comércio informal do Grande ABC ganha força com o desemprego; lojistas reclamam

Flávia Fernandes
Victor Augusto
Especiais para o Diário
29/04/2019 | 07:00
Compartilhar notícia
Nario Barbosa/ DGABC


 O mesmo carregador de celular, a mesma marca. Em loja de eletrônicos regularizada você encontra o equipamento por R$ 40. Já no camelô o item, sem garantias, custa metade do preço. Embora o cenário atraia o consumidor, a concorrência é tida como desleal pelo comércio formalizado, que paga aluguel e impostos. Do outro lado, sob justificativa das altas taxas de desemprego – segundo o Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), foram demitidas 217 pessoas no Grande ABC em março – e aproveitando as falhas da fiscalização, ambulantes ressaltam que a atividade é a única opção de renda. Alguns relatam, ainda, tentar a formalização, mas que são raras as oportunidades dadas pelas administrações.

Conforme a Prefeitura de São Bernardo, há aproximadamente 19 mil atividades comerciais cadastradas na cidade, sendo 800 ambulantes licenciados. Os números não integram os informais, que se aglomeram em pontos como o entorno do Terminal Rodoviário João Setti, no Centro. Exemplo é Evandro Marques da Silva, 52, pintor de ofício que, desde janeiro, vende água, refrigerante e suco, das 10h às 16h, nas proximidades do Poupatempo, para complementar a renda familiar. “Sou pai de família e, nesta crise que estamos vivendo, tive de achar outros meios de levar renda para casa.” Por não ser regularizado, ele diz que evita “peitar” os fiscais, abrindo mão de permanecer em espaços considerados “mais rentáveis”.

Em Diadema, a única cidade a oferecer vagas – são cinco – para ambulantes licenciados da região atualmente, somente no ano passado foram apreendidos 630 quilos de alimentos oriundos do comércio irregular da cidade. A fiscalização um pouco mais rigorosa, porém, não impede a presença de vendedores informais na Praça Presidente Castelo Branco, no Centro. Expedito Gomes, 65, morador da cidade, vende café, bolo e lanches numa bicicleta há dois anos no local. Ele revela que já chegou a tentar regularizar a situação, sem sucesso. “Não sou aposentado. Já fui na Prefeitura para tentar uma licença, mas é um processo difícil”, explica o idoso, que faz duas jornadas de trabalho para evitar a inspeção: entre 5 e 10h e após às 17h.

Próximo dali, o casal Letícia e Wesley Bispo, 26 e 25 anos, respectivamente, tentam ‘ganhar a vida’ vendendo água e balas em um ponto de ônibus da Rua Graciosa. Wesley é cadeirante e Letícia está desempregada há três anos. “Temos contas para pagar, mas não temos emprego”, reclama a mulher, que ‘estreou’ as vendas no local no neste mês.

Moradores de Diadema interessados na regularização têm até 3 de maio para entregar documentação no Poupatempo da cidade (Rua Amélia Eugênia, 397, Centro). As vagas são para a Feira Noturna, na Praça da Moça.

MAUÁ

Em Mauá, na Praça do Relógio, no Centro, os ambulantes regularizados Eliana Nunes, 39, e Fábio Nunes, 43, destacam as dificuldades para obter a licença municipal. “Precisamos assinar papelada e fazer o exame médico. A espera foi de quase um ano”, diz Eliana. O casal começou a trabalhar por conta própria depois que Fábio foi demitido do emprego de eletricista. Eles consideram que a vantagem dos produtos vendidos é o preço em relação à concorrência de estabelecimentos fixos. Quatro pares de meias, por exemplo, sai por R$ 10, ao passo que, em lojas próximas, custa R$ 5 o par.

Para o consumidor, o preço mais baixo compensa o risco do produto sem garantias. “Sempre compro nos camelôs. Além de mais barato, os vendedores são mais gentis”, opina a autônoma Carla Oliveira, 38, moradora de Santo André. Já a munícipe de São Bernardo e estudante Fabiana Ferreira, 21, também vê no preço o principal atrativo na hora de optar pelo comércio ambulante.

Lojistas cobram fiscalização rígida

A oferta de produtos com preços mais baixos e o não pagamento de aluguel e impostos por parte dos ambulantes irregulares para manter o negócio acaba irritando comerciantes formais, como é o caso de Agnaldo Maestrel, 48 anos, que mantém, há quase dois anos, ponto em galeria nas proximidades da Estação Mauá da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos).

“O comércio ambulante atrapalha muito, pois eles vendem a mercadoria por um preço menor devido ao não pagamento de aluguel pelo espaço”, conta. Agnaldo acredita que os ambulantes deveriam ser movidos para outras partes da região, afastadas dos comércios fixos, para evitar a “concorrência desleal”. “Os ambulantes afetam todos os comércios daqui. Acho que a Prefeitura deveria checar a licença de todos e colocá-los em outro ponto.”

Em Santo André, a situação não é muito diferente. Nos arredores da Estação da CPTM e do Terminal de Ônibus, no Centro, bancas, carriolas e tecidos são estendidos no chão com produtos que variam de acessórios para celular até roupas, guloseimas e frutas. Atrás desses expositores, lanchonetes e galerias com lojas disputam a atenção da clientela. “A fiscalização vai embora muito cedo”, reclama o proprietário de comércio de roupas, Joel Pereira, 43.

Presidente da Acisa (Associação Comercial e Industrial de Santo André), Pedro Cia Junior explica que há luta interna entre eles, a Craisa (Companhia Regional de Abastecimento Integrado de Santo André) – órgão responsável pela fiscalização do comércio irregular – e a Prefeitura. “Já tivemos diversas reuniões e enviamos ofícios à Craisa para tentar diminuir esse problema na região”, conta.

A equipe do Diário entrou em contato com as prefeituras de Santo André e Mauá, mas não obteve posicionamento até o fechamento desta edição. Já Diadema e São Bernardo informaram que utilizam a legislação em vigor para fiscalizar o comércio irregular na cidade e que os infratores estão sujeitos a notificação, multa e apreensão dos equipamentos.  




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;