Setecidades Titulo
Casais com HIV têm ajuda do governo estadual para ter filhos
Por Kelly Zucatelli
Do Diário do Grande ABC
10/05/2010 | 07:10
Compartilhar notícia


O primeiro programa da rede pública de Saúde para reprodução assistida de soropositivos, anunciado semana passada pela Secretaria Estadual de Saúde e a Faculdade de Medicina do ABC, já é sinônimo de um nova possibilidade de vida para muitos casais que sonham em ter seus filhos, mas, por conta da contaminação pelo vírus HIV já haviam desistido da ideia.

O objetivo do programa é reduzir ao máximo as chances de transmissão de Aids aos bebês.

Nos casais em que ambos são soropositivos, será realizada a inseminação artificial após a aplicação da técnica de lavagem do esperma.

No caso em que o homem é portador do HIV, a mesma técnica será aplicada para a reprodução assistida. Já nos casais em que apenas a mulher é soropositiva é realizada apenas a inseminação artificial.

A exigência para a execução desses procedimentos clínicos é de que os casais estejam em dia com o exame de controle da carga viral, além da dosagem hormonal em ordem e nenhum problema no espermograma dos homens.

"Nesse primeiro momento do programa vamos priorizar os tratamentos com casais em que o homem seja soropositivo e somente os casais que possuem boa fertilidade", explicou o professor titular de Genética e Reprodução Humana da Faculdade de Medicina do ABC, Caio Parente Barbosa.

O encaminhamento para participar do programa deve ser feito pelos postos de Saúde dos municípios ou do Estado. Porém, há custo para os casais que fazem pela rede pública, que fica entre R$ 4.000 e R$ 5.000 (cerca de R$ 3.000 é só com as medicações). "A diferença dos preços da rede particular é grande", contou o médico, informando que o custo sem ajuda do Estado fica em R$ 15 mil, em média.

O coordenador do Crase (Centro de Reprodução Assistida em Situações Especiais), Waldemar de Carvalho, reforçou que no início, o governo, por meio do SUS (Sistema Único de Saúde), só ajudará nos tratamentos para as pessoas com HIV e sem problemas de fertilidade. "Os pacientes precisam passar pelo Centro de Referência e Treinamento DST/Aids, da Secretaria Estadual de Saúde", contou.

"A iniciativa está nos planos de enfrentamento da epidemia do HIV. É uma estratégia para garantir a reprodução assistida e a concepção segura, diminuindo os riscos de infecção dos fetos e dos parceiros. Os casais têm sido receptivos e esperançosos, pois há sobrevida (à contaminação por HIV)", disse a coordenadora do programa estadual DST/Aids, Maria Clara Gianna.


Casal é assistido na Medicina do ABC

O teatrólogo Marcos Paulo (nome fictício), 44 anos, durante muito tempo sentiu que o sonho e o desejo de constituir família e ter filhos naufragava junto com sua vida, após descobrir que é soropositivo. A notícia veio em 2003, às vésperas de se casar, depois de três anos de namoro, com Maria Rita (nome fictício), na época com 19 anos.

Quando fazia os exames pré-nupciais e teve o resultado positivo para o HIV, Marcos Paulo não sabia (e contou que ainda não sabe exatamente), como se contaminou com o vírus. Mas supõe que foi numa transfusão de sangue ou durante um assalto que sofreu em um ponto de tráfico de drogas, em que marginais lhe deram uma agulhada na testa. "Lembrar disso tudo para mim hoje é muito difícil. Cheguei a pensar que o azar era tanto que não compensaria mais viver. Mas eu tinha a Maria Rita, que eu amava, e precisava contar que eu tinha uma doença crônica", disse o homem, com os olhos marejados de lágrimas, olhando fixamente para a mulher, também nitidamente emocionada.

Após contar o momento difícil, Marcos Paulo lembrou que certo dia chamou Maria Rita e disse que estava com HIV. "Naquele momento fiquei assustada, mas não me passou pela cabeça abandoná-lo. Resolvi que enfrentaria junto com ele a doença. Hoje estamos aqui (na Faculdade de Medicina do ABC), felizes porque teremos a oportunidade de tentar ter o nosso filho com os cuidados para que ele não seja contaminado", disse Maria Rita.

No próximo mês, o casal fará a tentativa de reprodução assistida com a lavagem dos espermas e a inseminação artificial.

"Não vejo a hora de ter essa criança saudável. Certa vez pensei em me matar. Hoje tenho uma gana muito maior para viver", concluiu Marcos Paulo. KZ


Integrante do programa já está grávida
Com poucos meses de namoro com João Pedro (nome fictício), 37 anos, Paula (nome fictício), 40, descobriu que era soropositiva, ao se submeter a exames para fazer uma transfusão de sangue.

Passados 18 anos da revelação de que tinha o vírus HIV, a mulher de alto-astral, vaidosa e brincalhona, tenta conter as lágrimas ao contar como foi o momento.

Ao lado dela estava o marido, João Pedro, militar de voz tranquila. "Ela me contou logo de cara e, a partir dali, pensei que aquele vírus não poderia estragar a nossa vida, por pior que fosse não saber quanto tempo ela iria viver. Eu queria viver intensamente ao lado dela. Graças a Deus estamos juntos e felizes até hoje. E agora aguardando o nosso bebê!", conta sorridente João Pedro, que não foi contaminado pelo HIV.

Há dois meses, Paula descobriu que está grávida de seu primeiro filho. "Depois de passar por três inseminações e duas fertilizações, consegui engravidar com o sêmen do meu marido. Nem acreditei!", contou Paula.

A portadora só começou a tomar a medicação para tratar-se após cinco anos que descobriu que estava com o vírus. "Os remédios não me causam nenhuma reação colateral. Tenho realmente uma vida normal como qualquer pessoa. A cada seis meses meu marido faz os exames preventivos, e temos uma vida normal", salientou.

Em breve, o apartamento que moram em São Bernardo será modificado para a instalação do quarto do bebê. "Amamos crianças e damos todo o carinho para nossos sobrinhos. Mas agora teremos o nosso pequeno para dar toda atenção do mundo", contou Paula.

Por todos esses anos, o casal mantém o fato de Paula ser portadora de HIV em segredo. "Não pretendemos contar para ninguém, pois infelizmente o preconceito ainda é muito grande no Brasil. O importante é acreditar que todos verão nosso filho saudável", finalizou João Pedro.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;