As vésperas de assumir o cargo, o político Lagos instalou entre os assessores mais próximos no Palácio de La Moneda o líder da ala radical do Partido Socialista, Camilo Escalona.

Dissidente da ``renovaçao' modernista do coletivismo, Escalona tem aversao ao empresariado e, numa discussao com o próprio Lagos, declarou nao receber ``ordens de ninguém'. No novo governo o líder socialista será um conselheiro de ``temas sociais'.

De acordo com o deputado democrata-cristao Pablo Lorenzini, os contrapesos serao a marca do governo de Lagos. O presidente vai reunir ministros de vocaçao e passado esquerdistas e secretários da área econômica formados nas universidades de Harvard e Chicago, templos americanos do neoliberalismo.

``Mantive o equilíbrio', disse Lagos sobre o seu círculo de colaboradores, enquanto descrevia a distribuiçao de cargos entre socialistas, democratas-cristaos e social-democratas, as três correntes da Aliança de Partidos pela Democracia, que elegeu Lagos.

Ao mesmo tempo o novo presidente reservou a mulheres um terço dos cargos. Lagos comentou que é preciso aproveitar o valor da ``outra metade do Chile', embora nao tenha recebido muitos votos femininos na eleiçao.

Segundo um de seus enteados, Hernán, Lagos nao é do tipo que tenta parecer simpático. O líder direitista Joaquín Lavín, derrotado nas urnas, chamou o adversário de ``soberbo'. Mas entre aliados, amigos e parentes a imagem de homem duro, um tanto distante e orgulhoso é só uma aparência. A simpatia por Lagos está presente até entre dirigentes patronais, normalmente desconfiados da esquerda e da centro-esquerda. O congressista Lorenzini diz que o novo presidente é franco, aberto, inteligente, sabe escutar e tem habilidade para expressar idéias e para comandar.

Lagos reduziu o número de ministros chilenos de 21 para 16 antes de assumir e mencionou como um de seus desafios no governo sujeitar as Forças Armadas ao poder civil. As vésperas da mudança de presidente a relaçao entre o governo e os militares ficou tensa por causa de uma série de gestos de solidariedade dos chefes militares com o ex-ditador Augusto Pinochet quando ele retornou ao país.

``Fiquei muito satisfeito com a minha eleiçao (como presidente, em 16 de janeiro passado), mas a felicidade maior foi em 5 de outubro de 1988', disse Lagos, em referência à votaçao quer rejeitou a proposta de manter Pinochet no poder.

Lagos tem repetido que, com o Chile às portas do século XXI, Pinochet é coisa do passado. O novo presidente recorre com freqüência aos valores familiares: ``Mais importante do que ter dinheiro é ter a consciência tranqüila e ter podido servir ao Chile e aos chilenos'.

``Quero que meus compatriotas saibam que serei o presidente de todos', disse Lagos, no discurso comemorativo pela vitória nas urnas. No mesmo discurso ele garantiu que realizará as promessas eleitorais e trabalhará ``com aqueles que até ontem foram nossos adversários'.

Exilado e preso durante a ditadura de Pinochet, Lagos diz que tem um sonho: ``um Chile onde prevaleça a igualdade, onde se respeite todos, nao importando sua origem'.

Na cidadezinha de Caleu, perto de Santiago, fica a casa da família Lagos. Ali, segundo os vizinhos da família, o presidente ``é o homem mais simples do mundo'. Quando está na cidade, Lagos, um ex-professor universitário e ex-consultor de organizaçoes internacionais, cultiva pequenos jardins.

``Sou um homem da classe média chilena, sem riquezas, obcecado com os valores morais e nao com o poder. Um homem que se sente bem sendo ele mesmo'.

Lagos também disse que se sente mal em deixar sua casa. Ele ocupa com a mulher, Luis Durán, um apartamento em um edifício ao leste de Santiago. De acordo com a polícia, o pior lugar possível para a segurança de um presidente. Lagos lamentou ainda o fim das caminhadas diárias para aliviar a tensao.