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Grande ABC tem Sherlock Holmes de familiares desaparecidos

Atendente social da Prefeitura de São Bernardo ajuda famílias a reatar seus laços

Camila Galvez
Do Diário do Grande ABC
13/04/2014 | 07:00
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Claudinei Plaza/DGABC


 A sala é pequena, de paredes verdes e poucos móveis. Munido da boa e velha lista telefônica, além da internet, o atendente social do Cras (Centro de Referência e Assistência Social) Centro de São Bernardo Nilson Pereira de Barros, 46 anos, ajuda familiares a se reencontrarem após anos sem se ver. Para isso, pratica algo que hoje em dia está em desuso entre os da nossa espécie: ouve e, principalmente, entende.

As histórias são muitas, e os motivos da separação, os mais diversos: pais ou mães que morreram, novos casamentos, abandono, violência doméstica, carência tão grande que obriga a entregar um filho para adoção. Carência, aliás, que Nilson viveu na pele.

Filho dos mineiros José Pereira de Barros, 86, e Laura dos Santos Ramos, morta em 2002 aos 76, Nilson nasceu em favela no bairro Baeta Neves. Dona Laura teve 13 filhos antes de fugir da miséria no interior de Minas Gerais, mas apenas três estavam vivos quando a família se mudou para São Bernardo. Aqui, outros três nasceram e uma menina foi adotada.

A vida na cidade era tão difícil quanto no interior. Tanto que Nilson e o irmão gêmeo, Nelson, em homenagem à dupla sertaneja famosa na época, nasceram muito doentes. Ficaram internados por quatro meses. Nilson se recuperou. Nelson só saiu do hospital morto, embrulhado em uma coberta, nos braços da mãe. “Ela não tinha dinheiro para pagar o carro funerário. Os médicos se emocionaram e deixaram que ela saísse com ele de lá assim, o que é proibido. Imagina a força que ela teve para carregar aquele corpinho sem vida para fora do hospital”, relembra Nilson, com lágrimas nos olhos. O caixão foi feito em casa, e as flores que decoraram o pequeno esquife foram colhidas nos quintais dos vizinhos.

A vida difícil continuou mesmo quando a família conseguiu comprar um terreno no bairro dos Casa. A entrada veio de economias feitas por dona Laura, mas as prestações pagas mês a mês os obrigavam a viver de doações. “Comíamos sobras de comidas de restaurantes do Demarchi que iam virar lavagem de porco.”

Nilson acredita que as experiências da vida o levaram ao lugar onde está hoje e à possibilidade de ajudar quem precisa. “Entrei na Prefeitura como patrulheiro mirim em 1983 e nunca mais sai. Sempre estive ligado às questões sociais, inclusive como membro da Sociedade São Vicente de Paulo, que ajuda idosos na cidade.”

CASOS

O primeiro caso de parentes desaparecidos resolvido por Nilson ocorreu no início dos anos 1990, quando ele atuava com a população de rua da cidade. “Estávamos conduzindo um morador de rua em uma van da Prefeitura para atendimento social, quando ele teve um mal súbito. Levamos para o Pronto-Socorro do Rudge Ramos, mas ele não resistiu.”

Por meio de informações fornecidas por outros que viviam na rua, Nilson descobriu a cidade de onde o morador vinha, no Sul de Minas Gerais. “Por uma intuição daquele momento, resolvi ligar para a rádio do município e pedir para eles anunciarem que procurava parentes do homem.”

No fim do mesmo dia, a irmã dele entrou em contato com Nilson e veio retirar o corpo em São Bernardo para sepultá-lo em Minas.

E MAIS CASOS

Atualmente Nilson cuida de 14 casos de pessoas que buscam parentes desaparecidos. A repercussão de seu trabalho, inédito no serviço público da região, foi tanta após solucionar o caso de Donata Almeida dos Santos, publicado pelo Diário em janeiro, que até munícipes de outras cidades da região o procuraram. “Claro que a pessoa cria expectativa, mas deixo bem claro que não há prazo e nem sei se posso solucionar todos os casos. Mas trabalho com afinco e dedicação, porque amo o que faço, gosto de ajudar. Se um dia eu sair da Prefeitura, vou continuar prestando esse serviço.”

Nilson também toma diversos cuidados para garantir a segurança dos envolvidos nas buscas. “Faço tudo no mais absoluto sigilo, pois hoje a violência é muito comum, e pode haver pessoas que queiram se aproveitar da fragilidade do outro.”

Entre filhos que buscam pais, irmãos que querem se reencontrar e até mesmo um caso de pais que foram obrigados a dar a filha para adoção por conta da extrema pobreza, Nilson espera outros finais felizes. Para os parentes e também para o Sherlock Holmes do Grande ABC.




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