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Família que vive em São Bernardo sonha voltar para Pernambuco

Após anos na cidade, desemprego e outras dificuldades motivam escolha dos Cunha, que desejam também nova chance de frequentar a escola

Por Matheus Angioleto
24/09/2017 | 07:00
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Nario Barbosa/DGABC


 O ambiente é apertado: são dois quartos que espremem cama tripla e dois colchões para dez pessoas. A geladeira, praticamente vazia, denuncia a realidade de muitos brasileiros que tentam sobreviver com pouco, ou quase nada. No caso dos moradores de um dos apartamentos do Conjunto Habitacional Três Marias, no bairro Cooperativa, em São Bernardo, exatos R$ 937 (um salário mínimo).

O dinheiro que sustenta a família é proveniente do BPC-Loas (Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social), mas as dívidas com contas atrasadas – incluindo luz, condomínio, prestações do apartamento e empréstimo de R$ 900 para comprar uma das camas que dá um pouco de conforto aos habitantes deste lar – quase faz desaparecer tudo o que eles conseguem por mês.

Mas os Cunha não querem mais essa vida. Todos os esforços e sonhos agora estão concentrados em pegar a estrada de volta, rumo ao carinho dos familiares de Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco. Faz seis anos que o progenitor, Gilson Lins Cunha, 43 anos – que carrega no olhar o reflexo das dificuldades pelas quais passa todos os dias – decidiu sair da cidade natal com a mulher e os sete filhos para procurar emprego.

Moraram por um tempo no Areião, mas o sonho dele comprar uma van e trabalhar como motorista desmoronou como castelo na praia. Sem registro na carteira de trabalho e nenhum ‘bico’ há quatro meses, a família vive com o que pode. “Já faltou comida, mas fome não passamos, porque vou atrás e converso com pessoas que ajudam doando roupas e cesta básica”, conta o pedreiro, que cursou só até o primeiro ano do Ensino Fundamental. “Adoraria voltar a estudar.”

O desejo de novamente entrar em uma sala de aula é compartilhado com a filha Raiane Soares Lins, 15. Desde que ganhou Yara, de um ano e oito meses, com Síndrome de Down, abandonou a escola na 6ª série (7º ano do Ensino Fundamental). “Lá (no Nordeste) é bem melhor do que estar aqui. Pretendo não só voltar a estudar, como me tornar uma parteira.” Os pais juram que tentaram de tudo para continuar a criar os filhos na cidade grande, mas não conseguiram. “Vim com essa esperança, mas quero voltar. Só não fui a pé porque é muito longe”, desabafa o pai.

E bota distância nisso. São 2.713 quilômetros – ou 36 horas de carro e três de avião – até a Rua General Carlos Pinto, 112, no bairro Socorro, Jaboatão, residência da mãe do seu Cunha. “Assim que conseguir a passagem e comida para dois dias e meio na estrada, nós vamos”, conta o pedreiro, que calculou o valor de R$ 6.000 para custear o trajeto. “Meu sonho é que eles (os filhos) voltem, porque moravam à beira da praia e aqui não tive sequer a oportunidade de levá-los para ver o mar. Não quero nada além de ir embora”, desabafa.

POR CONTA PRÓPRIA
Em 2010, um ano antes de a família Cunha chegar a São Bernardo, a cidade tinha 400 mil migrantes entre os cerca de 765 mil moradores. Porém, o município ainda não possui para a volta de pessoas ao estado de origem. Conta, por outro lado, com o recâmbio, que beneficia eventualmente o retorno de moradores de rua. A iniciativa ajudou 55 pessoas em 2016 e, até o momento, 45 em 2017. Atualmente, 310 pessoas vivem em situação de rua no município.

A gestão atual destaca também o Programa Emprego Cidadão, que coloca pessoas em vulnerabilidade social no mercado de trabalho. Desde 1º de maio foram empregadas 20 com acompanhamento do Centro de Referência Especializado para Pessoa em Situação de Rua/Centro POP. Em agosto, mais 20 foram encaminhadas ao mercado de trabalho.

Já na cidade vizinha, Santo André, a Prefeitura afirmou que recebe pessoas de vários Estados e de situações sociais distintas, mas que são acompanhadas apenas as que estão em situação de vulnerabilidade social. Serviços são realizados pelo Cras (Centro de Referência em Assistência Social) ou pelo Centro POP, quando o sujeito encontra-se em situação de rua.

Quem deseja voltar ao estado de origem, tem acompanhamento feito pelos profissionais. “A equipe realiza estudo da situação para compreender a real necessidade do recâmbio ou mesmo se a situação se enquadra nos critérios da assistência social para receber algum auxílio – que pode ser disponibilizado nos casos mais extremos, porém as solicitações são avaliadas individualmente”, diz a administração que não soube mensurar o fluxo de pessoas de outros Estados.

O Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, por sua vez, afirmou que atua em caráter de planejamento e de criação de políticas públicas regionais para temas como a inclusão social, igualdade racial, gênero e migração. No entanto, a entidade afirmou que a assistência à população é feita pelos municípios.




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