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As mães que o Estado esqueceu

No domingo, milhões de pessoas pelo País celebrarão uma das datas...

Por Carlos Ferrari
03/05/2016 | 07:00
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No domingo, milhões de pessoas pelo País celebrarão uma das datas com maior potencial de apelo emocional e comercial de nosso calendário de comemorações. O Dia das Mães é tudo isso, pois elas, as mães, resistiram a todas as transformações culturais, políticas, históricas e antropológicas já vivenciadas pela humanidade, fazendo da afetividade e dos vínculos familiares elementos vivos e pulsantes, seja nas relações cotidianas, nas lembranças, ou mesmo em expectativas destruídas pelo imponderável.

Por isso, nesse dia muitas delas serão homenageadas, ganharão presentes, carinhos e poderão experimentar pequena parcela da grande potência de amor que com tanta naturalidade acabam emanando diariamente. Infelizmente para outras tantas, só restarão as lágrimas ou mesmo a angústia por respostas de um Estado que há muito lhes deixou órfãs da prometida e esperada pátria mãe gentil.

Falo das mães de milhões de jovens negros e pobres, mortos apenas por serem quem foram. Estas chorarão todos os segundos domingos de cada mês de maio, e não receberão sequer um pedido de desculpas de um Estado que, ao contrário disso, não pensa em parar, pois elegeu como uma das principais estratégias de Segurança Pública matar com base em perfis preestabelecidos.

Falo das mães com filhos dominados pelas drogas. Estas chorarão indignadas, diante de discurso socialmente aceito que culpabiliza a ela própria e a seu filho, há muito obscurecido por insanidade incontrolável, sem quaisquer tipos de soluções efetivas planejadas e ofertadas pelos entes federados.

Falo das mães de crianças desaparecidas. Elas se reúnem, consolam-se e aguardam o dia que o mundo organizará suas estruturas de inteligência estatais para encontrar respostas para suas dores ou mesmo apresentar um plano com soluções que impeçam que outras tantas vivam o mesmo trauma.

Falo das mães de filhos vitimados por toda espécie de violência. Elas não conseguirão comemorar, pois aguardarão incrédulas uma ou mais medidas que possam fechar as feridas, que as vezes por anos “sangram na alma”.

Às vésperas de uma data tão bela, dói escrever um texto amargo para tratar de um dia que traz tanta doçura. Por outro lado, não fazer isso significa reforçar uma postura estatal que desconsidera o sofrimento latente de milhares de mulheres e suas famílias, indo na contramão de discursos aparentemente modernos e respeitosos.

Me despeço homenageando todas as mães por meio da bela reflexão de Mary Del Priore: “Diferente do beijo do príncipe, que desperta, o beijo de mãe adormece. Um como o outro tem poder de vida e de morte. Tudo depende de estarmos presentes ou não. Para criança, antes de tudo, o beijo.”

* Carlos Ferrari é presidente da Avape (Associação para Valorização de Pessoas com Deficiência), faz parte da diretoria executiva da ONCB (Organização Nacional de Cegos do Brasil) e é atual integrante do CNS (Conselho Nacional de Saúde). 




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